Propriedade Intelectual, PMEs e Recuperação Econômica na Nigéria
Oyinkansola Komolafe*, Universidade de Ibadan, Ibadan, Nigéria
*Vencedora do Concurso de Ensaios do Dia Mundial da Propriedade Intelectual de 2021 organizado pelo Escritório da OMPI na Nigéria (saiba mais sobre o Concurso Nacional de Ensaio de PI da OMPI 2021 ).
Agora, mais do que nunca, os países estão realizando a transição de economias baseadas em recursos para economias baseadas em conhecimentos. Ao que parece, a Nigéria tem aderido a este movimento, dado que as partes interessadas nacionais começam a reconhecer o papel do capital intelectual como catalisador para o crescimento econômico sustentável. Esta tendência tornou-se ainda mais proeminente no âmbito da recente pandemia de coronavírus e da contínua resiliência da economia do conhecimento em meio ao drástico declínio dos preços do petróleo. No âmago dessa sede renovada por capital intelectual encontra-se o principal instrumento de inovação: o setor de pequenas e médias empresas (PMEs).
Durante vários anos, as PMEs provaram ser a força vital da economia nigeriana. Segundo a enquete sobre Micro, Pequenas e Médias Empresas (MSMEs, na sigla em inglês)da PwC, as PMEs contribuem com a parcela colossal de 49% do PIB da Nigéria e representam cerca de 99% das transações realizadas na Nigéria.
Devido à sua elevada flexibilidade e capacidade de inovação, as PMEs estão bem posicionadas para traçar um novo rumo para o crescimento econômico pós-pandemia na Nigéria, através da geração de empregos e da redistribuição de rendimentos. Mas para otimizar plenamente seu potencial, as PMEs precisam proteger e comercializar adequadamente suas criações intelectuais. É aí que entram em jogo os direitos de propriedade intelectual (PI).
PI: Reposicionamento das PMEs nigerianas para a prosperidade econômica
A Nigéria é um dos maiores centros de inovação e criatividade do continente africano. Em cada invenção que ingressa diariamente no mercado nigeriano, reside uma ideia distinta que tem o potencial de se transformar em um valioso ativo comercial para seus proprietários. Os direitos de PI oferecem às PMEs a oportunidade de tornarem essa transformação em realidade.
Uma das mais importantes vantagens do uso de ativos de PI para as PMEs é a geração de receitas. A exclusividade que os direitos de PI oferecem permite que as PMEs obtenham royalties e administrem receitas com o licenciamento dos seus ativos de PI. Na verdade, pesquisas efetuadas pela União Europeiamostraram que as PMEs que possuem direitos de PI geram até 68% mais receitas do que as PMEs que não os possuem.
Os benefícios da geração de receitas a partir dos ativos de PI deverão tornar-se mais significativos em virtude do Acordo da Área de Livre Comércio Continental Africano (AfCFTA, na sigla em inglês). A partir da plena adoção do AfCFTA, as PMEs nigerianas poderão adquirir direitos de PI com vista a aumentar a visibilidade das suas marcas e proteger adequadamente os seus ativos. Assim, essas empresas poderão dispor de uma vantagem competitiva em meio ao influxo de novos participantes no mercado.
Da mesma forma, a aquisição de direitos de PI poderá colocar potencialmente as PMEs na vanguarda das oportunidades de investimento. Muitas vezes, a confiança dos investidores é reforçada quando as empresas são capazes de demonstrar que protegeram seus valiosos ativos de PI. A relação positiva entre a PI e a capacidade de uma empresa de atrair investidores é ainda mais reforçada pelo relatório da PwC intitulado Impacto da Violação da Propriedade Intelectual sobre as Empresas e a Economia da Nigéria, que mostrou que uma melhoria de 1% na proteção de marcas e de direitos de autor poderia aumentar o investimento estrangeiro em 3,8% e em 6,8%, respectivamente. A perspectiva de tais fluxos de capital internacional é crucial para a Nigéria neste momento, pois tem a capacidade potencial de acelerar a criação de empregos, reduzindo assim o flagelo do desemprego induzido pelo coronavírus que o país está atualmente combatendo.
A despeito dos numerosos benefícios que a utilização da PI apresenta para as PMEs, os níveis de proteção da PI entre as PMEs nigerianas permanecem extremamente baixos. Segundo a Agência de Desenvolvimento de Pequenas e Médias Empresas da Nigéria de 2013 e a Enquete Colaborativa do Escritório Nacional de Estatística, dos 41 milhões de PMEs da Nigéria, a surpreendente parcela de 70% não tem nenhuma forma de proteção sobre suas criações intelectuais. Esta situação é devida a uma série de gargalos.
