Eco Panplas: tornando mais verde a reciclagem de embalagens de óleo lubrificante
Monica Miglio Pedrosa, escritora independente
Em 2020, segundo a empresa de análise de dados Statista, a demanda mundial de óleo lubrificante atingiu 37 milhões de toneladas métricas. Os lubrificantes são fundamentais para otimizar a eficiência e segurança das máquinas, mas o descarte das embalagens plásticas em que eles chegam aos consumidores representa uma grave ameaça ambiental e sua descontaminação há muito constitui um nó górdio industrial.
Basta 1 litro de óleo lubrificante para contaminar 1 milhão de litros de água. Só no Brasil, são descartadas 1 bilhão de embalagens plásticas de óleo lubrificante por ano. Mesmo depois de essas embalagens terem seu conteúdo esvaziado, sobram resíduos em seu interior que somam cerca de 2 milhões de litros de óleo – resíduos esses que vão parar no meio ambiente. Atualmente, apenas 9% das embalagens são recicladas. Os métodos tradicionais de descontaminação utilizam enormes quantidades de água e não são capazes de remover totalmente os resíduos de óleo, o que faz das embalagens um material de baixa qualidade para reciclagem.
Reconhecendo a escala do problema e seu grave impacto ambiental, a empresa brasileira Eco Panplas desenvolveu uma solução limpa, segura e sustentável que é 30% mais barata que os métodos tradicionais de reciclagem e já conquistou diversos prêmios nacionais e internacionais. A empresa planeja construir cinco novas unidades em diversos pontos do país, com capacidade para reciclar até 24 mil toneladas métricas de embalagens por ano. O CEO da Eco Panplas, Felipe Cardoso, falou à Revista da OMPI sobre sua trajetória empresarial, a importância das patentes para a empresa e os planos de uma futura expansão em mercados internacionais.
Só no Brasil, são descartadas 1 bilhão de embalagens plásticas de óleo lubrificante por ano. Mesmo depois de essas embalagens terem seu conteúdo esvaziado, sobram resíduos em seu interior que somam cerca de 2 milhões de litros de óleo – resíduos esses que vão parar no meio ambiente.
Por que a opção pelo setor de reciclagem?
Antes de estudar administração de empresas e me tornar um empresário, eu trabalhei no setor corporativo, onde liderava uma equipe de marketing. Mas eu sempre quis ter o meu próprio negócio e atuar em uma área em que pudesse gerar benefícios para a sociedade. A reciclagem de plásticos me pareceu uma proposta de valor interessante e ainda em 2011 eu criei uma empresa chamada EcoPan.
E deu certo?
Infelizmente, não. Trabalhávamos com reciclagem de resíduo pós-industriais. Acontece que, para reduzir custos, a maioria das empresas atualmente recicla internamente o próprio lixo produzido. De qualquer forma, a experiência serviu para estabelecer as bases da Eco Panplas, que eu e três sócios fundamos em 2014.
Depois de encerrar as atividades da EcoPan, visitei mais de 300 empresas e identifiquei uma oportunidade: nenhuma empresa de reciclagem conseguia resolver o problema da descontaminação das embalagens usadas de óleo lubrificante. Pesquisei o assunto e descobri que dentro e fora do Brasil, o processo de reciclagem era sempre o mesmo: usa-se água para remover os materiais contaminantes, com impacto negativo em termos de desperdício de água e contaminação de aterros sanitários e do meio ambiente.
Nosso objetivo é chegar a um faturamento de R$ 43 milhões até o fim de 2023 e a um volume reciclado de 24 mil toneladas métricas de embalagens de óleo lubrificante por ano até 2026.
Como se deu a criação da Eco Panplas?
Conheci um empresário local, que me apresentou um projeto em que o sócio dele, que era engenheiro químico, vinha trabalhando já fazia dois anos. Inicialmente eles queriam me vender o projeto, mas eu e o meu sócio os convidamos a entrar em uma sociedade conosco e depositar um pedido de patente. Eles toparam e hoje nós quatro formamos a equipe da Eco Panplas; dois de nós com formação em marketing e administração, um engenheiro mecânico e um engenheiro químico e ambiental.
Quanto tempo levou o desenvolvimento da tecnologia?
Levamos três anos para alcançar viabilidade técnica, financeira e ambiental. Depois foram mais três anos para validar nossa tecnologia no mercado.
Em 2014, depositamos nosso pedido de patente no Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI), por meio de seu Programa de Patentes Verdes. Isso foi fundamental para nos dar credibilidade dentro e fora do Brasil.
Desde o início, sabíamos que a obtenção de uma patente era fundamental para proteger os interesses da empresa, validar nossa inovação e impulsionar nosso valor comercial. Uma patente é um grande diferencial para atrair investidores e, no futuro, possibilitará que aproveitemos oportunidades de licenciamento.
Como tem sido o interesse em relação à tecnologia da Eco Panplas?
Nossa tecnologia vem despertando muito interesse. Recebemos mais de 30 prêmios por ela dentro e fora do Brasil. Esses prêmios também são uma contribuição importante para o fortalecimento da credibilidade da nossa solução. Em 2020, formos a primeira empresa brasileira a vencer o concurso Latam USD 100K Entrepreneurship Competition, que é apoiado pela escola de administração do Instituto de Tecnologia de Massachussetts (MIT) e pelo Instituto Tecnológico de Buenos Aires (ITBA). Nossa tecnologia também foi considerada a melhor solução inovadora dos últimos dez anos na América Latina pela Fundación FEMSA, do México. Vencemos a 2º Concurso de Invenções Patenteadas da América Latina, organizado pelo PROSUR, e exibimos nossa tecnologia na Exposição Internacional de Invenções de Genebra. Apresentamos nossa solução na COP26, em Glasgow, e vencemos o Energy Globe Award Brazil 2021, um dos prêmios ambientais mais importantes do mundo. Além disso, participamos de feiras de exposição na China e do concurso Green Tech Challenge, na Europa.
