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BR046-j

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Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação Cível 0210996-84.2011.8.26.0100, Relator (a): Costa Netto, julgado em 05 setembro, 2017

br046-jpt

Registro: 2017.0000671361

 

ACÓRDÃO

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0210996-84.2011.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes/apelados ANTÔNIO SILVIO LEFEVRE, FERNANDO LEFEVRE e MARCELO LEFEVRE, é apelado/apelante EDITORA ATHENEU.

 

ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento parcial ao recurso de apelação dos autores, nos termos expostos, negaram provimento ao agravo retido por eles interposto e negaram provimento ao recurso de apelação da ré. Acórdão com o 3º Juiz. Declara voto convergente o Relator Sorteado.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

 

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores COSTA NETTO, vencedor, PIVA RODRIGUES, vencido, COSTA NETTO (Presidente) e ALEXANDRE LAZZARINI.

 

São Paulo, 5 de setembro de 2017

 

JOSÉ CARLOS COSTA NETTO RELATOR DESIGNADO
Assinatura Eletrônica

 

APELAÇÃO nº 0210996-84.2011.8.26.0100

 

APTES/APDOS: ANTÔNIO SILVIO LEFEVRE, FERNANDO LEFEVRE E MARCELO LEFEVRE
APELADO/APELANTE: EDITORA ATHENEU COMARCA: SÃO PAULO
VOTO Nº 4068

 

Juiz : Rodolfo Cesar Milano

 

Direitos Autorais. Ação de obrigação de fazer cumulada com indenização precedida de medida cautelar de busca e apreensão. Violação de direitos morais e patrimoniais de autor. Ação ajuizada por herdeiros, legítimos sucessores dos direitos autorais decorrentes da obra científica denominada "Neurologia Infantil". Obra cuja organização, autoria e coautoria de vários capítulos, foram omitidas pela ré em edições publicadas post mortem do autor. Ausência de autorização dos herdeiros. Prescrição quanto às pretensões indenizatórias declarada de ofício referente à 3ª e, parcialmente, à 4ª edições da obra. Reparação devida quanto à 4ª (50%) e 5ª edições. Quanto à obrigação de fazer: Divulgação, pela ré, da autoria e coautoria da obra em jornal de grande circulação, do nome do autor falecido, nas 3ª, 4ª e 5ª edições. Quanto à obrigação de não fazer: Abstenção, pela ré, de editar, comercializar, divulgar e/ou utilizar, a qualquer título a obra (3ª, 4ª e 5ª edições). Indenização devida.

 

Critérios de reparação decorrentes da violação dos direitos patrimoniais e morais de autor:

 

Direitos patrimoniais: para resultar na penalização do infrator, fixação em 10 vezes o valor pecuniário que o autor lesado receberia na hipótese de que tivesse sido lícita a comercialização. No caso, considerando-se que o uso lícito importava em 3%, essa majoração punitiva vai resultar no total indenizatório de 30% sobre preço dos exemplares vendidos indevidamente. Liquidação de sentença. Apuração do número de exemplares da obra "sub judice" (4ª e 5ª edições) comercializados pela ré, a 4ª a partir de 15.09.2008 e a 5ª integralmente, com base nos preços "de capa" (ao consumidor finan( �/span> atualizados, primeiramente, para a data do laudo pericial de liquidação de sentença e, posteriormente, até a data do efetivo pagamento, nos termos legais. Aplicação do parágrafo único do art. 103 da Lei 9.610/98. O número de 3.000 (três mil) exemplares será devido apenas na hipótese de não ser conhecida a quantidade de exemplares, que tenham constituído a 5ª edição da obra "sub judice", e o número de 1.500 (mil e quinhentos) exemplares para a 4ª edição, correspondente a 50% do estipulado no referido dispositivo legal, tendo em vista que, aproximadamente, metade do período de comercialização (2005/2008) não é passível de reivindicação nestes autos em face da ocorrência da prescrição.

 

Critérios de indenização por violação de direitos morais de autor:

 

O montante deverá corresponder ao mesmo valor apurado a título de danos patrimoniais, que será, portanto, acrescido a este, constatado em sede de liquidação de sentença.

 

Honorários advocatícios. Majoração de 10% para 15% sobre o valor indenizatório integral a ser apurado.

 

Recurso de apelação dos autores parcialmente provido, desprovidos o agravo retido por eles interposto e o recurso de apelação da ré.

 

Segundo consta dos autos:

 

"Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de indenização por danos morais e materiais, precedida por ação cautelar de busca e apreensão, promovida pelos sucessores de Antônio Frederico Branco Lefèvre em face da Editora Atheneu.

 

Sentença proferida às fls. 1.687/1.691, em 30 de abril de 2015, cujo relatório adoto, julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, condenando a ré a (i) compensar os autores pelos direitos morais violados, em dobro, no equivalente a 8,25% de cada exemplar vendido da 3ª edição da obra "Neurologia Infantil"; 8,74% de cada exemplar vendido da 4ª edição; e 7,08% de cada exemplar vendido da 5ª edição; (ii) abster-se da "utilização" destas três edições da obra até promover a publicação do teor da sentença em jornais de grande circulação, bem como inserir errata nos exemplares ainda não distribuídos, sob pena de multa diária; e, por fim, (iii) arcar com os honorários advocatícios da parte vencedora, arbitrados em 10% sobre o total da indenização fixada para cada um dos autores.

 

Parcialmente acolhidos os embargos de declaração opostos pela parte autora (fls. 1.700/1.706), para detalhar o método de aferição do quantum indenizatório (fls. 1.716/1.718), os autores apelam (fls. 1.728/1.742 e fls. 1.753/1.769).

 

Preliminarmente, reiteram as razões do agravo retido acostado às fls. 1.342/1.350, para majorar os honorários advocatícios fixados na extinção de reconvenção (fls. 1.339/1.340).

 

Em razões de apelação, sustentam que a r. sentença teria sido omissa com relação ao pedido para ressarcimento dos danos materiais havidos. Argumentam, ademais, que o magistrado singular teria se equivocado acerca do critério de cálculo do dano moral, que tomou por base os prejuízos materiais ou invés do efetivo abalo moral causado. Por fim, sustenta que a ré deveria ter sido compelida a cessar, por qualquer meio, a distribuição da obra, pois a inclusão de simples errata não bastaria para afastar o ilícito.

 

Rejeitados os embargos de declaração opostos pela parte ré (1.708/1.710), também sobreveio recurso de apelação (1.771/1.802).

