Lisa Jorgenson e Aikaterini Kanellia, Setor de Patentes e Tecnologia, OMPI
A desigualdade de gênero na área de propriedade intelectual (PI) é um problema real: do total de pedidos de patente depositados via Tratado de Cooperação em matéria de Patentes (PCT), apenas cerca de 16% dos requerentes são mulheres, percentual que, por si só, revela a imensidão do manancial de mentes e ideias brilhantes que permanece inexplorado. Estimativas da OMPI indicam que, no ritmo atual, a paridade de gênero entre inventores e inventoras listados nos pedidos PCT não será alcançada antes de 2064. Se agirmos agora para oferecer oportunidades e apoio a mulheres inovadoras, poderemos destravar seu potencial de inovação, fortalecer os ecossistemas de PI e inovação e promover o crescimento econômico.
Apesar da enormidade do desafio, observam-se sinais de progresso. Há um número crescente de iniciativas promissoras nas áreas de inovação, criatividade e empreendedorismo que promovem ações coordenadas para ampliar a participação das mulheres nos segmentos de inovação e criatividade. Exemplo disso é o fato de que, no mundo inteiro, diversos institutos nacionais de propriedade intelectual estão implementando medidas para garantir apoio às mulheres em sua jornada pelo universo da PI. Essas iniciativas têm um objetivo comum: viabilizar a participação das mulheres no sistema de propriedade intelectual por meio da oferta de descontos nas taxas de depósito e da prestação de auxílio jurídico gratuito na preparação e no depósito de pedidos de patente.
No mundo inteiro, diversos institutos nacionais de propriedade intelectual estão implementando medidas para garantir apoio às mulheres em sua jornada pelo universo da PI.
Uma dessas iniciativas é o Programa Juana de Patentes e Proteção de Desenhos Industriais (JPIP), do Instituto de Propriedade Intelectual das Filipinas (IPOPHL), que ajuda mulheres inventoras e designers a proteger e fazer valer seus direitos de propriedade intelectual. Na Índia, a Controladoria Geral de Patentes, Desenhos e Marcas (CGPDTM) oferece um desconto de 80% em suas taxas para startups e mulheres empreendedoras. Por sua vez, nos Estados Unidos, o Instituto de Marcas e Patentes (USPTO) reduziu suas taxas para micro e pequenas empresas em 60% e 80%, respectivamente. Além disso, o Programa Pro Bono do USPTO presta assessoria jurídica gratuita para inventores e pequenas empresas, muitas das quais são comandadas por mulheres, ajudando-as a levar suas ideias para o mercado. Já no México, o Instituto Mexicano da Propriedade Industrial (IMPI), por meio de seu programa Mulheres Inovadoras, oferece às mulheres diversos recursos, incluindo programas de capacitação, mentorias e outras oportunidades de formação, para auxiliá-las a agregar valor a suas tecnologias inovadoras e levá-las ao mercado.
Na OMPI, assumimos o compromisso de garantir o apoio e os recursos necessários para que, por meio do sistema de propriedade intelectual, as mulheres possam proteger e ampliar o valor de seu trabalho. Dessa maneira, não apenas beneficiamos as mulheres, como fortalecemos nossa capacidade coletiva de desenvolver tecnologias e soluções de ponta, capazes de transformar nossas comunidades. Também nos empenhamos em criar oportunidades que viabilizem o êxito de um número maior de empresas comandadas por mulheres, fortalecendo a resiliência econômica nesses tempos difíceis. Quando se garante que todas as mulheres tenham a oportunidade de dar vazão a sua paixão por ciência, tecnologia e artes, independentemente de responsabilidades familiares ou pausas na carreira, todo mundo sai ganhando.
Na OMPI, assumimos o compromisso de garantir o apoio e os recursos necessários para que, por meio do sistema de propriedade intelectual, as mulheres possam proteger e ampliar o valor de seu trabalho.
Reconhecendo a necessidade de garantir apoio para que as mulheres reingressem no mercado de trabalho após interrupções relacionadas a responsabilidades familiares, o Departamento de Ciência e Tecnologia da Índia lançou o Programa Mulheres Cientistas (WOS). O programa disponibiliza verbas de pesquisa e bolsas de estudo como um incentivo para que mulheres que tenham deixado temporariamente o mercado de trabalho sigam carreiras nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática. Até o momento, o programa ofereceu formação para aproximadamente 800 mulheres. Cerca de 270 delas tornaram-se agentes registradas de patentes, trabalhando com inventores e inventoras para ajudá-los a obter proteção legal para suas patentes. Atualmente, elas representam em torno de 10% do total de agentes de patentes e facilitadores de PI para startups em atividade na Índia. Programas desse tipo contribuem para criar um ambiente de PI e inovação mais inclusivo, onde as mulheres podem exercer seus talentos e perseguir suas aspirações em benefício de todos.
A coleta de dados sobre a participação das mulheres nas áreas de inovação e propriedade intelectual é um foco importante, pois ajuda a identificar a escala e as origens do desafio e, com base nisso, garantir apoio a iniciativas voltadas para a redução das desigualdades de gênero.
