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BR189-j

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STJ. REsp 1630851/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/04/2017, DJe 22/06/2017

RECURSO ESPECIAL Nº 1.630.851 - SP (2014/0308065-9)

RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

RECORRENTE : RITA DE CASSIA CORRÊA

ADVOGADOS : ELIANE YACHOUH ABRÃO E OUTRO(S) - SP028250

PEDRO PEREIRA DE ALVARENGA NETO E OUTRO(S) - SP275935

RECORRIDO : MICROSOFT INFORMÁTICA LTDA

ADVOGADOS : MAURO EDUARDO LIMA DE CASTRO - SP146791 RICARDO CHABU DEL SOLE E OUTRO(S) - SP309132

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DIREITOS AUTORAIS E DIREITOS DA PERSONALIDADE. GRAVAÇÃO DE VOZ. COMERCIALIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO PELA RÉ. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/73. NÃO OCORRÊNCIA. DIREITOS AUTORAIS. GRAVAÇÃO DE MENSAGEM TELEFÔNICA QUE NÃO CONFIGURA DIREITO CONEXO AO DE AUTOR, NÃO ESTANDO PROTEGIDA PELA LEI DE DIREITOS AUTORAIS. PROTEÇÃO À VOZ COMO DIREITO DA PERSONALIDADE. POSSIBILIDADE DE DISPOSIÇÃO VOLUNTÁRIA, DESDE QUE NÃO PERMANENTE NEM GERAL. AUTORIZAÇÃO PARA A UTILIZAÇÃO DA GRAVAÇÃO DA VOZ QUE PODE SER PRESUMIDA NO PRESENTE CASO. GRAVAÇÃO REALIZADA ESPECIFICAMENTE PARA AS NECESSIDADES DE QUEM A UTILIZA. UTILIZAÇÃO CORRESPONDENTE AO FIM COM QUE REALIZADA A GRAVAÇÃO. INDENIZAÇÃO NÃO DEVIDA.

1.        Pretensão da autora de condenação da empresa requerida ao pagamento de indenização pela utilização de gravação de sua voz sem sua autorização, com fins alegadamente comerciais, por ser ela objeto de proteção tanto da legislação relativa aos direitos autorais, como aos direitos da personalidade.

2.        Ausência de violação do art. 535 do CPC/73, tendo o Tribunal de origem apresentado fundamentação suficiente para o desprovimento do recurso de apelação da autora.

3.        Os direitos do artista executante ou intérprete são conexos aos direitos de autor e, apesar de sua autonomia, estão intrinsecamente ligados, em sua origem, a uma obra autoral, e a ela devem sua existência.

4.        Nos termos da Lei de Direitos Autorais (Lei n. 9.610/98), apenas há direitos conexos quando há execução de obra artística ou literária, ou de expressão do folclore.

5.        Gravação de mensagem de voz para central telefônica que não pode ser enquadrada como direito conexo ao de autor, por não representar execução de obra literária ou artística ou de expressão do folclore. Inaplicabilidade da Lei n. 9.610/98 ao caso em comento.

6.        A voz humana encontra proteção nos direitos da personalidade, seja como direito autônomo ou como parte integrante do direito à imagem ou do direito à identidade pessoal.

7.        Os direitos da personalidade podem ser objeto de disposição voluntária, desde que não permanente nem geral, estando seu exercício condicionado à prévia autorização do titular e devendo sua utilização estar de acordo com o contrato. Enunciado n. 4 da I Jornada de Direito Civil.

8.        Caso concreto em que a autorização da autora deve ser presumida, pois realizou gravação de voz a ser precisamente veiculada na central telefônica da ré, atendendo especificamente às suas necessidades.

9.        Gravação que vem sendo utilizada pela ré exatamente para esses fins, em sua central telefônica, não havendo exploração comercial da voz da autora.

10.       Eventual inadimplemento contratual decorrente do contrato firmado pela autora com a terceira intermediária que deve ser pleiteado em relação a ela, e não perante a empresa requerida.