 

Pugna, em síntese, pela nulidade da r. sentença, vez que a obra "Neurologia Infantil" deve ser entendida como um compêndio de artigos científicos elaborados por diferentes autores, não havendo exata originalidade para cada um deles. Ademais, sugere que as teorias expostas nos capítulos originalmente creditados a Antônio Lefèvre não são de sua autoria, pois conhecimentos comuns da área médica e, portanto, isento de originalidade. Subsidiariamente sustenta, que a quantificação do dano moral é equivocada, pois não pode tomar por critério o prejuízo técnico ou o lucro auferido com as vendas da obra contrafeita. Afirma exagerada, ademais, a condenação em dobro pelos danos morais incorridos, além de reputar desproporcional a determinação para promover a publicação da r. sentença em jornais de grande circulação. Por fim, alega excessivos os honorários sucumbenciais arbitrados no importe de 10% do valor da condenação para cada um dos autores, vez que todos são representados pelo mesmo patrono e sob a mesma linha de defesa.

 

Recursos recebidos em seus regulares efeitos (fl. 1.806) e respondidos em contrarrazões (fls. 1.818/1.830 e 1.832/1.846)."

 

É o relatório.

 

Do agravo retido (fls.1.342/1.350)

 

Na parte em que expressamente reiteram o agravo retido (fls.1.741), pretendem os autores, em síntese, majorar os honorários advocatícios fixados na extinção da reconvenção (fls.1.339/1.340).

 

Entretanto, não comporta acolhida o pleito.

 

Isso porque, a reconvenção foi extinta por ter, o MM. Juiz a quo, reconhecida a inépcia da petição inicial por falta de interesse de agir do reconvinte, (fls. 1.284/1.290).

 

Assim, com fundamento no §4º, do art. 20, do CPC/73, fixou honorários advocatícios, levando em consideração os critérios estabelecidos no referido artigo. Assim, constou da decisão:

 

"Em virtude da extinção da reconvenção, o réu- reconvinte arcará com o pagamento das despesas processuais pertinentes e com os honorários advocatícios que arbitro consoante apreciação equitativa (CPC, artigos 20§4º, e 34) em R$1.000,00".

 

Nesse quadro, diante da menor complexidade da questão, objeto do agravo retido, não há como acolher o pleito dos agravantes, razão pelo qual, devem ser mantidos os honorários tal como fixados.

 

Passa-se a análise dos recursos de apelação.

 

Prospera em parte, o recurso dos autores.

 

Isso porque, merece reparo a sentença, quanto à caracterização: (1) da violação aos direitos morais do autor Antônio Frederico Branco Lefèvre, transmitidos aos seus sucessores, ora autores; e (2) no tocante à quantificação dos danos morais e patrimoniais.

 

Entretanto, inicialmente, relevante examinar, de ofício1, a prescrição, tema objeto do agravo retido interposto pelos autores, recurso este expressamente reiterado, em parte (vide supra), em sede recursal (fls.1741).

 

Da Prescrição

 

Esse tema foi ventilado em sede de agravo retido interposto pelos autores, reiterado em sede de apelação (fls. 1742).

 

Embora os agravantes, autores, tenham, quando da reiteração do agravo retido, antecipado o entendimento de que essa questão, da prescrição, estaria superada pela sentença, trata-se de tema relevante nesses autos e, por consequência, pode ser examinado de ofício, conforme prescrito em lei.

 

termos:

 

A respeito, já me pronunciei em doutrina, nos seguintes

 

"Aplicam-se, no atinente às ações relativas a direitos patrimoniais de autor, os prazos de prescrição estabelecidos nos artigos 205 e 206 do Código Civil de 2002. Principalmente a regra geral do art. 205: "A prescrição ocorre em 10 (dez) anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor" ou se for o caso, as regras especiais do art. 206 de: (a) 03 (três) anos, quando se tratar de "pretensão de reparação cível" (§ 3o, V) ou (b) de 05 (cinco) anos nos casos de pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular" (§ 5o, I)."2

 

Na hipótese dos autos, trata-se de cinco edições consecutivas: a 1ª publicada em 1980; a 2ª em 1989 (estas não são objeto da presente demanda), a 3ª em 1996, a 4ª em 2005 e a 5ª em 2010. Consequentemente, lógico se deduzir que a cada nova edição da obra (atualizada, modificada e refundida) a edição anterior deixe de ser impressa e comercializada pela editora-ré, ainda mais em se tratando de obra científica que restará, em alguns aspectos, em razão da natural evolução do conhecimento humano com o passar do tempo, tecnicamente superada, ao menos em parte, pela nova edição3. Nesse raciocínio, os períodos de utilização indevida da obra "sub judice" deverão ser o seguinte:

 

3ª edição de 1996 a 2005

 

4ª edição de 2005 a 2010

 

5ª edição de 2010 em diante

 

A partir dessas noções preliminares, vejamos o caso concreto:

 

A- Quanto às obrigações de fazer e não fazer: não ocorrência da prescrição.

 

Entendo que a prescrição não atinge o comando condenatório de (i) abstenção de publicação/comercialização da obra "sub judice" e (ii) publicação, em jornal de grande circulação, da autoria (e coautoria) de Antonio Lefevre de sua obra reproduzida e comercializada sem essa indicação nas 3ª, 4ª e 5ª edições.

 

Com efeito, trata-se de matéria abrigada pelo art. 177 do Código Civil de 1916 (vigente até 10.01.2003) prescrição vintenária e art. 205 do Código Civil vigente prescrição decenária em relação à 3ª edição da obra " sub judice" publicada em 1996 e comercializada, potencialmente pela editora-ré, até 2005, ano de lançamento da 4ª edição. Uma vez que a interrupção da prescrição se dá em 14.09.2011, com a distribuição4 da ação cautelar (fls.7)5 não atinge, portanto a referida 3ª edição e - muito menos a 4ª e 5ª edições, aquela publicada em 2005 e comercializada, pela ré, até 2010 e esta publicada em 2010.

 

B Quanto à obrigação de indenizar: ocorrência (parcial) de prescrição:

 

(a) 3ª edição - lançamento em 1996, presumindo-se que sua comercialização se deu até 2005:

 

Tendo em vista que, na data do lançamento da 3ª edição (1996), vigorava a Lei 5.988/73, adequado utilizar-se, no tocante à violação de direitos patrimoniais de autor, a regra prescricional do art. 131: "prescreve em cinco anos a ação civil por ofensa a direitos patrimoniais do autor ou conexos, contado o prazo da data em que se deu a violação".

 

Prescrição ocorrida, consequentemente, por larga margem.

 

No respeitante à reparação de danos pela violação de direitos morais de autor, como não havia regra específica em relação à prescrição tanto nas leis especiais (Lei 5.988/73 e 9.610/98) quanto na regra geral (Código Civil de 1916, vigente até 10.01.2003) seria válido o comando do art. 177 do Código Civil vigente à época da prescrição vintenária (ações pessoais). Se já tivesse decorrido entre 1996 e jan/2003 mais da metade desse período (10 anos mais 1 dia)6, o que não ocorreu na hipótese dos autos (entre 1996 e 2003 o período se limita a 7 anos).

