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البرازيل

BR210-j

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STJ. REsp 642.213/RJ, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/04/2010, DJe 02/08/2010

RECURSO ESPECIAL Nº 1.145.637 - RJ (2009/0130146-2)

RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS)

RECORRENTE : NOVARTIS AG

ADVOGADO : JOAQUIM EUGENIO GOMES DA SILVA GOULART PEREIRA E OUTRO(S)

RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL INPI

PROCURADOR : MARIA APARECIDA MONSORES RODRIGUES E OUTRO(S)

EMENTA

PROPRIEDADE INDUSTRIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. PATENTE PIPELINE. PRAZO DE VALIDADE. CONTAGEM. TERMO INICIAL. PRIMEIRO DEPÓSITO NO EXTERIOR. OCORRÊNCIA DE DESISTÊNCIA DO PEDIDO. IRRELEVÂNCIA. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA E SISTEMÁTICA DE NORMAS. TRATADOS INTERNACIONAIS (TRIPS E CUP). PRINCÍPIO DA INDEPENDÊNCIA DAS PATENTES. APLICAÇÃO DA LEI. OBSERVÂNCIA DA FINALIDADE SOCIAL.

1.                           O regime de patente pipeline, ou de importação, ou equivalente é uma criação excepcional, de caráter temporário, que permite a revalidação, em território nacional, observadas certas condições, de patente concedida ou depositada em outro país.

2.                           Para a concessão da patente pipeline, o princípio da novidade é mitigado, bem como não são examinados os requisitos usuais de patenteabilidade. Destarte, é um sistema de exceção, não previsto em tratados internacionais, que deve ser interpretado restritivamente, seja por contrapor ao sistema comum de patentes, seja por restringir a concorrência e a livre iniciativa.

3.                           Quando se tratar da vigência da patente pipeline, o termo inicial de contagem do prazo remanescente à correspondente estrangeira, a incidir a partir da data do pedido de revalidação no Brasil, é o dia em que foi realizado o depósito no sistema de concessão original, ou seja, o primeiro depósito no exterior, ainda que abandonado, visto que a partir de tal fato já surgiu proteção ao invento (v.g.: prioridade unionista). Interpretação sistemática dos arts. 40 e 230, § 4º, da Lei 9.279/96, 33 do TRIPS e 4º bis da CUP.

4.                           Nem sempre a data da entrada em domínio público da patente pipeline no Brasil vai ser a mesma da correspondente no exterior. Incidência do princípio da independência das patentes, que se aplica, de modo absoluto, tanto do ponto de vista das causas de nulidade e de caducidade patentárias como do ponto de vista da duração normal.

5.                           Consoante o art. 5º, XXIX, da CF, os direitos de propriedade industrial devem ter como norte, além do desenvolvimento tecnológico e econômico do país, o interesse social. Outrossim, na aplicação da lei, o juiz deverá atender aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum (art. 5º da LICC).

6.                           Recurso especial a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Paulo Furtado (Desembargador convocado do TJ/BA), Nancy Andrighi, Massami Uyeda e Sidnei Beneti votaram com o Sr. Ministro Relator.

Dr(a). MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA, pela parte RECORRENTE: NOVARTIS AG

Dr(a). INDIRA ERNESTO SILVA QUARESMA(Procurador Federal), pela parte RECORRIDA: INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL INPI

Brasília (DF), 15 de dezembro de 2009(Data do Julgamento)

MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS)

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.145.637 - RJ (2009/0130146-2)

RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS)

RECORRENTE : NOVARTIS AG

ADVOGADO : JOAQUIM EUGENIO GOMES DA SILVA GOULART PEREIRA E OUTRO(S)

RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL INPI

PROCURADOR : MARIA APARECIDA MONSORES RODRIGUES E OUTRO(S)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS) (Relator): Trata-se de recurso especial interposto pela NOVARTIS AG, com arrimo no art. 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região.

Noticiam os autos que NOVARTIS AG impetrou mandado de segurança contra ato imputado à Diretora de Patentes do INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL - INPI, objetivando a extensão do prazo de validade da patente PI 1100014-7, até 12 de fevereiro de 2011, ou seja, pelo prazo remanescente da sua correspondente européia.