A OMPI lidera esforços internacionais envolvendo a coleta de dados relativos a PI e gênero, com o intuito de municiar os formuladores de políticas públicas com as evidências necessárias à elaboração de políticas de gênero realmente efetivas. Complementando esses esforços, em 2022 a OMPI publicou um Guia para a elaboração de análises de gênero a partir de dados sobre inovação e PI voltado para institutos de propriedade intelectual, empresas e universidades. O Guia apresenta uma síntese de boas práticas no que tange à elaboração de indicadores de gênero nas áreas de inovação e PI. O objetivo é auxiliar governos e pesquisadores a alcançar um equilíbrio de gênero mais equitativo ao realizar estudos e desenhar políticas nas áreas de propriedade intelectual e inovação.
Em toda a comunidade internacional de PI, observam-se esforços importantes nessa área. O Instituto Europeu de Patentes (IEP), por exemplo, adota ações para promover a diversidade e a inclusão nos setores de inovação e propriedade intelectual, chamando a atenção para as realizações de inventoras bem-sucedidas e realizando campanhas de conscientização sobre a desigualdade de gênero no segmento de atividades inventivas. Em um relatório intitulado Participação das mulheres na atividade inventiva, o IEP lança luz sobre o principal desafio com que se deparam os países europeus em seus esforços para ampliar a participação das mulheres nas atividades científicas, citando essa participação como fator decisivo para garantir a sustentabilidade e a competitividade do bloco no futuro. O relatório analisa a participação das mulheres nos 39 Estados membros da organização e oferece perspectivas e evidências sobre gênero e atividades de patenteamento na Europa, na expectativa de que a diversidade e a inclusão sejam uma prioridade nos setores europeus de inovação e PI.
Iniciativas semelhantes são observadas na América Latina. A Rede Latino-Americana de Propriedade Intelectual e Gênero vem abrindo caminho para garantir às mulheres igualdade de acesso ao sistema de PI e a outros recursos que lhes possibilitem transformar suas aspirações em soluções comercializáveis, com o apoio integral de suas comunidades e instituições. Participam da rede os institutos de propriedade intelectual da Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, México, Peru, República Dominicana e Uruguai. Além disso, a iniciativa promove o intercâmbio de boas práticas e experiências entre os institutos participantes. O objetivo? Reduzir a desigualdade de gênero, proporcionando os conhecimentos, habilidades e recursos de que as mulheres precisam para ter êxito nas áreas de inovação e empreendedorismo. Cuba, Panamá e Paraguai também aderiram recentemente à rede. A OMPI se orgulha de ser um membro honorário dessa arrojada iniciativa.
Compartilhando e implementando estratégias e iniciativas exitosas dessa maneira, inspiramos uns aos outros a promover mudanças positivas em toda a comunidade global. Como mostram essas iniciativas pioneiras, quando trabalhamos em conjunto e somamos nossos conhecimentos, recursos e paixões, criamos sinergias poderosas, que rompem barreiras e abrem portas para as mulheres nas áreas de inovação e empreendedorismo, com resultados que nos beneficiam coletivamente.
Quando trabalhamos em conjunto e somamos nossos conhecimentos, recursos e paixões, criamos sinergias poderosas, que rompem barreiras e abrem portas para as mulheres nas áreas de inovação e empreendedorismo, com resultados que nos beneficiam coletivamente.
OMPI prioriza mentoria em PI para mulheres empreendedoras
Reconhecendo o valor das atividades de mentoria para dotar as empreendedoras das habilidades e ferramentas de que elas precisam para promover seus objetivos empresariais, a OMPI está lançando programas de mentoria em diferentes regiões do mundo. São programas que oferecem orientações, conhecimentos e recursos para auxiliar empresas comandadas por mulheres a proteger seus ativos de propriedade intelectual e fazer uso deles para impulsionar seu crescimento.
Na África, por exemplo, no âmbito do projeto PI para Mulheres Empreendedoras, da OMPI, 70 mulheres empreendedoras de Uganda registraram suas marcas, dando um primeiro passo importante para poderem fortalecer sua identidade comercial, elaborar estratégias publicitárias mais eficientes e competir no mercado.
Mentoras como Lilian Nantume Mubiru são essenciais para o êxito do projeto, oferecendo acesso a redes de contatos e recursos que possibilitam às mulheres destravar todo o seu potencial. “Percebemos que essas mulheres são talentosas, mas não recebem ajuda”, diz Mubiru, observando que, ao levar a propriedade intelectual às bases da sociedade e oferecer apoio em nível comunitário, o projeto empodera mulheres talentosas e as ajuda a promover seus objetivos empresariais e realizar todo o seu potencial.