 

Destarte, tratando-se de reparação civil de dano, aplicável a regra específica da prescrição trienal estipulada no §3º, inciso V, do art. 206 do Código Civil vigente7, consequentemente, em relação à referida 3ª edição, mesmo computando-se todo o período de sua comercialização (1996/2005) vencendo-se o lapso prescricional, assim, em 2008 e a ação cautelar sendo distribuída apenas em 2011 - encontra- se também prescrita a prescrição indenizatória de natureza moral.

 

(b) 4ª e 5ª edições - a 4ª edição com lançamento em 2005 (com comercialização presumida até 2010) e 5ª edição com lançamento em 2010: não ocorrência da prescrição em ambos os casos.

 

Nestes dois casos não há ocorrência de prescrição, tanto em relação à natureza moral quanto patrimonial, computando-se, para efeito da 4ª edição, apenas os valores correspondentes à comercialização realizada pela ré a partir de 15.09.2008 (3 anos antes da data da distribuição da medida cautelar, em 14.09.2011 fls.02).

 

Pela análise dos autos, ficou constatada a violação não apenas dos direitos patrimoniais de autor, mas também dos direitos morais decorrentes da (a) modificação da obra e (b) da omissão do nome do autor Antônio Frederico Branco Lefèvre na 3ª; 4ª e 5ª edições.

 

Os direitos morais de autor, a exemplo dos demais direitos de personalidade, são considerados indisponíveis, intransmissíveis e irrenunciáveis, devido ao seu caráter de "essencialidade", cuja importância já foi proclamada por Adriano De Cupis : "De fato, qualquer valor concreto seria subtraído à personalidade jurídica, se fosse consentido à pessoa pôr fim a tais direitos por acto de vontade. Na verdade, a personalidade jurídica não pode ser esvaziada, por acto de renúncia, da parte mais importante do próprio conteúdo, pois que a norma jurídica, ao atribuir os direitos da personalidade, tem caráter de norma de ordem pública, irrevogável"8.

 

Não se pode ignorar também que, em se tratando de morto, a proteção dos direitos da personalidade encontra guarida no art. 12 e parágrafo único do Código Civil:

 

Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.
Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau

 

Ao comentar o parágrafo único do referido artigo, relevantes são as observações da jurista Silmara Chinellato:

 

"O parágrafo único traz inovação digna de aplausos, reconhecendo legitimação a terceiros para a defesa dos direitos da personalidade do morto. O brocardo jurídico mors omnia solvit não se aplica aos direitos da personalidade que se estendem desde a concepção para além da vida da pessoa natural. 9

 

Em relação às normas de sucessão dos direitos morais de autor, estabelece a lei brasileira, a transmissão, aos herdeiros do autor, dos direitos especificados nos incisos I a IV do artigo 24 da lei 9.610/98:

 

"Art. 24. São direitos morais do autor:

 

I - o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;
II - o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra;
III - o de conservar a obra inédita;
IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;

 

(...)

 

§ 1º Por morte do autor, transmitem-se a seus sucessores os direitos a que se referem os incisos I a IV."

 

Ressalte-se que o Superior Tribunal de Justiça já pacificou tal entendimento, a saber:

 

"Os direitos morais do autor são irrenunciáveis e inalienáveis (artigo 27), transmitindo-se aos herdeiros apenas os direitos de genitura (maternidade/paternidade), ineditismo e integridade (§ 1º do artigo 24)"
(REsp nº 1.438.343 - MS (2013/0095665-3), Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, j.1º.12.2016)

 

Quanto aos direitos patrimoniais de autor, estes baseiam- se nos atributos exclusivos inerentes ao criador intelectual, em utilizar, fruir e dispor de sua obra, bem como o de autorizar sua utilização ou fruição por terceiros, conforme prevê o texto legal:

 

Art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica.

 

Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como:

 

I - a reprodução parcial ou integral;

 

(...)

 

Art. 33. Ninguém pode reproduzir obra que não pertença ao domínio público, a pretexto de anotá-la, comentá-la ou melhorá-la, sem permissão do autor.

 

Assim, temos, em primeiro plano, os dois elementos essenciais: (a) a obrigatoriedade de autorização ou licença (concessão) ou cessão de direitos; (b) a delimitação das condições de uso nos dois casos: de concessão ou cessão da obra pelo licenciado ou cessionário dos direitos autorais correspondentes.

 

Em razão das normas legais já transcritas e, em relação aos direitos patrimoniais de autor, do disposto no art. 4110 da Lei 9.610/98, todos esses direitos (morais e patrimoniais de autor) sobre a obra de Antonio Frederico Branco Lefèvre foram transmitidos aos autores da ação, assumindo estes, portanto, sua titularidade, na qualidade de sucessores do autor falecido.

 

No caso vertente, foram publicadas 5 edições da obra em questão. A 1ª edição, de 1980, lançada pela editora Sarvier, contava com diversos autores dentre os principais o Professor Lefèvre que também organizou a obra.

 

Após o seu falecimento, a 2ª edição da obra foi legitimamente realizada por meio de contrato de edição celebrado entre os herdeiros e sucessores do Professor Lefèvre (licenciantes) e a ré editora Atheneu (licenciada, fls.344/349).

 

Segundo consta do contrato, os sucessores do Prof. Lefèvre autorizaram uma única edição da obra11, publicada em 1989, com tiragem de 3.000 exemplares, com reimpressão de mais 1.000 exemplares, da mesma edição, devidamente autorizada pelos autores (fls.350).

 

O objeto do contrato consistia no licenciamento de utilização dos textos publicados sob a forma de capítulos no livro Neurologia Infantil anteriormente editado pela Sarvier Editora, tendo por organizadores os professores Antonio Frederico Branco Lefèvre e Aron Diament, cujos textos foram discriminados no referido contrato (fls. 345 e 346).

 

Ressalve-se que, no concernente ao crédito de coautoria da organização, que na obra originária encontra-se em destaque na capa (lombada), e página de abertura, constou expressamente do contrato de edição firmado, entre os demandantes (herdeiros do autor falecido) e a demandada (editora) fls.344/350 o seguinte:

 

"Cláusula sexta - caso o coordenador da presente edição, o professor ARON DIAMENT julgue pertinente, LICENCIANTES autorizam a EDITORA, a utilizar-se do nome do professor ANTONIO FREDERICO BRANCO LEFÉVRE, bem como de sua efígie na composição do título e da capa, da edição ora referida; bem como em matéria de propaganda ligada a edição; o que se verificará por todo o tempo de vigência deste contrato. "(sic)

 

Consequentemente, como a consignação "na composição do título e na capa da edição referida" do nome do autor falecido, Antonio Frederico Branco Lefèvre, foi deixada pelos demandantes (e herdeiros) ao livre arbítrio do coautor Aron Diament, coube a este, legitimamente, decidir pela utilização, como o fez, (do nome e efígie) do autor falecido na capa da 2ª edição da obra em comento (devidamente licenciada) e, ao contrário, não fazê-lo em relação às capas das 3ª, 4ª e 5ª edições. Nada a se objetar neste aspecto, portanto.

