Processo
n.º 422/17.8YHLSB.L1.S1
7.ª Secção (Cíven( �o:p>
Recurso
de Revista
Decisão Texto Integral
Acordam
no Supremo Tribunal de Justiça
Relatório
A
sociedade Aromateca-Consultadoria e Formação da Restauração
S.A. intentou no 1ºo Juízo do Tribunal da Propriedade
Industrial acção declarativa de condenação contra AA
pedindo que seja anulado o registo da marca nacional n° 555469 PADARIA DA
ESQUINA, declarando-se este extinto e proibindo-se o seu uso enquanto sinal
identificador de bens e/ou serviços.
Invocou
que é uma sociedade portuguesa com mais de 10 anos e o objecto
social “...Consultoria e formação na área da restauração. Criação e concepção de publicações na área culinária. Organização de
eventos. Produção e comercialização de produtos alimentares embalados e
brindes. Importação e exportação, Catering, restaurante, bar, gelataria,
pizaria, supermercados, compra e venda de artigos gourmet e similares, take away, prestação de serviços correlacionados...”, no
exercício do qual é proprietária de vários estabelecimentos de restauração em
Lisboa, Angola e Brasil.
O
chef BB, nessa qualidade e com 30 anos de profissão, é a face visível da A. e a
pessoa que para além de sócio, tem sido responsável pelo lançamento e gestão
dos estabelecimentos de restauração 'Tasca …”, “Peixaria …”, “Taberna …”,
“Balcão …” e “Cervejaria …”, tendo estado ao comando da gestão das cozinhas dos
ditos estabelecimentos, o que inclui criação de menus, programação, gestão da
equipa supervisionando e assegurando que os pratos incluídos no menu
correspondem às expectativas dos seus milhares de comensais. Sendo, pois,
figura indissociável dos estabelecimentos D...da Esquina” e a pessoa que tem projectado esta identidade quer em Portugal, quer no Brasil
e Angola, sendo também da sua responsabilidade a escolha da equipa que o
acompanha na concretização dos objectivos da Autora,
que tem em curso o projecto de abertura e exploração
dos espaços “...da Esquina” noutros países europeus, no âmbito dos quais a
cozinha e os produtos portugueses estão na vanguarda, recriando e dando a
conhecer a cozinha portuguesa.
A
Autora presta ainda serviços de consultoria, formação, food styling,
showcookíng, gestão de restaurantes e eventos, sempre
com o objectivo de preservar a identidade portuguesa
e o sabor característico dos alimentos. Para além da titularidade de 3 registos
em Angola e 5 no Brasil de marcas sempre caracterizadas pelo elemento “...da
Esquina”, a Autora tem vindo a registar em Portugal e na União Europeia (UE) as
seguintes marcas, todas concedidas e com datas de prioridade entre 2009 e 2012,
destinadas a assinalar serviços de restauração na classe 43 e ainda serviços
relacionados com a formação na classe 41 e com a publicidade, gestão de
negócios e, franchising, na classe 35 : marcas nacionais n° 493571 DA ESQUINA,
n° 447557 TASCA DA ESQUINA, n° 541989 TABERNA DA ESQUINA, n° 549193 PEIXARIA DA
ESQUINA, n° 559965 SNACK BAR DA ESQUINA e n° 564027 BALCÃO DA ESQUINA, e da UE
n° 9435975 CERVEJARIA DA ESQUINA, n° 10914224 TASCA DA ESQUINA e n° 10553246 DA
ESQUINA. As marcas DA ESQUINA, sempre com a assinatura do chef BB e por isso de
si indissociáveis, possuem um elevado grau de distintividade
face aos serviços que assinalam e assim reconhecidos por um vasto público
nacional, no Brasil e em Angola.
O
chef BB responsável pela projecção nacional e
internacional das marcas “...DA ESQUINA”, tem obtido muitas outras distinções
por via dos seus pares, como a de “Chefe do Ano pela Academia Portuguesa de
Gastronomia”, e do Estado Português, como o “Grau de Comendador da Ordem do
Infante D. Henrique”.
As
marcas “...DA ESQUINA” têm associado a si (entre os oito restaurantes e as
consultorias) uma facturação global de 10 milhões de
euros em 2016, servindo a Autora em média, em Portugal, 95.000 refeições por
ano. No LISBON LUX - o Guia Essencial de Turismo na Cidade de Lisboa, o
restaurante Tasca da Esquina integra o top 10 dos restaurantes de Lisboa. As
marcas “...DA ESQUINA” são frequentemente objecto de
notícia nos meios de comunicação social, facultando ao público o conhecimento
do que elas representam no panorama da restauração nacional e internacional.