Segundo Caroline Matovu, uma das empreendedoras que participaram do programa, o registro de sua marca fortaleceu a confiança dos clientes. “Agora os meus clientes confiam nos meus produtos”, conta ela. O aprendizado proporcionado pela experiência acabou levando Matovu a se tornar uma das novas mentoras do programa. Sob sua mentoria, a fabricante de temperos Florence Nabukenya também registrou a marca de sua empresa, obtendo um aumento significativo nas vendas e nos lucros. A participação no programa fez com que Nabukenya ampliasse sua visão e estabelecesse uma colaboração com agricultoras locais, que são responsáveis por 75% da matéria-prima usada em seus produtos. Dessa maneira, ela incentiva o emprego local e contribui para o sustento das agricultoras, que agora podem pagar pela educação de seus filhos.
As mulheres podem contribuir de forma decisiva para a redução das desigualdades de gênero. Basta que tenham confiança em suas capacidades, mantenham-se focadas em suas aspirações e, sobretudo, entrem em ação!
Organizado em bases semelhantes, o Programa Mulheres Inovadoras e Empreendedoras da Ásia-Pacífico, da OMPI, também vem produzindo impactos positivos. Até o momento, 150 mulheres de países como Índia, Nepal, Sri Lanka e Vietnã foram conectadas ao mundo da PI e da inovação. O programa ampliou os conhecimentos sobre propriedade intelectual dessas empreendedoras, dotando-as das habilidades e ferramentas necessárias para que possam explorar oportunidades de mercado e se beneficiar delas.
Yendi Amalia, empreendedora indonésia que se fez sozinha e hoje detém uma marca registrada, tem atuado como verdadeiro dínamo no programa, orientando e assessorando mulheres nas áreas de inovação e empreendedorismo. Segundo Amalia, o empreendedorismo confere às mulheres uma nova identidade, que lhes proporciona liberdade para crescer. “Ser uma mulher empreendedora ou líder permite que você tenha a sua própria identidade”, diz. “Você não quer que a sua identidade acabe se diluindo só porque você é mãe ou esposa de alguém. O empreendedorismo abre espaço para que a gente se desenvolva”, acrescenta.
Outra participante do programa, Nguyen Minh Tan, desenvolveu uma tecnologia inovadora para produzir sucos de frutas tropicais em forma concentrada. Graças à mentoria que recebeu de especialistas em propriedade intelectual, agora ela está em condições de levar sua tecnologia ao próximo estágio. Com efeito, ela já depositou um pedido internacional de patente no âmbito do Tratado de Cooperação em matéria de Patentes (PCT) para proteger sua tecnologia em vários países, garantindo para a sua empresa um potencial de acesso a novos mercados e de expansão significativa dos negócios.
Histórias de sucesso como essas ilustram o impacto transformador que a oferta de mentorias para mulheres em matéria de propriedade intelectual pode ter para o crescimento empresarial, além de realçar as possíveis repercussões positivas para a economia e a comunidade local.
Nossa esperança é que o êxito dessas mulheres sirva de inspiração para que mais e mais mulheres tenham a ousadia de ir atrás de suas ambições.
Ao criar mais oportunidades para que mulheres talentosas tenham acesso a mentorias em propriedade intelectual e empreendedorismo, podemos fazer a diferença. Ao apoiar inventoras e empreendedoras, possibilitamos que essas mulheres realizem o seu potencial e, assim, criamos um futuro melhor para todos.
Ao apoiar inventoras e empreendedoras, possibilitamos que essas mulheres realizem o seu potencial e, assim, criamos um futuro melhor para todos.
Embora a persistência da desigualdade de gênero nas áreas de propriedade intelectual e inovação pareça ser um problema complexo, as mulheres podem contribuir de forma decisiva para a sua superação. Basta que tenham confiança em suas capacidades, mantenham-se focadas em suas aspirações e, sobretudo, entrem em ação! O empoderamento vem de dentro de nós. Ninguém conseguirá nos dar poder se não estivermos ativamente envolvidas no processo.
Eis algumas sugestões para um bom começo
Nosso plano de ação em matéria de propriedade intelectual e gênero, a ser publicado em breve, oferece parâmetros para a atuação da OMPI na promoção e no incentivo à participação das mulheres nos ecossistemas de PI e inovação em todo o mundo.
O Plano de ação em matéria de propriedade intelectual e gênero da OMPI se estrutura em torno de três pilares de atuação
Agradecimentos: Kristine Schlegelmilch, Setor de Patentes e Tecnologia, OMPI.
A Revista da OMPI destina-se a contribuir para o aumento da compreensão do público da propriedade intelectual e do trabalho da OMPI; não é um documento oficial da OMPI. As designações utilizadas e a apresentação de material em toda esta publicação não implicam a expressão de qualquer opinião da parte da OMPI sobre o estatuto jurídico de qualquer país, território, ou área ou as suas autoridades, ou sobre a delimitação das suas fronteiras ou limites. Esta publicação não tem a intenção de refletir as opiniões dos Estados Membros ou da Secretaria da OMPI. A menção de companhias específicas ou de produtos de fabricantes não implica que sejam aprovados ou recomendados pela OMPI de preferência a outros de semelhante natureza que não são mencionados.