11.       RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista da Sra. Ministra Nancy Andrighi acompanhando o voto do Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze (Presidente), Moura Ribeiro e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 27 de abril de 2017. (Data de Julgamento)

MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.630.851 - SP (2014/0308065-9)

RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

RECORRENTE : RITA DE CASSIA CORRÊA

ADVOGADOS : ELIANE YACHOUH ABRÃO E OUTRO(S) - SP028250

PEDRO PEREIRA DE ALVARENGA NETO E OUTRO(S) - SP275935

RECORRIDO : MICROSOFT INFORMÁTICA LTDA

ADVOGADOS : MAURO EDUARDO LIMA DE CASTRO - SP146791 RICARDO CHABU DEL SOLE E OUTRO(S) - SP309132

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

(Relator):

Trata-se de recurso especial interposto por RITA DE CÁSSIA CORRÊA contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que negou provimento ao recurso de apelação manejado no curso da ação proposta contra MICROSOFT INFORMÁTICA LTDA.

O acórdão recorrido foi ementado nos seguintes termos:

USO INDEVIDO DE GRAVAÇÃO DE VOZ DE LOCUTORA PROFISSIONAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. SENTENÇA CONFIRMADA.

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (fls. 283-288 e-STJ).

Em seu recurso especial, a recorrente sustenta a ocorrência de violação do art. 535, I e II, do CPC, uma vez que o Tribunal de origem não sanou as omissões apontadas nos embargos de declaração acerca da legitimidade do uso das gravações de sua voz. Alega que o acórdão recorrido violou os arts. 11, 12 e 20 do CC, defendendo que, como decorrência dos direitos da personalidade, tem inequívoco direito a exigir a reparação pelo uso não autorizado de sua voz, mormente considerando que a utilização indevida se deu para fins comerciais. Salienta que, durante quase cinco anos de uso não autorizado, a recorrida utilizou sua voz, no mínimo 4.872.000 quatro milhões, oitocentos e setenta e duas mil) vezes. Aponta a ocorrência de afronta ao art. 104, II, do CC, afirmando ser nulo o contrato de compra e venda havido entre a recorrida e Infoline Digital, já que possuía como objeto a negociação sobre o uso da sua voz, o que não se mostra possível, por se tratar de bem da personalidade. Assevera a ocorrência de violação do art. 927 do CC, defendendo a responsabilidade civil da recorrida e a necessidade de sua condenação ao pagamento da indenização decorrente do uso indevido e não autorizado de sua voz. Argumenta, ainda, ter havido ofensa aos arts. 4º, 50, 90, II e § 2º, e 92 da Lei n. 9.610/98, ressaltando que a interpretação vocal é expressão artística protegida do mesmo modo que o direito autoral, sendo que a interpretação dos contratos de cessão deve ser necessariamente restritiva (fls. 305-325 e-STJ).

Foram apresentadas as contrarrazões ao recurso especial (fls. 329-341 e-STJ).

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.630.851 - SP (2014/0308065-9)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

(Relator):

Eminentes Colegas, não merece provimento o presente recurso especial. Não há a alegada violação do art. 535, I e II, do CPC/73, uma vez que o

Tribunal de origem, ao julgar o recurso de apelação interposto pela autora, apresentou fundamentação suficiente, tendo afirmado ser legítima a utilização das gravações pela ré, uma vez que decorrente de prestação de serviço para o qual a autora foi devidamente remunerada.

Não houve, assim, qualquer omissão ou contradição nos julgados do Tribunal de origem.

Versam os autos acerca de ação de indenização em que a autora pretende a reparação pelo uso de sua voz em gravação de saudação telefônica sem sua autorização, com fins comerciais.

Sustenta que a gravação foi realizada por terceiro, sob o pretexto de que seriam meros testes, para os quais teria recebido ínfima remuneração. As gravações, porém, teriam sido comercializadas à ré sem sua autorização, e estariam sendo utilizadas de forma comercial, o que ensejaria a sua responsabilidade civil.

