A Reclamante é DOCTISSIMO, de Levallois Perret, França, representada por Dannemann Siemsen Bigler & Ipanema Moreira, Brasil.
O Reclamado é P. A. M., de São Paulo, Brasil.
O nome de domínio em disputa é <doctissimo.com.br>, o qual está registrado perante o NIC.br.
A Reclamação foi apresentada ao Centro de Arbitragem e Mediação da OMPI (o “Centro”) em 16 de dezembro de 2014. Em 17 de dezembro de 2014, o Centro transmitiu por e-mail para o NIC.br o pedido de verificação de registro em conexão com o nome de domínio em disputa. No dia 17 de dezembro de 2014, o NIC.br transmitiu por e-mail para o Centro a resposta da verificação do nome de domínio em disputa, confirmando que o Reclamado é o titular do registro e fornecendo os respectivos dados de contato.
O Centro verificou que a Reclamação preenche os requisitos formais do Regulamento do Sistema Administrativo de Conflitos de Internet relativos a Nomes de Domínios sob “.br” – denominado SACI-Adm (o “Regulamento”) e das Regras do Centro de Arbitragem e Mediação da OMPI para o SACI-Adm (as “Regras”).
De acordo com o art. 3 das Regras, o Centro formalizou a notificação da Reclamação e o procedimento administrativo teve início em 18 de dezembro de 2014. De acordo com o art. 7(a) das Regras, o prazo para o envio da defesa encerrou-se em 7 de janeiro de 2015. O Reclamado não apresentou Defesa. Portanto, em 8 de janeiro de 2015, o Centro decretou a revelia do Reclamado.
O Centro nomeou Gilberto Martins de Almeida como Especialista em 19 de janeiro de 2015. O Especialista declara que o Painel Administrativo foi devidamente constituído. O Especialista apresentou o Termo de Aceitação e a Declaração de Imparcialidade e Independência, tal como exigido pelo Centro para assegurar o cumprimento dos arts. 4 e 5 das Regras.
Em atenção ao art. 12 do Regulamento, o Painel Administrativo entende não haver necessidade de produção de novas provas para decidir o mérito da disputa e, portanto, passará a analisar, a seguir, as questões pertinentes ao caso.
A Reclamante é empresa francesa, atualmente integrante do Grupo Lagardère Active, que explora sua atividade econômica por meio do endereço de Internet “www.doctissimo.fr” desde 2000. Trata-se de sítio da rede eletrônica focado principalmente em temas e fóruns de saúde e bem-estar, tendo alcançado grande renome na França e em outros países.
A Reclamante realizou inúmeros pedidos de registro de marca, em diversas categorias, junto ao INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) da França e junto ao OHIM (Instituto de Harmonização do Mercado Interno) ao longo dos últimos anos, sendo o primeiro depósito também do ano 2000.
A Reclamante lançou recentemente as versões em inglês, espanhol e italiano de seu sítio da rede eletrônica. No Brasil, a Reclamante realizou os primeiros pedidos de depósito de marcas junto ao INPI brasileiro1 a partir de 2012.
O nome de domínio em disputa foi criado em 19 de maio de 2011. O Reclamado não possui registro e/ou pedido de registro junto ao INPI de marca nominativa e/ou mista contendo esse elemento.
A Reclamante afirma que:
(i) o nome de domínio em disputa é idêntico à marca de sua titularidade;
(ii) sua marca é notoriamente conhecida, seus gastos com publicidade fazem com que o público imediatamente reconheça a marca DOCTISSIMO, sendo, por isso, merecedora da proteção especial conferida pelo art. 126 da Lei de Propriedade Industrial;
(iii) o Reclamado quer se aproveitar da fama da Reclamante;
(iv) estaria caracterizada a má fé do Reclamado tendo em vista a troca de e-mails entre as partes, o valor exorbitante de US$ 20,000.00 solicitado pelo Reclamado, bem como sua declaração de que contatou o CEO da Reclamante, atestando que conhece a marca da Reclamante.
O Reclamado não apresentou contestação durante o prazo para defesa, nem após. O silêncio do Reclamado autoriza este Especialista, segundo as regras aplicáveis, a basear sua decisão nos fatos e nas provas produzidas neste procedimento administrativo.