 

O mesmo não ocorre, entretanto, no respeitante aos créditos de autoria - e de coautoria- dos artigos (ou capítulos) integrantes da obra em questão. Com efeito, a cláusula quinta do referido contrato é inequívoca ao dispor que o nome do professor Antonio Frederico Branco Lefèvre estaria subscrito como autor dos títulos mencionados na Cláusula terceira e abaixo do título de cada correlato capítulo (fls.346).

 

Entretanto, conforme comprovado nos autos, tais capítulos inseridos com modificações - nas edições 3ª, 4ª e 5ª, do livro "Neurologia Infantil", foram reproduzidas sem autorização dos titulares dos direitos autorais e sem o devido crédito de autoria e coautoria a Antonio Frederico B. Lefèvre.

 

Por se tratar de livro com a participação de vários autores, necessário se faz lembrar que a obra intelectual pode ser12, quanto ao número de autores: individual (um só autor); em regime de coautoria ou em colaboração (dois ou mais autores);13 coletiva (vários autores, organizados por pessoa física ou jurídica, com participações criativas indefinidas e fundidas em uma criação autônoma)14.

 

Nesse contexto, não há dúvidas de que a hipótese sub judice trata de obra em coautoria, mesmo que haja um ou mais organizadores.

 

E, ainda que convivam em um mesmo suporte físico (meio de comunicação) não se confundem com obras coletivas de titularidade de seu organizador com as obras individuais ou em coautoria de titularidade exclusiva de seu (s) respectivo (s) autor (s): obedecem a regimes jurídicos diferentes, ou seja, os autores das obras individualizáveis justapostas com outras obras congêneres veiculadas em conjunto - não perdem a plenitude do exercício de seus direitos de autor de natureza moral e patrimonial.

 

Na hipótese, as violações cometidas pela ré foram atestadas no laudo pericial, a saber:

 

"Antonio Lefèvre, pai dos Requerentes, escreveu quatro capítulos/artigos 6,7,65, 66 da 2ª edição de modo autônomo (isolado) e oito capítulos (2, 3, 43, 55, 56, 63, 65, 66) em coautoria indivisível, para a 2ª edição da obra "Neurologia infantil", editada, publicada e comercializada pela Requerida:
Todos os doze capítulos, foram reescritos nas edições posteriores da obra, como revelam seus organizadores Aron Diamente e Saul Cypel;

 

Em nenhum dos doze capítulos reescritos há referência ao nome de Antonio Lefèvre, contrariando o inciso I, do art. 24 da LDA;
Os capítulos de autoria isolada de Antonio Lefèvre não poderiam ter sido reescritos - a despeito das boas intenções dos organizadores sem o consentimento dos herdeiros (art. 24, IV da LDA)". (fls.1560/1561)

 

Como mencionado, mesmo a proteção legal do organizador da obra, em regime de coautoria, não mitiga a obrigatoriedade de proteção de que as criações individuais que integram um seu conjunto, veiculados em um livro, como é o caso dos autos, identifiquem, em destaque, os seus respectivos autores e coautores. Este tema foi tratado com maestria pelo jusautoralista Carlos Fernando Mathias de Sousa, destacando a dificuldade de seu escorreito enquadramento no ordenamento jurídico.15

 

Consequentemente, resta inequívoca a violação praticada pela ré dos direitos morais de autor de Antonio Frederico Branco Lefèvre, reivindicados legitimamente, nestes autos, pelos seus herdeiros.

 

Em relação aos direitos patrimoniais de autor, o art. 23 da Lei 9.610/98 dispõe que "os co-autores da obra intelectual exercerão, de comum acordo, os seus direitos, salvo convenção em contrário" e , o art. 52 do mesmo diploma legal adverte que "a omissão do nome do autor, ou de co-autor, na divulgação da obra não presume o anonimato ou a cessão de seus direitos".

 

Nesse prisma, segundo, ainda, o laudo pericial:

 

"Não há menção a crédito de autoria ou coautoria ao Professor Lefèvre, ainda que apenas pela organização da obra ou pela utilização dos capítulos de sua autoria isolada capítulos 6, 7 ,65 e 66. Restou também incontroverso que Antonio Lefèvre organizou e coordenou a obra originária , posteriormente objeto de cinco outras edições, bem como incontroversa restou a sua participação coautoria nos Capítulos 2, 3, 43, 55, 56, 63, 65, 66..." (fls.1535)

 

Essas regras aplicam-se também aos casos em que a obra intelectual criada em regime de coautoria, seja indivisível, como ocorre em alguns dos capítulos objeto da presente demanda, Nesse sentido, esclarece a Lei 9.610/98 que:

 

Art. 32. Quando uma obra feita em regime de co- autoria não for divisível, nenhum dos co-autores, sob pena de responder por perdas e danos, poderá, sem consentimento dos demais, publicá-la ou autorizar-lhe a publicação, salvo na coleção de suas obras completas.
§ 1º Havendo divergência, os co-autores decidirão por maioria.
§ 2º Ao co-autor dissidente é assegurado o direito de não contribuir para as despesas de publicação, renunciando a sua parte nos lucros, e o de vedar que se inscreva seu nome na obra.16

 

Acresça-se também que toda e qualquer "melhoria" na obra deve ser antecedida de autorização dos titulares dos direitos autorais, o que não ocorreu na hipótese.

 

Além disso, a editora-ré não observou as prescrições legais atinentes à edição da obra, expressamente indicadas na Lei 9.610/98, violando os seguintes preceitos legais:

 

Art. 55. Em caso de falecimento ou de impedimento do autor para concluir a obra, o editor poderá:

 

(...)

 

III - mandar que outro a termine, desde que consintam os sucessores e seja o fato indicado na edição.

 

Art. 67. Se, em virtude de sua natureza, for imprescindível a atualização da obra em novas edições, o editor, negando-se o autor a fazê-la, dela poderá encarregar outrem, mencionando o fato na edição.

 

Com efeito, na hipótese dos autos, a editora-ré não comprovou que tenha consultado os sucessores do autor falecido; ainda que se tratasse de mera "atualização da obra", como alega a editora, não poderia a ré deixar de: (a) destacar os trechos em que teriam sido inseridas as respectivas atualizações, bem como (b) indicar a autoria (e coautoria)das obras (neste caso "capítulos") objeto da atualização.

 

Quanto à obrigação de fazer:

 

Nesse aspecto, como bem decidiu a sentença, necessária a aplicação ao caso concreto das "medidas previstas no art. 108, II, da Lei 9.610/98"17 e, consequentemente, "necessária divulgação da autoria da obra em jornal de grande circulação", tanto em regime de autoria exclusiva quanto no de coautoria que, entendo obrigatória em face da omissão de indicação pela ré nas edições "sub judice" (3ª; 4ª e 5ª) do nome do autor falecido, na publicação "post mortem" de sua obra.