A pretensão da autora se funda em dois argumentos.

Primeiro, o de que a sua interpretação na gravação em questão ensejaria a proteção da Lei de Direitos Autorais, que prevê expressamente que os negócios jurídicos sobre direitos autorais devem ser interpretados restritivamente, afirmando, ainda, que a sua remuneração deveria ser compatível com a quantidade de vezes em que utilizada a gravação de sua interpretação vocal.

Segundo, o de que a sua voz, por configurar direito de personalidade, não pode ser comercializada e utilizada sem sua autorização, especialmente para fins comerciais.

Examino os dois argumentos separadamente.

I                              - A interpretação artística:

Os direitos do artista intérprete e executante, embora guardem muitas semelhanças com os direitos do autor, com eles não se confundem.

Os direitos do artista executante, assim como os direitos dos produtores fonográficos e das empresas de radiodifusão, são conhecidos como direitos conexos aos de autor (direitos afins ou direitos vizinhos, em tradução da expressão em inglês neighboring rights).

No plano internacional, os direitos de autor foram objeto da Convenção de Berna, firmada em 1896. Os direitos conexos, por sua vez, foram objeto da Convenção de Roma, assinada em 1961, 65 anos depois.

Na legislação brasileira, eles são protegidos pelo mesmo diploma, Lei n.

9.610/98, popularmente conhecida como Lei de Direitos Autorais.

Os direitos conexos devem sua existência a uma obra autoral prévia. Vale dizer, o direito do artista intérprete decorre de sua intervenção, de forma original, criativa e com a devida autorização, em uma obra autoral preexistente.

Sem obra anterior, não haveria a conexão que dá nome a esses direitos. A Convenção de Roma, de fato, prevê expressamente, em seu art. 3º, que artistas intérpretes ou executantes são "os atores, cantores, músicos, dançarinos e outras pessoas que representem, cantem, recitem, declamem, interpretem ou executem, por qualquer forma, obras literárias ou artísticas".

A Convenção, de todo modo, em seu art. 9º, autoriza os Estados contratantes, em suas legislações nacionais, a estenderem a proteção de direitos conexos aos artistas que não executam obras literárias ou artísticas.

A legislação brasileira assim o fez, porém estendeu a referida proteção apenas para artistas que executem expressões do folclore.

Com efeito, a Lei n. 9.610/98, em seu art. 5º, XIII, conceitua artistas intérpretes ou executantes como, verbis:

todos os atores, cantores, músicos, bailarinos ou outras pessoas que representem um papel, cantem, recitem, declamem, interpretem ou executem em qualquer forma obras literárias ou artísticas ou expressões do folclore. (Grifou-se)

Portanto, para o ordenamento jurídico brasileiro, se não há obra autoral de natureza literária ou artística ou uma expressão do folclore preexistente a ser executada, não se mostra possível o reconhecimento de direitos conexos dos executantes.

Não questiona aqui a autonomia dos direitos conexos frente aos direitos de autor, uma vez que os artistas intérpretes ou executantes gozam de direitos independentes, especificamente elencados na Lei n. 9.610/98.

Tampouco se olvida da importância de suas atividades, de que resulta uma obra distinta, a obra interpretada.

Afirmou Carnelutti, em A Morte do Direito (Belo Horizonte: Editora Líder, 2003, p.11), que "a beleza de uma música, como a bondade de uma lei, não depende só de quem a compõe, senão também de quem as executa".

Com efeito, Antônio Chaves, ao explicitar em que consistem os direitos conexos, lecionou (em Direitos Conexos, São Paulo: LTr, 1999, p. 22) :

São, em primeiro lugar, os direitos dos artistas de interpretação musical ou dramática (em termos amplos), como elaboradores já não, evidentemente, de obras originárias (as literárias e as musicais que executam), mas de obras "conexas", isto é, que criam a partir daquelas preexistentes, adquirindo, quando meritoriamente desempenhadas, sua própria individualidade, como obras interpretadas, através de execuções "ao vivo" ou mediante gravações sonoras.