Desafios que dificultam a proteção da PI pelas PMEs nigerianas
Um dos principais obstáculos à utilização da PI pelas PMEs é a baixa taxa de sensibilização à importância da PI. As PMEs muitas vezes não sabem como proteger suas criações, nem quais delas têm de ser protegidas. Isto se deve ao fato de um grande número de PMEs nigerianas ainda operarem no âmbito de uma economia informal em que a instrução sobre PI é particularmente baixa e as motivações culturais muitas vezes moldam as percepções sobre a proteção da PI.
O custo é outro importante obstáculo. Mesmo entre as PMEs que estão plenamente informadas sobre os benefícios dos direitos de PI para as suas operações comerciais, os elevados custos de proteção da PI constituem um importante obstáculo. Na Nigéria, por exemplo, o custo de um pedido de patente normalmente chega a cerca de USD 1.500 (aproximadamente ₦ 619.000), com a inclusão de taxas legais – uma soma que representa a totalidade do capital de um certo número de PMEs nigerianas. Como a questão financeira é problemática para muitas PMEs, esses custos elevados constituem um grande desestímulo para a proteção da PI.
Além disso, a fraca aplicação dos direitos de PI na Nigéria tem travado a inovação e a proteção da PI por parte das PMEs. Um exemplo disto é a prevalência onipresente da pirataria no país. Todos os anos, a Nigéria perde cerca de USD 3 bilhões em virtude da pirataria. A prevalência da pirataria é aparentemente confirmada pela participação extremamente reduzida da Nigéria nas arrecadações anuais de royalties na África, apesar do fato de a indústria criativa do país ser uma das mais fortes na África. O Relatório Global de Arrecadações da CISAC para 2020 mostra que a Argélia, o Marrocos e a África do Sul representaram mais de 70% das arrecadações de royalties do continente em 2020. Diante do desvio pelos piratas externos da maior parte das receitas que normalmente deveriam reverter para os criadores, as PMEs sentem-se pouco motivadas para continuar a inovar, a criar ou a investir na proteção de suas criações. A forte prevalência de infrações à PI tem resultado em uma atitude de apatia em relação à proteção da PI.
Opções de políticas para o caminho a ser seguido
Para que a Nigéria possa utilizar a PI para aumentar a competitividade de suas PMEs, será necessário que adote uma tripla estratégia referente à sensibilização à PI e à redução de custos, a uma aplicação mais rigorosa da PI e à assistência na comercialização da PI.
Sensibilização e redução de custos
Para combater a falta generalizada de conhecimento por parte das PMEs sobre a natureza e a proteção da PI, será necessário desenvolver uma sensibilização a nível local para a importância dos ativos de PI e para a forma como tais ativos tornam as empresas mais competitivas. Esses programas de sensibilização a nível local deverão visar agrupamentos específicos de PMEs como o mercado Onitsha em Anambra, o mercado Yaba em Lagos e o mercado Kurmi em Kano.
Posteriormente, deverá ser instaurada uma iniciativa especial de assistência jurídica para as PMEs. O Escritório da OMPI na Nigéria poderá associar-se a essa estratégia, implementando parcerias com escritórios de advocacia que estejam dispostos a fornecer serviços gratuitos de consultoria para as PMEs sobre o depósito de patentes ou de marcas. Dado que os serviços jurídicos representam frequentemente a parte mais elevada dos custos incorridos durante o processo de depósito de direitos de PI, tal estratégia suprimiria um elevado encargo financeiro para as PMEs, incentivando assim a proteção da PI. Uma estratégia semelhante tem se revelado eficaz nos EUA, em que centenas de PMEs americanas indigentes se beneficiaram com essa assistência com vista à proteção de suas invenções.
Aplicação mais rigorosa da PI
Uma força especial de aplicação da PI poderá ser criada com vista a reprimir as infrações à PI. Tal iniciativa poderá incluir uma intensa cooperação inter-agências junto a instituições relevantes como a Comissão Nigeriana de Direitos de Autor (NCC), a Organização de Normas da Nigéria (SON) e o Serviço Aduaneiro da Nigéria. Tal medida ajudará a reduzir a prevalência das infrações à PI no mercado interno, ao mesmo tempo que impedirá o afluxo de produtos pirateados provenientes de outros países. Ao adotar esta medida, a Nigéria tornar-se-á capaz de restaurar a confiança pública em seu sistema de aplicação da PI, incentivando ainda mais as empresas a protegerem suas criações.