 

Quanto à obrigação de não fazer:

 

Da mesma forma, ainda no prisma cominatório da condenação, em razão de todos os ilícitos praticados pela ré, conforme já exposto e fundamentado, correta, também, a sentença no sentido de que a ré deverá "se abster de editar, comercializar, divulgar e/ou utilizar, a qualquer título a obra".

 

Quanto à obrigação de indenizar:

 

A- Danos Patrimoniais;

 

Com a efetiva caracterização da violação, pela ré, dos direitos patrimoniais de autor e, considerando-se o disposto no art. 103 da Lei 9.610/98, a saber:

 

"Art. 103. Quem editar obra literária, artística ou científica, sem autorização do titular, perderá para este os exemplares que se apreenderem e pagar-lhe-á o preço dos que tiver vendido.

 

Parágrafo único. Não se conhecendo o número de exemplares que constituem a edição fraudulenta, pagará o transgressor o valor de três mil exemplares, além dos apreendidos."

 

Tem-se:

 

(a) Primeiro: que o percentual indenizatório sobre a comercialização indevida deve ser de 30% sobre o preço (de mercado) dos exemplares vendidos, e

 

(b) Segundo: que seja apurado, por perícia (em fase de liquidação de sentença), quantos exemplares da obra "sub judice" (4ª e 5ª edições) foram comercializadas pela ré e, apenas e tão somente na hipótese de impossibilidade dessa apuração, que seja aplicável - sem mitigação a sanção estabelecida no parágrafo único do art. 103 da Lei 9.610/98.

 

Justifica-se:

 

O direito de autor, mesmo no âmbito das sanções de interesse civil, dispõe em sua regulação regente (Lei 9.610/98) além de várias indicações de sanções indenizatórias (arts. 102, 104, 105, 107, 108 e 110), também normas de caráter punitivo pecuniário18:

 

(a) a reversão, para o autor, do produto da violação ao seu direito (a perda pelo infrator em benefício do autor dos exemplares ilícitos apreendidos, além do pagamento ao autor do preço dos exemplares vendidos), sendo que, não se conhecendo esse número, "pagará o transgressor o valor de três mil exemplares, além dos apreendidos" (art. 103 e seu parágrafo único);

 

(b) multa diária e "demais indenizações cabíveis", independentemente das sanções penais aplicáveis, além do aumento, em caso de coincidência, até o dobro do valor da multa (para as hipóteses de transmissão e retransmissão e comunicação ao público de obras artísticas literárias e científicas de interpretação e de fonogramas realizados com violação de direito autoral) (art.105); e

 

(c) multa equivalente a vinte vezes o valor que deveria ser originariamente pago pela execução pública de obras musicais, interpretações, fonogramas e obras audiovisuais, se realizada sem autorização dos titulares (art. 109).

 

A diretriz punitiva ao ofensor de reversão para o autor do produto da íntegra da edição ilícita - desse dispositivo legal (art. 103 da Lei 9.610/98) decorre do fato de o direito de autor corresponder, usualmente, a 10% (ou seja, um décimo) do produto da comercialização dos exemplares e não a sua totalidade.

 

Essa penalização, ou seja, não 1/10 (que corresponderiam aos direitos autorais arbitráveis), mas sim 100% da edição ilícita, representa, assim, a multiplicação por dez do valor que o autor normalmente faria jus como resultado da comercialização regular da sua obra.

 

A coexistência harmoniosa desses dispositivos reparatórios de ordem geral e especial se estende no tempo: a lei autoral de 1973 que regulou inteiramente a matéria, e a de 1998, que a substituiu, já se compatibilizavam com o Código Civil de 1916 dispositivo originário, artigo 1.059 e, agora, naturalmente, a compatibilização permanece em relação ao dispositivo reeditado, art. 402 do Código Civil de 2002. Com efeito, consta do próprio dispositivo do Código Civil tanto o anterior (1.059) quanto o vigente (402) a ressalva da predominância da legislação especial ("salvo as exceções expressamente previstas em lei"), o que é, exatamente, o caso.

 

Nessa linha o Superior Tribunal de Justiça em aresto de 2007: "A ação de perdas e danos decorrentes do ato ilícito praticado por quem viola direitos do autor de programa de computador tem fundamento na regra geral do Código Civil (Art. 159 do CCB/1916)".

 

Os critérios para a quantificação dos danos materiais, entretanto, estão previstos na Lei nº 9.610/98. (...) Destaco, por oportuno, voto da eminente Ministra Nancy Andrighi:

 

"(...) Incluído, pois, o programa de computador no conceito de obra intelectual (Lei nº 9.610/98, art. 7º, inc. XII), deve-se considerar, para fins de quantificação dos danos materiais produzidos com a sua contrafação, a lei especial aplicável à espécie (Lei 9.610/98, art. 103) e não a regra geral prevista no art. 159 do CC. Isto porque o art. 103 prevê os critérios de sancionamento civil para a contrafação de obra literária, artística ou científica, e o programa de computador, por força do art. 2º da Lei nº 9.609/98, está sujeito ao regime jurídico adotado para a obra literária." (trecho do desfecho decisório-p. 3- do acórdão de 25.09.2007 proferido no Recurso Especial nº 768.783/RS, por votação unânime de sua Terceira Turma, relator o Ministro Humberto Gomes de Barros DJ 22.10.2007, p. 247).

 

Posteriormente, em 2010, em questão relativa relação a "software", o Superior Tribunal de Justiça confirmou esse entendimento: "A fixação do valor da indenização pela prática da contrafação deve servir, entre outras coisas, para desestimular a prática ofensiva, sem, no entanto, implicar, enriquecimento sem causa do titular dos direitos autorais violados." (trecho final da ementa de acórdão e 17.06.2010, proferido pela 3ª Turma do STJ, por votação unânime, relatora Ministra Nancy Andrighi, no REsp 1.136.676-RS). A condenação indenizatória importou, portanto, em 10 vezes o valor de mercado de cada cópia de "softwares" (programas de computador) reproduzida com infração de direito autoral.

 

E esse entendimento tem sido reafirmado em jurisprudência. Como exemplo recente, o acordão deste Tribunal, da Terceira Câmara de Direito Privado, proferido por votação unânime em 16.08.2017, de relatoria do Desembargador Viviani Nicolau (apelação nº 1074333-09.2014.8.16.0100), cuja ementa consignou:

 

"APELAÇÃO. Direitos autorais. Ação indenizatória pelo uso indevido, por parte da ré, de 25 programas de titularidade da autora. Sentença de procedência, com condenação da requerida ao pagamento do valor de R$ 11.211,90 à autora. Apelo da autora. Pedido de majoração da indenização, devendo-se considerar o seu caráter punitivo. Consistência. Precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça e desta 3ª Câmara de Direito Privado neste sentido. Majoração da indenização para o total de 10 (dez) vezes o valor de cada programa utilizado indevidamente pela requerida. RECURSO PROVIDO" (destacado).