Dão, assim, vida e cor a elaborações que de outra forma não sairiam do papel, inacessíveis ao grande público, exercendo função decisiva para que o compositor seja compreendido e divulgado, aquém e além das fronteiras de seu país, e oferecem, assim, similitudes e compatibilidades com o direito de autor, a tal ponto que, vencidas as resistências iniciais, a lei não mais hesita em protegê-las em sentido análogo.

A despeito da autonomia dos direitos conexos frente aos direitos de autor, bem como de sua importância para a circulação de obras autorais e para o desenvolvimento da cultura, os direitos conexos, em sua gênese, se apoiam necessariamente, ao menos no Brasil, em obras literárias ou artísticas e em expressões do folclore.

Por este motivo, Antônio Chaves, em sua já citada obra, ao examinar a atividade realizada por locutores e narradores, embora utilize expressão cunhada na lei anterior, esclarece que:

O locutor e o narrador não criam, não interpretam, não executam obra de caráter cultural de qualquer natureza: são transmissores, pelas suas vozes - muitas delas de padrão vocal de expressiva beleza - de mensagens, sem criar, interpretar ou executar. (...)

Mas não serão artistas no alto significado da palavra, pois não exercem as chamadas belas-artes, não exercem a capacidade criadora de expressar ou transmitir tais sensações ou sentimentos.

As gravações realizadas pela recorrente em muito se assemelham ao ofício de um locutor que apenas lê uma mensagem anteriormente redigida, desprovida de qualquer natureza artística ou literária.

Pelo que se depreende do acórdão recorrido, a autora gravou uma simples saudação telefônica, a ser utilizada pela ré na espera de sua central telefônica.

Por mais elástico que se considere o conceito de obra artística e literária, ele não abrange saudações telefônicas, que, via de regra, não preenchem o requisito mínimo de originalidade necessário para o reconhecimento da proteção autoral.

A autora nem mesmo alega que a saudação telefônica por ela gravada era excepcionalmente criativa a ponto de ser considerada uma obra artística ou literária por ela executada.

Não havendo, portanto, obra autoral executada, não há falar em direito conexo, não se mostrando aplicável ao caso a Lei n. 9.610/98.

II                             - Direito da Personalidade:

Não se discute que a voz encontra proteção nos direitos da personalidade, garantidos pela Constituição da República e previstos no Capítulo II da Parte Geral do Código Civil.

A proteção à voz pode ser considerada direito autônomo da personalidade, ou mesmo parte integrante de outro direito inerente à pessoa, seja o direito à imagem seja o direito à identidade pessoal.

O simples fato de se tratar de direito da personalidade, porém, não afasta a possibilidade de exploração econômica da voz.

O exercício dos direitos da personalidade, a despeito da redação literal do art. 11 do Código Civil, são passíveis de limitação voluntária, desde que limitada.

Esse é o teor do Enunciado 4 da I Jornada de Direito Civil, em que se afirma: "O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação voluntária, desde que não seja permanente nem geral".

A possibilidade de limitação voluntária de alguns dos direitos da personalidade busca justamente proteger os interesses do próprio titular, que, podendo explorá-los economicamente, poderá deles melhor fruir.

Cito, por oportuna, lição de Carlos Alberto Bittar (Os Direitos da Personalidade. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 44):

Mas, diante das necessidades decorrentes de sua própria condição, da posição do titular, do interesse negocial e da expansão tecnológica, certos direitos da personalidade acabaram ingressando na circulação jurídica, admitindo-se ora a sua disponibilidade, exatamente para permitir a melhor fruição por parte de seu titular, sem, no entanto, afetar-se os seus caracteres intrínsecos.

(...)

Assim, são disponíveis, por via contratual, certos direitos - mediante instrumento adequados (como os de licença, de cessão de direitos e outros específicos) -, podendo, portanto, vir a ser utilizados por terceiros e nos termos restritos aos respectivos ajustes escritos.