O juízo de primeiro grau denegou a segurança (fls. 589-593). Inconformada, a impetrante manejou recurso de apelação (fls. 600-607).

A Primeira Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por maioria, negou provimento ao recurso, em aresto que restou assim ementado:

ADMINISTRATIVO – INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL – PATENTES – ARTS. 230 E 40 DA LEI Nº 9.279/96 – PIPELINES – CONTAGEM DE PRAZO.

-        A patente pipeline está sujeita a uma interpretação literal que garante ao produto patenteado um prazo de proteção idêntico ao remanescente no país em que foi depositado em primeiro lugar, estando este prazo limitado ao máximo de 20 (vinte) anos. Artigos 230 e parágrafos e 40, caput, ambos da LPI.

-        In casu o pedido pipeline formulado indicou como data do primeiro depósito 19.02.1990, correspondente ao pedido nº CH 518/90, do que decorre que a fixação da respectiva data de expiração em 19.02.2010, o que se deu em perfeito atendimento do que gravado no § 4º do art. 230 da LPI.

-        Apelação a que se nega provimento. Sentença confirmada (fl. 732).

Daí a interposição do presente recurso especial, invocando violação do art. 230, §4º, da Lei 9.279/1996, bem como dissídio jurisprudencial. Sustenta, em síntese, que: (i) "a lei não dispõe em nenhum momento que o primeiro depósito no exterior será o marco inicial para contagem de prazo estabelecido no artigo 40 da LPI" (fls. 754-755); (ii) "a intenção clara do legislador foi que o prazo da patente pipeline seja sempre o mesmo prazo da sua correspondente no exterior, para que caiam em domínio público no mesmo dia" (fl. 757); (iii) "o prazo de validade da patente de revalidação brasileira é aquele remanescente de proteção no país onde foi depositado o primeiro pedido, contado a partir do depósito no Brasil" (fl. 758); (iv) a solução adotada pelo Tribunal de origem é contrária a precedente do Superior Tribunal de Justiça (REsp 445.712/RJ).

Com as contrarrazões e admitido o recurso na origem, subiram os autos a esta colenda

Corte.

O Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso especial (fls.

939-945).

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.145.637 - RJ (2009/0130146-2)

RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS)

RECORRENTE : NOVARTIS AG

ADVOGADO : JOAQUIM EUGENIO GOMES DA SILVA GOULART PEREIRA E OUTRO(S)

RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL INPI

PROCURADOR : MARIA APARECIDA MONSORES RODRIGUES E OUTRO(S)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS) (Relator): Prequestionado o dispositivo legal apontado pela recorrente como malferido, demonstrado o dissídio jurisprudencial suscitado e preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade recursal, impõe-se o conhecimento do especial.

A controvérsia gira em torno da determinação do prazo de validade da patente PI 1100014-7, relativa à invenção intitulada "Composto de Acila", concedida pelo INPI, sob o regime denominado "pipeline", com base no art. 230 da Lei 9.279/1996, que apresenta a seguinte redação:

Art. 230. Poderá ser depositado pedido de patente relativo às substâncias, matérias ou produtos obtidos por meios ou processos químicos e as substâncias, matérias, misturas ou produtos alimentícios, químico-farmacêuticos e medicamentos de qualquer espécie, bem como os respectivos processos de obtenção ou modificação, por quem tenha proteção garantida em tratado ou convenção em vigor no Brasil, ficando assegurada a data do primeiro depósito no exterior, desde que seu objeto não tenha sido colocado em qualquer mercado, por iniciativa direta do titular ou por terceiro com seu consentimento, nem tenham sido realizados, por terceiros, no País, sérios e efetivos preparativos para a exploração do objeto do pedido ou da patente.

§ 1º O depósito deverá ser feito dentro do prazo de 1 (um) ano contado da publicação desta Lei, e deverá indicar a data do primeiro depósito no exterior.

§ 2º O pedido de patente depositado com base neste artigo será automaticamente publicado, sendo facultado a qualquer interessado manifestar-se, no prazo de 90 (noventa) dias, quanto ao atendimento do disposto no caput deste artigo.