 

Evidencia-se, assim, que a indenização no plano da violação dos direitos patrimoniais de autor deverá, para resultar na penalização do infrator, ser fixada em razão de 10 vezes o valor pecuniário que o autor lesado receberia na hipótese de que tivesse sido lícita a comercialização, entendo que, na hipótese dos autos:

 

(a) Tendo em vista que a edição devidamente autorizada pelos herdeiros (2ª) foi objeto de contrato de edição que estabelecia a remuneração, a título de direito autoral no importe: "correspondente a 3% (três por cento) do preço à vista de cada exemplar" (conforme cláusula oitava do referido contrato, fls.50 dos autos da medida cautelar), o quantum indenizatório deverá importar em 10 vezes essa remuneração, ou seja, 30% sobre as mesmas bases contratuais (preço à vista de cada exemplar), e

 

(b) Caso não seja possível apurar, em procedimento pericial a ser realizado em fase de liquidação de sentença, o número de exemplares efetivamente comercializados pela ré em função das duas edições indevidas da obra "sub judice", por força do parágrafo único do art. 103 da Lei 9.610/98, o número de 3.000 (três mil) exemplares que tenham constituído a 5ª edição da obra "sub judice" e

 

(c) o número de 1.500 (mil e quinhentos) exemplares para a 4ª edição, correspondente a 50% do estipulado no parágrafo único do art. 103 da Lei 9.610/98, tendo em vista que, aproximadamente, metade do período de comercialização (2005/2008) não é passível de reivindicação nestes autos em face da ocorrência da prescrição.

 

Quanto à reparação pela violação dos Direitos Morais de autor. Critérios e Quantificação:

 

Na hipótese vertente, cumulam-se os danos patrimoniais e morais, como pacificado na jurisprudência.19

 

Diversamente do dano patrimonial, de origem econômica, o dano autoral de natureza moral é extrapatrimonial. Assim, a consequência indenizatória poderia conter, à primeira vista, tratamento jurídico que levasse a critérios diferenciados, sob o aspecto econômico da reparação devida ao autor lesado.

 

Essa linha de raciocínio acaba resultando, muitas vezes, na adoção - que entendo ser criticável no terreno dos direitos de autor de prefixação tarifária do "quantum" indenizatório que costuma ser aplicado em relação aos danos morais de natureza diversa do autoral.

 

Consequentemente, é fundamental destacar-se quais são os elementos, com repercussão jurídica, que são similares ou diferentes na concepção dos critérios indenizatórios em relação a essas duas vertentes de danos autorais. Nesse passo,

 

(a) a diferenciação:

 

(a).1.- os direitos morais de autor, em virtude de sua natureza jurídica de direitos da personalidade, prevalecem em relação aos direitos patrimoniais e, portanto, no plano indenizatório, não devem ser mitigados em relação a estes,

 

(a).2.- a gravidade da violação de direito moral de autor, pela sua natureza (mutilação da obra, apropriação indevida de sua paternidade, etc.), é, normalmente, mais acentuada do que a violação de direitos patrimoniais (que poderá ser uma utilização da obra intelectual íntegra, mas sem a autorização do autor);

 

(b) a similitude:

 

(b).1.- ambos consistem em atos ilícitos que resultam em sanções indenizatórias de natureza pecuniária ou econômica,

 

(b).2.- em ambos, aplicam-se o "duplo caráter indenizatório das violações", ou seja, a reparação correspondente tanto aos danos autorais morais quanto aos patrimoniais, contém, não somente a finalidade ressarcitória/reparatória como também punitiva;

 

(b).3. - em ambos, o critério indenizatório deverá levar em conta a abrangência do dano e o benefício que o ato ilícito gerou ao infrator, especialmente de ordem econômica.

 

Nessa vertente, a reparação de danos autorais, confrontando-a com a teoria tradicional da responsabilidade civil, apesar da convivência de fundamentos comuns, especialmente no plano da eqüidade, para fazer frente aos malefícios da violação aos direitos de autor, além do ressarcimento do ofendido medido pela extensão do dano impõe o efeito pedagógico trazido com a punição do ofensor.

 

Exatamente, a respeito desse tema, tive oportunidade de atuar recentemente como relator em acórdão proferido por votação unânime, em 16.08.2016, pela 9ª Câmara de Direito Privado, do Tribunal e Justiça do Estado de São Paulo (Apelação Cível nº 0187707-59.2010.8.26.0100):

 

"No concernente aos danos morais, a doutrina anota que a reparação dos danos deve pautar-se pela observância das funções da responsabilidade civil, classicamente: reparatórias ou compensatórias (esta quando se tratar em dano moral), sancionatória ou punitiva e dissuasória ou preventiva.
Corrobora esse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça, no REsp nº 1.317.861 PR (2012/0068814-2), em recente acórdão proferido pelo Ministro João Otávio de Noronha, publicado em 11.05.2016. (Terceira Turma, j.11/5/2016)
Na hipótese vertente, a quantificação reparatória frente à violação dos direitos morais praticados, especialmente quando envolve, como neste caso, atividades empresariais e comerciais ilícitas, deve se relacionar estreitamente com a abrangência da operação ilícita que consiste, basicamente, na repercussão econômica da violação para o ofendido, ou seja, o seu prejuízo, tanto na esfera dos danos emergentes quanto na dos lucros cessantes sofridos. Nesse caminho, mais adequado do que se buscar um valor fixo, aleatório, a título de indenização por dano moral, será vincular essa quantificação reparatória ao âmbito de tais prejuízos, estabelecendo-se dentro de critérios compensatórios à vítima e penalizadores ao ofensor, com razoabilidade, um agravante percentual (como o fez escorreitamente a r. sentença recorrida) ou multiplicador, conforme as nuances do caso concreto."

 

Nessa linha de entendimento, de apuração do "quantum" indenizatório, o ato ilícito que gera dano autoral de natureza moral, no plano reparatório, deverá, como exposto, em relação aos critérios aplicáveis ao dano patrimonial, conter similitudes e diferenciações.

 

Quanto às similitudes, o dano autoral exclusivamente moral não deixa de conter: (a) sanção indenizatória de natureza pecuniária ou econômica, (b) duplo caráter indenizatório (finalidade reparatória e punitiva), e (c) o critério indenizatório deverá levar em conta a abrangência do dano e o benefício que o ato ilícito gerou ao infrator.

 

E, por outro lado, no tocante às diferenciações: (a) os direitos morais de autor prevalecem em relação aos direitos patrimoniais e, portanto, no plano indenizatório, não devem ser mitigados em relação a estes, e (b) a gravidade da violação de dano moral de autor, pela sua natureza (mutilação da obra, apropriação da paternidade, etc.), é, normalmente, mais acentuada do que a violação de direitos patrimoniais (que poderá ser uma utilização de obra intelectual íntegra, mas sem a autorização do autor).