Perfeitamente possível e válido, portanto, o negócio jurídico que tenha por objeto a gravação de voz, devendo-se averiguar apenas se foi ela gravada com autorização do seu titular e se sua utilização ocorreu dentro dos limites contratuais.

Pelo que se depreende dos fatos afirmados na sentença e no acórdão recorrido, a recorrente, contratada por terceira intermediária, procedeu à gravação de saudação telefônica específica para a recorrida.

Na gravação, a recorrente lê mensagens redigidas para serem utilizadas especificamente pela Microsoft, atendendo de forma personalizada às necessidades de sua central telefônica.

Nesse contexto, o simples fato de ter anuído com a realização da gravação em si já denota a autorização da recorrente para a utilização de sua voz. Afinal, se não desejasse ver sua voz utilizada na central telefônica da recorrida, por que procedeu à gravação?

Razoável pressupor a autorização do titular na gravação de voz realizada especificamente para as necessidades de quem as utiliza, não sendo o caso de usurpação de gravação realizada para outras finalidades.

Acerca da possibilidade de reconhecimento tácito da autorização do titular, este Superior Tribunal já teve a oportunidade de se manifestar recentemente:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE IMAGEM. POSSIBILIDADE DE CONSENTIMENTO TÁCITO, DESDE QUE INTERPRETADO DE FORMA RESTRITA E EXCEPCIONAL. USO INDEVIDO. INDENIZAÇÃO POR MATERIAIS CONFIGURADA. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA NA ESPÉCIE.

1.                           A imagem é a exteriorização da personalidade inserida na cláusula geral de tutela da pessoa humana (art. 1°, III, da CF e En. 274 das Jornadas de Direito Civil), com raiz na Constituição Federal e em diversos outros normativos federais. É, pois, intransmissível e irrenunciável (CC, art. 11), não podendo sofrer limitação voluntária, permitindo-se uma disponibilidade relativa (limitada) de expressões do uso do direito da personalidade, desde que não seja de forma geral e nem permanente (En. 4 das Jornadas de Direito Civil).

2.                           Em regra, para maior segurança e proteção, é exigível o consentimento expresso para o uso da imagem. Contudo, a depender da situação em concreto, admite-se o consentimento presumível, desde que, pela sua própria natureza, seja interpretado com extrema cautela, de forma restrita e excepcional.

3.                           Nos termos da Súm 403 do STJ, "independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais".

4.                           No caso concreto, a recorrida publicou, em revista especializada e de grande circulação, fotografias dos recorrentes em matéria relacionada à gravidez, sem que houvesse a autorização expressa destes, não se sabendo ao certo quais foram os limites de eventual consentimento perfectibilizado, sendo devido o dano material, pela utilização indevida da imagem.

5.                           No entanto, não há falar em dano moral, pois os recorrentes acabaram concordardando, ainda que tacitamente, com a exposição de suas imagens na revista editada pela recorrida, pois foram eles próprios que forneceram as fotografias, com os respectivos negativos, para a escolha e divulgação pela revista, o que revela o interesse dos mesmos em se ver expostos na matéria de circulação nacional, além de que, a própria Corte local salientou que a matéria foi "respeitosa, inteligente, bem redigida e primorosamenle produzida". 6. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1384424/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 11/10/2016, DJe 21/11/2016)

A recorrente sustenta que a referida gravação teria sido realizada a título de testes perante a terceira intermediária, não tendo sido contratada sua comercialização, sendo-lhe devido valor adicional para tanto.

Ocorre que a recorrente e a recorrida não firmaram negócio jurídico entre elas, mas, sim, por meio da intermediária Infoline Digital.

Se a terceira não cumpriu com suas obrigações firmadas perante a recorrente, tendo comercializado sua voz sem ter lhe pagado o valor integralmente acordado, deve buscar o adimplemento contratual, e não a responsabilização civil da recorrida, sob pena de incorrer em comportamento contraditório.