§ 3º Respeitados os arts. 10 e 18 desta Lei, e uma vez atendidas as condições estabelecidas neste artigo e comprovada a concessão da patente no país onde foi depositado o primeiro pedido, será concedida a patente no Brasil, tal como concedida no país de origem.

§ 4º Fica assegurado à patente concedida com base neste artigo o prazo remanescente de proteção no país onde foi depositado o primeiro pedido, contado da data do depósito no Brasil e limitado ao prazo previsto no art. 40, não se aplicando o disposto no seu parágrafo único.

§ 5º O depositante que tiver pedido de patente em andamento, relativo às substâncias, matérias ou produtos obtidos por meios ou processos químicos e as substâncias, matérias, misturas ou produtos alimentícios, químico-farmacêuticos e medicamentos de qualquer espécie, bem como os respectivos processos de obtenção ou modificação, poderá apresentar novo pedido, no prazo e condições estabelecidos neste artigo, juntando prova de desistência do pedido em andamento.

§ 6º Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, ao pedido depositado e à patente concedida com base neste artigo.

O art. 40 da mesma Lei está assim disposto:

Art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 (quinze) anos contados da data de depósito.

Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 (dez) anos para a patente de invenção e a 7 (sete) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior.

Compulsando os autos, extraem-se os seguintes dados:

(a)                                      Em 19.02.1990, foi efetuado o primeiro depósito do pedido de patente no exterior (Suíça - CH 518/90), cujo pedido foi abandonado (fls. 28 e 31);

(b)                                      Em 12.02.1991, foi formulado novo pedido, junto à União Européia, concedido, em 28.02.1996 (Patente Européia nº 0.443.983), com prazo de validade até 12.02.2011 (vinte anos a partir da data de depósito do pedido - art. 63 da Convenção de Patente Européia - EPC) (fls. 539-542);

(c)                                      Em 27.06.1996, foi realizado requerimento de revalidação no Brasil (PI 1100014-7), concedido em 11.08.1998, com prazo de vigência até 19.02.2010 (fls. 28 e 31). Na concessão do pedido de revalidação, o INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL - INPI fixou o prazo de validade da patente em 19.02.2010, considerando o prazo de 20 (vinte) anos, contado da data do primeiro depósito no exterior (19.02.1990) (fls. 28 e 31).

Em primeira instância, o juízo singular corroborou o entendimento adotado pelo INPI, reputando correto o termo inicial eleito para o cômputo do período remanescente de validade da referida patente (19.02.90 - data do primeiro depósito no exterior).

O Tribunal de origem manteve a sentença de primeiro grau, compartilhando do mesmo posicionamento, como se colhe das razões do voto condutor da maioria:

Compulsando os autos verifico que a Impetrante ao formular o pedido pipeline, nos termos do art. 230 da LPI, indicou como sendo a data do primeiro depósito 19 de fevereiro de 1990, correspondente ao pedido nº CH 518/90, conforme faz claro o documento de fl. 301.

Desta forma, compartilho o posicionamento adotado pelo INPI ao esclarecer, em suas razões que:

“A patente apresentada pela impetrante, em obediência ao que provê o § 3o do art. 230 da LPI, foi a patente européia nº EP 0443983 B1, válida também para a Suíça, correspondente ao pedido nº EP 91810098.3, depositado com reivindicação de prioridade do pedido indicado por ela como primeiro depósito no exterior, o citado CH 518/90, e que foi, este último, abandonado.

Considerando que a patente européia concedida é válida também para a Suíça (país designado quando do pedido de indigitada patente européia), admitiu o INPI a concessão de dita patente para fins de cumprimento do prescrito no art. 230, § 3o da LPI.

Permito-me observar, ao ensejo, que se houvesse a primeira obtido patente na Suíça com base naquele primeiro depósito efetuado, o já várias vezes mencionado primeiro depósito feito no exterior, a patente correspondente lá concedida teria como prazo de vigência os mesmos vinte anos previstos na legislação brasileira.

Como o acordo regional da Comunidade Européia permite a concessão de patente regional com base em pedido europeu reivindicando prioridade unionista, e sendo a patente européia válida na Suíça, como visto, a impetrante teve o prazo de vigência da patente, com o conteúdo do pedido original, estendido em um ano.