 

A criteriosa utilização desses elementos resultará na justa aferição do "quantum" indenizatório correspondente à violação de direitos morais de autor para cada caso concreto. Vejamos, a seguir, um exemplo: uma determinada pessoa adquire, do respectivo autor, regularmente, os direitos de traduzir, publicar e comercializar uma obra literária estrangeira em tiragem de 3.000 exemplares (livros) e respeita, rigorosamente, os direitos patrimoniais de autor, ou seja, a tradução é de alta qualidade, em respeito ao conteúdo originário da obra, são publicados e comercializados exatamente 3.000 exemplares e tempestivamente pagos os 10% contratados (com base no preço "de capa", qual seja, valor ao consumidor) a título de direitos autorais contratados.

 

Contudo, não há o mesmo procedimento em relação ao respeito aos direitos morais de autor, muito pelo contrário: o licenciado se apropria da autoria da obra substituindo, em cada livro de toda a edição, o nome do verdadeiro autor pelo seu.

 

Neste caso, indaga-se: além, naturalmente, da busca e apreensão de toda a edição, bem como, das sanções penais aplicáveis (na órbita criminal), quais seriam os critérios indenizatórios adequados para reparação desses danos, decorrentes da violação dos respectivos direitos morais de autor (art.24, I e II da Lei 9.610/98)?

 

A resposta não poderia ser a mera fixação tarifária de um valor aleatório a título de danos morais, mas sim obedecer aos critérios que deverão ser norteados pelas similitudes - e diferenciações expostas em relação aos danos patrimoniais. Nesse caminho, o valor de toda a edição (art. 103 da Lei 9.610/98) servirá como base para apuração do "quantum" indenizatório (obviamente o número de exemplares tem relação direta com a abrangência da violação do direito moral em questão), acrescido do percentual ou multiplicador - a ser arbitrado em face da gravidade da prática ilícita referida20.

 

Nesse caminho, destaque-se a judiciosidade de recente acórdão do STJ Superior Tribunal de Justiça de relatoria do Ministro Moura Ribeiro que, após consignar a melhor trilha doutrinária e jurisprudencial aplicável na fixação de critérios para a valoração da reparação dos danos decorrentes de violação de direitos morais de autor, conclui com inegável acerto:

 

"Feitas essas considerações, é de se ressaltar que os critérios para o arbitramento dos danos morais serão apreciados nas instâncias inferiores de acordo com a legislação de regência, observados os elementos orientadores para a reparação integral do dano, abrangendo a efetiva penalização dos infratores, com o objetivo de desestimular a prática ilícita, bem como a adequação do montante indenizatório de acordo com o volume econômico da atividade em que a utilização indevida da obra foi inserida"21.

 

Consequentemente, no caso concreto em exame, adequado conferir aos autores/apelantes o equivalente ao mesmo valor a ser apurado a título de indenização pela violação de direitos patrimoniais de autor, para reparação da violação de direitos morais de autor que como visto constitui-se na infração ao art. 24, inciso II e V 23da Lei 9.610/98, ambos passíveis de transmissão aos sucessores dos autores de obras intelectuais. 24

 

Conclusão:

 

Diante do exposto, dou parcial provimento ao recurso dos autores para reformar em parte a sentença nos seguintes pontos:

 

A) Quanto à obrigação de fazer:

 

Deverá a ré divulgar a autoria da obra em jornal de grande circulação, tanto em regime de autoria exclusiva quanto em coautoria, do nome do autor falecido, nas 3ª, 4ª e 5ª edições.

 

B) Quanto à obrigação de não fazer:

 

Deverá a ré se abster de editar, comercializar, divulgar e/ou utilizar, a qualquer título, a obra "sub judice".

 

C) Quanto à reparação por violação dos direitos patrimoniais de autor:

 

Deverá a ré indenizar os autores no percentual de 30% sobre o preço dos exemplares vendidos indevidamente. Para tanto, deverá ser apurado em fase de liquidação de sentença, por perícia, o número de exemplares da obra "sub judice" (4ª e 5ª edições) que foram comercializados pela ré, a 4ª a partir de 15.09.2008 e a 5ª integralmente, com base nos preços "de capa" (ao consumidor final) atualizados primeiramente para a data do laudo pericial de liquidação de sentença e, posteriormente, até a data do efetivo pagamento, nos termos legais.

 

Caso não seja possível apurar, em procedimento pericial a ser realizado em fase de liquidação de sentença, o número de exemplares, efetivamente, comercializados pela ré em função das duas edições indevidas da obra "sub judice", será considerado:

 

(1) por força do parágrafo único do art. 103 da Lei 9.610/98, o número de 3.000 (três mil) exemplares caso não seja conhecida a quantidade de exemplares que tenham constituído a 5ª edição da obra "sub judice", e

 

(2) o número de 1.500 (mil e quinhentos) exemplares para a 4ª edição, correspondente a 50% do estipulado no parágrafo único do art. 103 da Lei 9.610/98, tendo em vista que, aproximadamente, metade do período de comercialização (2005/2008) não é passível de reivindicação nestes autos em face da ocorrência da prescrição.

 

D) Quanto à reparação da violação dos direitos morais de autor:

 

O montante indenizatório, neste item, deverá corresponder ao mesmo valor apurado a título de danos patrimoniais, e será, portanto, acrescido a este, constatado em sede de liquidação de sentença.

 

E) Quanto à correção monetária e juros:

 

Em se tratando de responsabilidade extracontratual, aplique-se a regra constante da Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça: "os juros moratórios fluem a partir do evento danoso em caso de responsabilidade extracontratual", assim como a correção monetária.

 

F) A verba honorária a título de sucumbência sofrida pela ré deverá ser majorada para 15% sobre o valor total da indenização fixada (art.85, §11 do CPC/15).

 

Ante o exposto, dou provimento parcial ao recurso de apelação dos autores, nos termos expostos, nego provimento ao agravo retido por eles interposto e ao recurso de apelação da ré.

 

JOSÉ CARLOS COSTA NETTO
Relator designado

 


1 Conforme o Código Processo Civil, vigente até 2015, período que abrange todos os fatos "sub judice", art. 219, §5º; "O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição" (parágrafo único com redação dada pela Lei 11.280, de 16.02.2006).

2 Direito Autoral no Brasil. 2ª ed. FTD, 2008, p.463, item de rodapé nº 118.

3 Caso se encontrasse ainda alguns exemplares não vendidos da edição anterior no estoque da editora-ré, tal não pode resultar na presunção de que haveria continuidade regular da comercialização da edição anterior, por se tratar, salvo prova em contrário, de "final de estoque" de natureza apenas residual, substituído plenamente pelos exemplares da nova edição.