Mostra-se patente a boa-fé da recorrida, que, ao contratar gravação de saudação telefônica personalizada, específica para suas necessidades, presumiu que o titular da voz estava de acordo com sua utilização.

Ademais, consoante afirmado na sentença e no acórdão recorrido, a gravação está sendo utilizada pela recorrida Microsoft exatamente para a finalidade pretendida com a gravação, não tendo havido qualquer utilização indevida, verbis (fl.206 e-STJ):

Nesta conformidade, resulta como consequência lógica que a Ré adquiriu da empresa mencionada o material em questão e utilizou-o na forma autorizada, precisamente em sua central de telefonia.

De fato, a alegação da autora de que a gravação de sua voz está sendo utilizada para fins comerciais beira o comportamento contraditório, o que é vedado pelo ordenamento jurídico, por afrontar a boa-fé objetiva.

A recorrida não está utilizando sua voz para fins publicitários ou para alavancar suas vendas de qualquer outra forma, mas a tem utilizado exatamente para o mesmo fim com que foi gravada.

Sendo assim, considerando os fatos estabelecidos na sentença e no acórdão recorrido, concluo que não apenas foi dada a autorização necessária para a referida gravação, como também a utilização da sua voz não teve intuito comercial, de tal modo que não há qualquer ofensa a direitos da personalidade no caso em comento.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.

É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2014/0308065-9 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.630.851 / SP

Números Origem: 01408523020078260002 5830220071408525

PAUTA: 25/04/2017 JULGADO: 25/04/2017

Relator

Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO

Presidente da Sessão

Exmo. Sr. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO CARLOS ALPINO BIGONHA

Secretária

Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : RITA DE CASSIA CORRÊA

ADVOGADOS : ELIANE YACHOUH ABRÃO E OUTRO(S) - SP028250

PEDRO PEREIRA DE ALVARENGA NETO E OUTRO(S) - SP275935 RECORRIDO : MICROSOFT INFORMÁTICA LTDA

ADVOGADOS : MAURO EDUARDO LIMA DE CASTRO - SP146791

RICARDO CHABU DEL SOLE E OUTRO(S) - SP309132

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Responsabilidade Civil

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Após o voto do Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, negando provimento ao recurso especial, pediu vista, antecipadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Aguardam os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze (Presidente) e Moura Ribeiro.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.630.851 - SP (2014/0308065-9)

RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO

RECORRENTE : RITA DE CASSIA CORRÊA

ADVOGADOS : ELIANE YACHOUH ABRÃO E OUTRO(S) - SP028250

PEDRO PEREIRA DE ALVARENGA NETO E OUTRO(S) - SP275935

RECORRIDO : MICROSOFT INFORMÁTICA LTDA

ADVOGADOS : MAURO EDUARDO LIMA DE CASTRO - SP146791 RICARDO CHABU DEL SOLE E OUTRO(S) - SP309132

VOTO-VISTA

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI:

ACOMPANHO integralmente o voto do Ministro Relator.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2014/0308065-9 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.630.851 / SP

Números Origem: 01408523020078260002 5830220071408525

PAUTA: 25/04/2017 JULGADO: 27/04/2017

Relator

Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO

Presidente da Sessão

Exmo. Sr. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO CARLOS ALPINO BIGONHA

Secretária

Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : RITA DE CASSIA CORRÊA

ADVOGADOS : ELIANE YACHOUH ABRÃO E OUTRO(S) - SP028250

PEDRO PEREIRA DE ALVARENGA NETO E OUTRO(S) - SP275935 RECORRIDO : MICROSOFT INFORMÁTICA LTDA

ADVOGADOS : MAURO EDUARDO LIMA DE CASTRO - SP146791

RICARDO CHABU DEL SOLE E OUTRO(S) - SP309132

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Responsabilidade Civil

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista da Sra. Ministra Nancy Andrighi, acompanhando o voto do Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze (Presidente), Moura Ribeiro e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.