Na hipótese vertente, nada há que ilida, como é curial, a aplicação da regra prescrita no § 4o do art. 230 da LPI, no que diz respeito ao prazo de duração da patente pipeline concedida nos termos da lei brasileira.

Deveras, no que tange ao prazo de vigência das patentes pipeline, a regra instituída no § 4o do art. 230 da LPI é que será assegurado o prazo remanescente de proteção no país onde foi depositado o primeiro pedido, mas – e isto é de primordial importância para o adequado desate da questão aqui versada – limitado ao prazo previsto no art. 40 da LPI.

(...)

Tal data foi 19.02.90, do que decorre que a fixação da respectiva data de expiração em 19.02.2010 se deu em perfeito atendimento do que gravado no § 4o do art. 230 da LPI.

Observo, ao ensejo, que, não fora assim, a vigência das patentes pipeline ficaria condicionada tão-somente à vigência das patentes concedidas no país de origem, deixando-se, destarte, de atender expressamente ao contido no já várias vezes mencionado art. 230, § 4o da LPI, que, repito ainda uma outra vez, limita o prazo de vigência de tais patentes àquele previsto no caput do art. 40 da LPI.

Sintetizando a questão, a regra, se assim o posso, seria basicamente a seguinte: se o prazo de duração da patente no país de origem for inferior ao da lei brasileira, prevalecerá aquele prazo; se, contudo, for superior ao que dispõe o art. 40 da LPI, haverá este último, obrigatoriamente, de prevalecer – o que reflete, e creio que insofismavelmente, o exato cumprimento da Lei.”

Desta forma, entendo que a regra estabelecida pelo art. 230 da Lei nº 9.279/96 foi aplicada corretamente, não estando a merecer reparos a r. sentença recorrida (fls. 704-705).

A meu sentir, tal posicionamento não merece reforma.

De início, cumpre ressaltar que a patente é uma das espécies do direito de propriedade industrial, podendo ser de invenção ou de modelo de utilidade.

Outrossim, para se obter a patente sobre a invenção, o autor deve comprovar os requisitos da novidade, atividade inventiva e aplicação industrial, além de o invento não figurar entre aqueles insuscetíveis de serem patenteados.

O regime de patente pipeline, ou de importação, ou equivalente é uma criação excepcional, de caráter temporário, que permite a revalidação, em território nacional, observadas certas condições, de patente concedida ou depositada em outro país (Clèmerson Merlin Clève. "A repercussão, no regime da patente pipeline, da declaração de nulidade do privilégio originário". In: Revista da ABPI, n. 66, set./out., 2003, p. 12).

Para a concessão da patente pipeline, o princípio da novidade é mitigado, bem como não são examinados os requisitos usuais de patenteabilidade. Destarte, é um sistema de exceção, não previsto em tratados internacionais, que deve ser interpretado restritivamente, seja por contrapor ao sistema comum de patentes, seja por restringir a concorrência e a livre iniciativa.

Sobre o tema sob exame, conquanto a Terceira Turma desta Corte Superior, em votação majoritária, tenha assentado, quando do julgamento do REsp 445.712/RJ, que a proteção oferecida pelo Direito Pátrio às patentes estrangeiras revalidadas seria pelo prazo remanescente de proteção no país onde foi depositado o primeiro pedido, calculado segundo a lei interna desse estado estrangeiro, limitado ao período máximo de proteção concedido pela legislação nacional (20 anos), a incidir a partir da data do depósito do pedido de revalidação no Brasil, o melhor entendimento é aquele expendido pelos votos vencidos proferidos pelos eminentes Ministros PÁDUA RIBEIRO e NANCY ANDRIGHI.

Conforme os aludidos votos minoritários, o prazo de proteção da patente pipeline deve ser o remanescente que a patente originária tem no exterior, contado, ao revés, a partir da data do primeiro depósito do pedido de proteção patentária, o qual incidiria a partir da data do depósito no Brasil, limitado tal período, entretanto, a 20 anos.

Essa exegese, na vertente de que o termo inicial de contagem do prazo remanescente é a data do primeiro depósito realizado no exterior, é a que melhor se coaduna com os princípios que regem a Propriedade Intelectual e o sistema de patentes.