Assistência na comercialização da PI
Uma estratégia nacional que reforce a comercialização da PI é particularmente importante, uma vez que a capacidade de impulsionar o crescimento econômico através das PMEs é determinada, em grande parte, pela comercialização de ativos de PI. Um programa governamental voltado para o incentivo do financiamento apoiado pela PI ajudará muito a apoiar as PMEs na comercialização de seus ativos de PI. Com tal programa, as PMEs poderão obter acesso a facilidades de crédito servindo-se de seus ativos de PI como garantia. Isto ampliará ainda mais o acesso das PMEs ao financiamento, aumentando posteriormente suas capacidades de competir com eficácia no mercado. Embora as instituições financeiras nigerianas possam, de um modo geral, ser pouco atraídas por garantias de PI, em virtude de questões de avaliação, esse desafio poderá ser contornado através da criação de um modelo padronizado de avaliação de PI pelo Registro de Marcas, Patentes e Desenhos.
Uma estratégia nacional que incentive a comercialização de PI é particularmente importante, uma vez que a capacidade de impulsionar o crescimento econômico através das PMEs é determinada, numa grande medida, pela comercialização de ativos de PI.
Alternativamente, um mercado de PI digital poderá ser instaurado para as PMEs inovadoras venderem ou licenciarem os seus direitos de PI. Investidores nacionais e internacionais interessados em investir nos ativos de PI da Nigéria também poderão se candidatar à aquisição de direitos de PI através da plataforma. Esta estratégia ajudará significativamente as PMEs a obterem pronto acesso a um mercado para a comercialização dos seus ativos de PI. A Dinamarca adotou uma estratégia semelhante em 2007, que produziu resultados impressionantes. Desde a instauração do Mercado Dinamarquês de PI, várias PMEs licenciaram os seus direitos de PI através da plataforma.
Em conclusão, o surto da pandemia de coronavírus infligiu um possante golpe à economia nigeriana. No entanto, com os ativos intelectuais das suas PMEs, a Nigéria será capaz de traçar um novo caminho para se recuperar dos seus males econômicos atuais. Assim, é imperativo que a Nigéria alinhe as suas políticas no sentido de criar um âmbito que incentive as suas PMEs a inovarem e a comercializarem continuamente as suas inovações. Desta forma, o país será capaz de otimizar o potencial das suas PMEs, com vista a alcançar níveis sem precedentes de crescimento econômico.
Sobre o Concurso Nacional de Ensaios da OMPI em 2021
Em abril de 2021, o Escritório da OMPI na Nigéria lançou o segundo Concurso Nacional de Ensaios da OMPI sobre PI, como parte das comemorações do Dia Mundial da Propriedade Intelectual em 2021 na Nigéria, sobre o tema PI e PMEs: Levando Suas Ideias para o Mercado. Com o objetivo fundamental de promover a pesquisa e a aprendizagem no campo da propriedade intelectual (PI), o concurso foi aberto a todos os estudantes que frequentam instituições terciárias na Nigéria. Os participantes tinham a obrigação de apresentar um ensaio de 1500 palavras sobre o tema Propriedade Intelectual, PMEs e Recuperação Econômica na Nigéria. Este concurso atraiu 143 inscrições de 29 instituições terciárias e 19 disciplinas distintas.
Um painel de 18 juízes especializados foi nomeado pelo Escritório da OMPI na Nigéria para avaliar as participações. Foram nomeados 15 finalistas e três vencedores, cada um dos quais recebeu um Certificado de Conclusão da OMPI, bolsas de estudo para cursos à distância da OMPI, estágio profissional de PI ou oportunidades de bolsas de inovação, uma viagem de estudos de PI patrocinada pela OMPI a Abuja, bem como recursos e materiais da OMPI. Além disso, a grande vencedora, Oyinkansola Komolafe, recebeu uma bolsa de estudos da OMPI para participar do Curso Combinado de Certificado Internacional Avançado em Administração de Ativos de PI (AICC), ao passo que o primeiro laureado recebeu bolsas de estudos para a Escola de Verão da OMPI na África do Sul.
A Revista da OMPI destina-se a contribuir para o aumento da compreensão do público da propriedade intelectual e do trabalho da OMPI; não é um documento oficial da OMPI. As designações utilizadas e a apresentação de material em toda esta publicação não implicam a expressão de qualquer opinião da parte da OMPI sobre o estatuto jurídico de qualquer país, território, ou área ou as suas autoridades, ou sobre a delimitação das suas fronteiras ou limites. Esta publicação não tem a intenção de refletir as opiniões dos Estados Membros ou da Secretaria da OMPI. A menção de companhias específicas ou de produtos de fabricantes não implica que sejam aprovados ou recomendados pela OMPI de preferência a outros de semelhante natureza que não são mencionados.