4 Art.219, §1º do CPC/15: "A interrupção da prescrição retroagirá à data da propositura da ação."

5 "O ajuizamento da ação cautelar vinculada à controvérsia mantida na ação principal, enquanto durar a demanda, importa em interrupção do prazo prescricional, nos termos do art. 219, §1º do CPC (STJ, EDcla no REsp 949.204/RJ, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma, jul.17.03.2009) conforme o Código de Processo Civil anotado, de Humberto Theodoro júnior (Forense, Rio de Janeiro, 19ª ed. 20150 pag.288.

6 Código Civil vigente, art. 2.028: "Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada".

7 Art. 206. Prescreve: (...)§ 3o Em três anos: (...)V - a pretensão de reparação civil;

8 Cupis, Adriano de. Os Direitos da Personalidade, Lisboa, livraria Morais Editora, 1961, p. 53. Relaciona, como direitos de personalidade, além dos direitos morais de autor também o direito à vida e à integridade física, o direito à liberdade, o direito à honra, o direito à identidade pessoal, o direito sobre as partes destacadas do corpo e o direito sobre o cadáver.

9 "Código Civil interpretado: artigo por artigo, parágrafo por parágrafo. Costa Machado organizador; Silmara Juny Chinellato coordenadora. 5ª ed. Barueri SP: Manole,, 2012, p.43.

10 "Os direitos patrimoniais de autor perduram por setenta anos contados de 1º de janeiro do ano subsequente ao de seu falecimento, obedecida a ordem sucessória da lei civil."

11 Mesmo que não constasse expressamente do licenciamento essa condição, a lei de direito autoral (9.610/98) é categórica em seu art.56: "Entende-se que o contrato versa apenas sobre uma edição, se não houver cláusula expressa em contrário."

12 Direito Autoral no Brasil.2ª. ed. FTD - São Paulo -2008, p.93.

13 Conforme o art. 5o, VIII, a da lei 9.610/98, consiste obra "em-coautoria" a "criada em comum, por dois ou mais autores". Observe-se que a denominação "obra em colaboração" se confunde com a "obra em coautoria", sendo que a da lei autoral de 1973 utilizava, em seu art. 4o, VI, "a", praticamente a mesma definição que a lei vigente confere à "obra em coautoria": estabelecia o diploma anterior que obra em colaboração é a "produzida em comum, por dois ou mais autores". A respeito, anote-se o acerto da mudança terminológica tendo em vista que o termo "colaboração" não é tão preciso como "coautoria" , tendo em vista que aquela terá que se adequar à condição de coautoria de obra intelectual. Com efeito, não é qualquer "colaboração" que vai consistir em "coautoria", como dispõe o § 1o do artigo 15 da lei 9.610/98: "Não se considera coautor quem simplesmente auxilia o autor na produção da obra literária, artística ou científica, revendo-a, atualizando-a, bem como fiscalizando ou dirigindo sua edição ou apresentação por qualquer meio".

14 A lei autoral vigente define a obra coletiva como "a criada por iniciativa, organização e responsabilidade de uma pessoa física ou jurídica, que a publica sob seu nome ou marca e que é constituída pela participação de diferentes autores, cujas contribuições se fundem numa criação autônoma" (artigo 4o, VIII, "h" da Lei 9.610/98). Observe-se que essa fusão das colaborações (em uma criação autônoma) é condição essencial para a caracterização da obra coletiva. Nesse sentido pronunciou-se o Tribunal de Justiça de São Paulo: "a obra coletiva com partes perfeitamente identificáveis não vem sendo contemplada pelo legislador pátrio, mas tida pela doutrina, como obra em colaboração conferindo aos coautores direitos distintos amparados pelo direito autoral" (trecho da ementa do acórdão de 23/5/2001 proferido na apelação cível 113.563-4/SP, por unanimidade de votos de sua Sétima Câmara de Direito Privado, relator o Desembargador JÚLIO VIDAN( �/p>

15 Alerta o autor: " Sem embargo da definição de obra coletiva, contida no artigo 5º, VIII, h, da LDA, bem como das outras disposições sobre ela, no mesmo diploma, tem-se que o enquadramento de uma obra, como tal, encontra sérias dificuldades nos ordenamentos jurídicos que adotam o sistema droit d'auteur". In O Direito de autor: breve registro sobre o tema, dos primórdios à era digital (VIII). Artigo publicado no Jornal Correio Braziliense, 07.08.2017 p.7.

16 Observe-se que a eventual renúncia do coautor dissidente depende da manifestação expressa deste nesse sentido. Consequentemente, é evidente que, não havendo tal manifestação, remanesce a obrigatoriedade legal de indicação de seu nome na obra, o que não ocorreu no caso concreto sob exame.

17 Art. 108. Quem, na utilização, por qualquer modalidade, de obra intelectual, deixar de indicar ou de anunciar, como tal, o nome, pseudônimo ou sinal convencional do autor e do intérprete, além de responder por danos morais, está obrigado a divulgar-lhes a identidade da seguinte forma:
(...)
II - tratando-se de publicação gráfica ou fonográfica, mediante inclusão de errata nos exemplares ainda não distribuídos, sem prejuízo de comunicação, com destaque, por três vezes consecutivas em jornal de grande circulação, dos domicílios do autor, do intérprete e do editor ou produtor;

18 Essa matéria já se encontra pacificada na Jurisprudência e, muito cedo, o STJ Superior Tribunal de Justiça - já se pronunciava favoravelmente ao caráter punitivo das indenizações no campo do direito de autor. Veja-se, por exemplo: (a) o acórdão de 28.03.1995, de relatoria do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (Resp 15293-7, Quarta Turma, v.u) e (b) o acórdão de 11.11.1997, de relatoria do Ministro Eduardo Ribeiro (Resp 70883-7, Terceira Turma, v.u).

19 Nesse sentido a Súmula 37 do Superior tribunal de Justiça (STJ): "São cumuláveis as indenizações por dano material e moral oriundos do mesmo fato."

20 Nesse sentido o Tribunal de Justiça de São Paulo em acórdão proferido em 22.06.2004, pela 3ª Câmara de Direito Privado, apelação nº 338.729.4/1-00, por votação unânime, Relator Desembargador Luiz Antonio de Godoy, que confirmou integralmente a sentença que quantificou indenização a título de dano moral (omissão do nome do autor de obra fotográfica em propaganda) em valor correspondente a 10 vezes o "quantum" indenizatório atribuído ao dano material.

21 Acórdão de 16.05.2017, proferido por votação unânime da Terceira Turma do STJ nos Embargos de Declaração no Resp nº 1.558.683/SP, relator Ministro Paulo Dias de Moura Ribeiro (grifado)

23 Art. 24. São direitos morais do autor: (...)
II - o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra; (...)
V - o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada;

24 § 1º Por morte do autor, transmitem-se a seus sucessores os direitos a que se referem os incisos I a IV.