Assim, as normas da Lei de Propriedade Industrial (Lei 9.279/96) devem ser interpretadas sistematicamente com o TRIPS (Acordo Sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio), incorporado pelo Decreto 1.355/94, e com a CUP (Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial, revista em Estocolmo a 14 de julho de 1967), internalizada pelo Decreto 635/92.

O acordo TRIPS visou, entre outros objetivos, a estabelecer padrões e princípios adequados relativos à existência, abrangência e exercício de direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio, tendo uniformizado, no art. 33, o sistema de contagem e vigência de patentes:

ARTIGO 33

Vigência

A vigência da patente não será inferior a um prazo de 20 anos, contados a partir da data do depósito.

Ademais, consta em nota de rodapé ao referido artigo que "aqueles Membros que não dispõem de um sistema de concessão original podem dispor que o termo de proteção será contado a partir da data do depósito no sistema de concessão original".

O Brasil, antes da edição da Lei 9.279/96, não possuía um sistema de concessão original para a proteção intelectual de substâncias, matérias, misturas ou produtos alimentícios, químico-farmacêuticos e medicamentos, de qualquer espécie, bem como os respectivos processos de obtenção ou modificação, mesmo porque eles não eram privilegiáveis (art. 9º, "c", da revogada Lei 5.772/71 - antigo Código de Propriedade Industrial).

Com a superveniência da nova legislação sobre a propriedade industrial, os aludidos inventos passaram a ser patenteáveis através do sistema de revalidação, conforme o disposto no art. 230, § 4º, da LPI, que, interpretado de forma harmônica com o art. 33 do TRIPS e respectiva nota de rodapé, leva à conclusão de que o termo de proteção das patentes pipeline será contado a partir da data do depósito no sistema de concessão original.

Nesse passo, cabe fazer algumas digressões acerca da convenção CUP, que instituiu uma União para a proteção da propriedade industrial, na qual se insere a patente de invenção.

Consoante o art. 4º desse tratado, o depósito do pedido de patente em um dos membros da União garante o direito de prioridade a pedidos feitos em outros países. Para as patentes de invenção, a prioridade unionista perdura por 12 meses. Além disso, durante esse interregno, o depositante possui certas garantias, como a preservação da característica de novidade ao invento e a impossibilidade de terceiros fazerem uso dele ou o patentearem nos demais países membros da União.

Vale ressaltar que tais prerrogativas emanadas do direito de prioridade para os pedidos de patente subsequentes persistem ainda que haja desistência ou abandono do pedido de patente anterior.

Cotejando, desse modo, o art. 230, § 4º, da Lei 9.279/96, que, como dito alhures, deve receber interpretação restritiva, com o TRIPS e a CUP, depreende-se que o cálculo do prazo remanescente das patentes pipeline - o qual incidirá a partir da data do depósito do pedido de revalidação no Brasil - deve levar em conta a data do depósito no sistema de concessão original, ou seja, o primeiro depósito no exterior, ainda que abandonado, visto que a partir de tal fato já surgiu proteção ao invento.

Desta feita, constata-se que nem sempre a data da queda em domínio público da patente pipeline no Brasil vai ser a mesma da correspondente no exterior, o que traz à evidência, essa falta de vinculação, o princípio da independência das patentes, inscrito no art. 4º bis da CUP, que se aplica, de modo absoluto, tanto do ponto de vista das causas de nulidade e de caducidade como do ponto de vista da duração normal. A respeito:

Art. 4 bis

(1)                                                                                As patentes requeridas nos diferentes países da União por nacionais de países da União serão independentes das patentes obtidas para a mesma invenção nos outros países, membros ou não da União.

(2)                                                                                Esta disposição deve entender-se de modo absoluto particularmente no sentido de que as patentes pedidas durante o prazo de prioridade são independentes, tanto do ponto de vista das causas de nulidade e de caducidade como do ponto de vista da duração normal.

(3)                                                                                Aplica-se a todas as patentes existentes à data da sua entrada em vigor.

(4)                                                                                O mesmo sucederá, no caso de acessão de novos países, às patentes existentes em ambas as partes, à data de acessão.