A análise dos fatos e das alegações da Reclamante permite concluir que a Reclamação deve ser julgada procedente, pois (i) o nome de domínio em disputa reproduz integralmente a marca da Reclamante, ensejando confusão, e (ii) o Reclamado não possui direitos ou interesses legítimos em relação ao nome de domínio em disputa, o qual (iii) foi registrado de má fé, tendo em vista a conduta do Reclamado durante as negociações com a Reclamante, bem como a falta de uso do nome de domínio em disputa.
A Reclamante alega que sua marca DOCTISSIMO seria notoriamente conhecida no ramo de consultoria em saúde e bem-estar. A fim de comprovar tal alegação, submete provas de que seu sítio da rede eletrônica possui uma média de oito milhões de visitantes por mês, cópias de reportagens sobre seu serviço e lista de registros e pedidos de registros marcários em diversos países.
O Especialista conclui que a Reclamante apresentou provas suficientes de que sua marca DOCTISSIMO é notoriamente conhecida para os efeitos do art. 3 do Regulamento.
O nome de domínio em disputa <doctissimo.com.br> é idêntico à marca de titularidade da Reclamante.
A busca conduzida por este Especialista na base de dados do INPI brasileiro não apresentou qualquer resultado de pedidos de registros e/ou registros de marca(s) em nome do Reclamado; pelo contrário, todos os registros e/ou pedidos de registro encontrados ostentando a marca DOCTISSIMO são de titularidade da Reclamante.
De acordo com as alegações e provas apresentadas neste procedimento administrativo, o Reclamado (i) não possui nome, marca, produto ou serviço associado(s) ao nome de domínio em disputa; (ii) não usa tal expressão, nem é conhecido por tal designação; e (iii) não possui qualquer associação conhecida com a Reclamante.
Portanto, na avaliação deste Especialista, com base no art. 11 (c) do Regulamento e art. 7 (b)(i) das Regras, não há direitos ou interesses legítimos do Reclamado com relação ao nome de domínio em disputa.
O art.3, parágrafo único do Regulamento prevê rol exemplificativo de circunstâncias que podem demonstrar a má fé do Reclamado.
Neste caso, os e-mails apresentados pela Reclamante levam à conclusão de que está configurada a hipótese da alínea (a) do referido parágrafo, tendo em vista que (i) o valor exigido pelo Reclamado (US$ 20,000.00) demonstra conhecimento acerca da Reclamante e de seu grupo econômico; e (ii) o Reclamado admite já ter entrado em contato com o CEO da Reclamante, tornando evidente que tinha conhecimento prévio da marca da Reclamante.
Ainda, quanto ao uso do nome de domínio em disputa, conforme já decidido em outros procedimentos administrativos, o chamado passive holding também pode caracterizar a má fé. Confira-se:
A postura omissiva e não-colaborativa do Reclamado, no sentido de (a) de não usar o domínio, (b) de não indicar qualquer pretensão de uso, e (c) de nem, ao menos, apresentar justificativas para a sua apropriação, certamente não pode beneficiá-lo ou legitimar a manutenção do registro realizado, eis que não se coaduna com o dever geral de colaboração e lealdade, com o princípio da boa fé e com a função social e econômica desse ativo.
Ou seja, tal circunstância, associada (d) à inexistência de registro para essa marca pelo Reclamado e (e) de qualquer interpretação plausível para a adoção dessa expressão, que não tem significado em língua portuguesa, conduzinexoravelmente à procedência da reclamação formulada no presente procedimento. (Rhodia Services v. Emerson Fortunato Maia; WIPO Caso No. DBR2011-0001)
Pelas razões anteriormente expostas, de acordo com art.1(1) do Regulamento e art.15 das Regras, o Painel Administrativo decide que <doctissimo.com.br> seja transferido para a Reclamante.
Gilberto Martins de Almeida
Data: 27 de Janeiro de 2015
Local: Rio de Janeiro, Brasil
1 Em pesquisa realizada de forma independente, este Especialista constatou que os pedidos de registro da marca DOCTISSIMO junto ao INPI brasileiro foram concedidos em 21 de janeiro de 2015.