Como foi a experiência de buscar proteção de patente por meio do inpi?
Em 2014, nós contratamos um escritório de advocacia especializado em direitos de propriedade intelectual para nos ajudar com a elaboração e depósito do pedido de patente. Foi uma decisão acertada, pois, além de ter um entendimento muito mais abrangente e aprofundado do processo, eles têm ampla experiência na redação de pedidos de patente e sabem como acelerar a aprovação. Também foi fundamental para nós pedir a nossa patente no âmbito do Programa de Patentes Verdes, pois isso validou a nossa solução como uma tecnologia limpa verdadeiramente inovadora. O Programa de Patentes Verdes prioriza tecnologias ambientalmente responsáveis e acelera todo o processo de patenteamento. Nossa patente foi concedida em 2017.
Como funciona a solução de vocês?
As embalagens plásticas contaminadas que recebemos são moídas e depois descontaminadas com um solvente biodegradável e inodoro que não gera resíduos. Por meio de processos físicos, químicos e mecânicos, o solvente remove o óleo da embalagem plástica e os elementos iniciais são separados em plástico, rótulos e óleo. Ao final do processo, geramos plástico triturado descontaminado, que pode ser reutilizado em aplicações industriais, inclusive na fabricação de novas embalagens para lubrificantes. Vendemos o óleo recuperado para a indústria de refino. Nosso processo de descontaminação não usa água e é 30% mais barato que o modelo de reciclagem tradicional para esses produtos. Além disso, os resíduos reciclados são totalmente reutilizáveis, o que significa que não temos custos com o descarte de resíduos.
Quais são os planos de vocês para a Eco Panplas?
Em 2019, a Eco Panplas foi certificada como uma empresa B, pois o desenvolvimento social e ambiental é um elemento central do nosso modelo de negócios, o que significa que estabelecemos um equilíbrio entre propósito e lucro. Pretendemos expandir nossa capacidade de reciclagem em 2022. A unidade piloto, localizada em Hortolândia, no interior do estado de São Paulo, já atingiu sua capacidade de produção anual de aproximadamente 1,5 mil toneladas métricas, de modo que este ano estamos construindo outra unidade, com capacidade de reciclagem cinco vezes maior do que a de Hortolândia. Nosso objetivo é chegar a um faturamento de R$ 43 milhões (aproximadamente US$ 8,26 milhões) até o fim de 2023 e a um volume reciclado de 24 mil toneladas métricas de embalagens de óleo lubrificante por ano até 2026. Para atingir essas metas, planejamos operar seis unidades no total – três no estado de São Paulo, uma em Minas Gerais, uma na região Sul e uma no Nordeste.
Já estamos testando nossa solução na reciclagem de embalagens de óleo de cozinha, óleo vegetal, tintas e cosméticos. Os resultados têm sido excelentes. Esses mercados são completamente inexplorados e podem dar origem a outros tipos de uso para os materiais reciclados. Nosso desejo é que a Eco Panplas se transforme em um grande complexo de reciclagem de embalagens cuja descontaminação não pode ser feita com processos simples, com uso de água, e que possamos criar alto valor ambiental, econômico e financeiro para todos os atores envolvidos em nossas iniciativas.
Vocês pretendem atuar em mercados fora do Brazil?
Sim, já participamos de alguns programas no exterior e constatamos que há uma demanda forte para a nossa tecnologia fora do Brasil. América Latina, Europa, China, Oriente Médio e Índia são potenciais candidatos para o nosso plano de expansão internacional. Mas antes precisamos garantir que as soluções desenvolvidas por nós estejam protegidas nesses mercados. É por isso que pretendemos usar o Tratado de Cooperação em matéria de Patentes (PCT), uma vez que esse instrumento simplifica o processo de depósito de pedidos de proteção de patente em vários países, além de ser vantajoso em termos de custo.
Empresas como Shell, Ambev e Braskem também apoiaram a eco panplas por meio de seus programas de inovação aberta. Há outras organizaçoes interessadas na solução de vocês?
É cada vez maior o número de empresas interessadas em investir em reciclagem e é por isso que temos recebido propostas de fundos de capital de risco. Há também empresas interessadas em licenciar nossa tecnologia e levá-la para o exterior. Daí a importância crítica dos nossos direitos de propriedade intelectual (PI). Já fomos abordados por empresas do setor petroquímico e de gestão de resíduos e reciclagem, e estamos conversando com prefeituras e governos estaduais que desejam solucionar esse problema de gestão de resíduos. Para nós, tudo isso faz muito sentido: quanto maior o volume processado, maiores os benefícios sociais e ambientais que seremos capazes de gerar. Essa é a nossa missão e o principal legado que queremos deixar para a sociedade.
A Revista da OMPI destina-se a contribuir para o aumento da compreensão do público da propriedade intelectual e do trabalho da OMPI; não é um documento oficial da OMPI. As designações utilizadas e a apresentação de material em toda esta publicação não implicam a expressão de qualquer opinião da parte da OMPI sobre o estatuto jurídico de qualquer país, território, ou área ou as suas autoridades, ou sobre a delimitação das suas fronteiras ou limites. Esta publicação não tem a intenção de refletir as opiniões dos Estados Membros ou da Secretaria da OMPI. A menção de companhias específicas ou de produtos de fabricantes não implica que sejam aprovados ou recomendados pela OMPI de preferência a outros de semelhante natureza que não são mencionados.