(5)                                                                                As patentes obtidas com o benefício da prioridade gozarão, nos diferentes países da União, de duração igual àquela de que gozariam se fossem pedidas ou concedidas sem o benefício da prioridade.

De mais a mais, segundo o art. 5º, XXIX, da CF, os direitos de propriedade industrial devem ter como norte, além do desenvolvimento tecnológico e econômico do país, o interesse social. Vale assinalar, outrossim, que, na aplicação da lei, o juiz deverá atender aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum (art. 5º da LICC). Sob esse prisma, a seguinte lição de Márcia Maria Nunes de Barros, que teceu comentários acerca das patentes pipeline, o interesse público e o direito fundamental à saúde:

Além disso, tal pretensão atenta frontalmente contra o interesse público e a soberania nacional, na medida em que não pode o prazo de uma patente brasileira ficar ao sabor de decisões administrativas de outros países, cujos interesses nem sempre são consentâneos com os nacionais.

(...)

Imperioso consignar que, se por um lado a Constituição Federal conferir proteção às criações industriais, por outro, cuidou de atrelá-la ao interesse social, nos termos do seu art. 5º, XXIX. Por conseguinte, não se pode deixar de ter em mente que as necessidades sociais em matéria de saúde pública devem ser sempre levadas em consideração quando da interpretação da lei no que se refere a patentes de medicamentos, até porque os direitos de propriedade intelectual têm sua legitimidade mitigada pelo interesse social e pelo desenvolvimento tecnológico e econômico do país, conforme expressa determinação constitucional (art. 5º, XXIII, CF/88).

(...)

Ora, a saúde é um direito social garantido a todos (arts. 6º e 196, CF/88), cuja relevância pública encontra-se expressamente prevista no art. 197, sendo dever do Estado sua promoção. Daí, porque a Lei nº 9.787/99 instituiu no País os genéricos, que surgem como alternativa terapêutica para a população, pois são cópias de medicamentos inovadores (ou de referência) cujas patentes já expiraram e são lançados com preços, no mínimo, 35% inferiores aos dos medicamentos de referência correspondentes, nos termos das normas que regem a matéria. A eficácia desses medicamentos é garantida através de estudos de equivalência farmacêutica e bioequivalência (estes com seres humanos), de modo que tenham a mesma ação do medicamento de referência, ou seja, são intercambiáveis.

Ora, é inegável que a partir do momento em que a patente caia em domínio público e passe a ser explorada pela indústria dos genéricos, a população será beneficiada com maior oferta de medicamentos, a preços muito mais acessíveis, traduzindo concretização maior e efetiva dos direitos constitucionais à saúde e da integridade da pessoa humana, princípios fundamentais de uma ordem social justa.

Também o País, entidade estatal que tem dever de garantir a saúde da população, será beneficiado com a maior oferta do produto, podendo vir a economizar nas compras públicas e oferecer mais medicamentos à sociedade. Por fim, saliento que o mais festejado autor brasileiro em matéria de propriedade industrial, JOÃO DA GAMA CERQUEIRA, comentando o art. 40 do CPI de 1945, o qual previa a possibilidade de prorrogação de patentes quando convenientes aos interesses nacionais, brasileiro sobre a Propriedade Industrial, já advertia:

A prorrogação do prazo de duração do privilégio é medida que não encontra nenhuma justificativa e que só poderá dar lugar a abusos e injustiças. Dir-se-á que a prorrogação só terá lugar excepcionalmente e quando convier aos interesses nacionais. Mas a segunda condição destrói a primeira, pois, sempre que os interesses nacionais o exigirem, a prorrogação poderá ser concedida e a medida pouco a pouco perderá o seu caráter de exceção. Além disso, esta condição reveste-se da fórmula do interesse nacional, conceito vago, impreciso, flutuante, que comporta as mais variadas aplicações e as mais arbitrárias interpretações. Por outro lado, falar em prorrogação do prazo dos privilégios de invenção por interesse nacional é verdadeiro contra-senso. O interesse nacional, que constitui fundamento para a desapropriação de patente (Código, art. 64), não pode servir de fundamento para prorrogar o prazo do privilégio em benefício do seu concessionário, cujos interesses particulares se contrapõem aos nacionais. A coletividade, por sua vez, está interessada não na prorrogação do privilégio, mas na sua extinção e na vulgarização das invenções, para que o uso e a exploração destas se tornem livres (Constituição, art. 141, § 17). Portanto, se por interesses nacionais, se entenderem os interesses da coletividade, o contra-senso da lei ainda é maior. Não receamos errar afirmando que os interesses nacionais e interesses da coletividade não se conciliam nunca com a prorrogação do prazo dos privilégios, exigindo, ao contrário, a sua extinção no prazo normal. De fato, como pode a Nação ou a coletividade ter interesse na permanência de um privilégio que cerceia a liberdade de todos e cuja exploração exclusiva só ao seu concessionário traz benefício? Aliás, a incoerência da lei mais se patenteia quando faz depender a prorrogação do prazo de “pedido devidamente comprovado”, pois esse pedido somente poderá ser feito pelo único interessado no prolongamento do privilégio, isto é, pelo concessionário, o qual representa seus interesses pessoais e não os interesses nacionais ou os da coletividade. ("Propriedade Intelectual - Pipeline - Princípio da Independência das Patentes". In: R. SJRJ, Rio de Janeiro, n. 20, p. 149-171, 2007).

No caso dos autos, a patente européia foi obtida em 28.02.1996, por um prazo de 20 anos. Já o primeiro depósito do pedido de patente no exterior foi realizado em 19.02.1990, devendo ser computado, ainda que tenha havido desistência. Em 27.06.1996, foi formulado o requerimento de revalidação no Brasil (sistema pipeline). De 19.02.1990 a 27.06.1996 transcorreram 6 anos, 4 meses e 7 dias. O prazo remanescente passa, então, a ser 13 anos, 7 meses e 23 dias, que posposto à data do depósito no Brasil chega à data de 19.02.2010.

Por fim, impende asseverar que a própria recorrente indicou, como primeiro depósito no exterior, o pedido CH 518/90, formulado em 19.02.1990 na Suíça (fls. 28/31-STJ).

Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial. É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2009/0130146-2 REsp 1145637 / RJ

Números Origem: 199902010589871 9800316876

PAUTA: 15/12/2009 JULGADO: 15/12/2009

Relator

Exmo. Sr. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS)

Presidente da Sessão

Exmo. Sr. Ministro SIDNEI BENETI

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. JUAREZ ESTEVAM XAVIER TAVARES

Secretária

Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : NOVARTIS AG

ADVOGADO : JOAQUIM EUGENIO GOMES DA SILVA GOULART PEREIRA E OUTRO(S) RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL INPI PROCURADOR : MARIA APARECIDA MONSORES RODRIGUES E OUTRO(S)

ASSUNTO: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Atos

Administrativos - Registro de Marcas, Patentes ou Invenções

SUSTENTAÇÃO ORAL

Dr(a). MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA, pela parte RECORRENTE: NOVARTIS AG

Dr(a). INDIRA ERNESTO SILVA QUARESMA(Procurador Federan( �br style='mso-special-character:line-break'>

, pela parte RECORRIDA: INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL INPI

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Paulo Furtado (Desembargador convocado do TJ/BA), Nancy Andrighi, Massami Uyeda e Sidnei Beneti votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 15 de dezembro de 2009

MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

Secretária

RECURSO ESPECIAL Nº 1.145.637 - RJ (2009/0130146-2)

RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS)

RECORRENTE : NOVARTIS AG

ADVOGADO : JOAQUIM EUGENIO GOMES DA SILVA GOULART PEREIRA E OUTRO(S)

RECORRIDO : INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL INPI PROCURADOR : MARIA APARECIDA MONSORES RODRIGUES E OUTRO(S)

VOTO-VOGAL

EXMO. SR. MINISTRO MASSAMI UYEDA:

Sr. Presidente, eminentes Ministros, ontem à tarde tive a oportunidade de receber em meu gabinete os advogados de ambas as partes e tive a oportunidade também de fazer um prévio contraditório, porque ambos expuseram detalhadamente os seus posicionamentos.

Eu estava aguardando a leitura do voto do eminente Ministro Vasco Della Giustina e concordo integralmente com S. Exa. no sentido de negar provimento ao recurso especial.

Ministro MASSAMI UYEDA