Também por via da página da A. na internet a informação permanente é tornada
acessível ao público em geral. Na sequência natural do conjunto de registos
prévios das marcas “DA ESQUINA” e “...DA ESQUINA”, da projecção
da marca n° 909584168 “PADARIA DA ESQUINA” requerida no Brasil e da abertura
largamente noticiada do 1o estabelecimento em São Paulo em 2016
a Autora apresentou junto do INPI, em Novembro de
2016, o pedido de registo de marca nacional n° 571394 “PADARIA DA ESQUINA” para
assinalar serviços de restauração na classe 43 (doe. 14). Por despacho
publicado em 28.08.2017, o INPI recusou o referido pedido de registo de marca
n° 571394 “PADARIA DA ESQUINA” da Autora, com base na marca nacional n° 555469
PADARIA DA ESQUINA do R..
Foi
proferida sentença que declarou a acção improcedente
e, em consequência, absolveu o Réu do pedido.
A
autora interpôs recurso e foi proferida pelo relator decisão
sumária que julgou a apelação improcedente e confirmou integralmente a sentença
recorrida.
Posteriormente
veio a ser proferido em conferencia acórdão que manteve a decisão singular,
julgando improcedente a apelação e confirmando a decisão recorrida.
…
…
De
novo inconformada com esta decisão veio a autora apresentar recurso de revista
concluindo que:
“1.
O Acórdão recorrido foi proferido na sequência de um outro Recurso interposto
para este Supremo Tribunal, de uma Decisão Singular que, conforme era invocado,
padecia, em nossa modesta opinião, de diversas nulidades.
2.
Como é patente, o douto Acórdão ora recorrido, destinou-se a sanar – e sanou- uma essas nulidades - a de não ter sido proferida por
Tribunal Colectivo, sem que para tal tivesse
fundamentado – embora o tenha feito de forma implícita.
3.
Quanto às demais nulidades invocadas, o douto Acórdão ora recorrido limitou-
se, sem qualquer fundamentação, a declarar que elas não existem, fazendo a extratação da fundamentação anterior, constante da Decisão
Singular.
4.
Sanada a nulidade da falta de decisão pela Conferência
mas, como se disse, fazendo apenas a extratação da
Decisão Singular, é o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação o acto formalmente recorrido – e que substitui a Decisão
Singular, assim reconhecida como nula – e, por essa via, (da extratação nele adoptada),
constitui a fundamentação usada neste Acórdão, o objecto
substancial do presente Recurso.
5.
O presente Recurso estriba-se em diversos fundamentos, entre os quais no
disposto no artigo 629º, 2, d), 671º n. 1 e, cautelarmente,
672º n. 1 a) e c), todos do CPC e assenta, desde logo, na absoluta necessidade
de, nas matérias decididas, incidir o Vosso douto Julgamento, em ordem a uma
melhor interpretação e aplicação do Direito, já que o douto Acórdão recorrido
está em contradição com variados Acórdãos e Doutrina estabelecida,
designadamente em relação às seguintes matérias:
a.
Possibilidade de se submeter a julgamento a questão do conhecimento da adopção, ou não, por comerciante, de sinal pré-existente e
seu conhecido;
b.
O sentido e alcance do conceito de sinal descritivo e/ou genérico, nos termos
do actual art. 209º n. 1 a)
e c) do Código da Propriedade Industrial (C.P.I.) e sua consequência jurídica.
c.
A admissibilidade de manutenção de uma marca composta apenas por elementos
genéricos e descritivos, in casu, Padaria da Esquina
para assinalar produtos de panificação vendidos em padarias sitas em esquinas.
d.
A admissibilidade de manutenção de uma marca composta por um sinal semelhante e
confundível – Padaria da Esquina - com marcas registadas anteriores, todas
integrando o sinal distintivo «da Esquina», destinadas a produtos ou serviços
semelhantes, ou afins.
e.
A admissibilidade de manutenção de uma marca composta por um sinal semelhante e
confundível – Padaria da Esquina - com marcas de registo prévio, todas
integrando o sinal distintivo «da Esquina», notórias e de prestígio, ademais,
como se disse, anteriores e destinadas a produtos ou serviços semelhantes, ou
afins.
f.
A possibilidade de concorrência desleal através da utilização de uma marca
idêntica e/ou semelhante e confundível com outras, assinalando produtos
semelhantes e afins dos que são utilizados nos serviços prestados sob as marcas
anteriores.
6.
A subsistência na ordem jurídica da decisão recorrida é séria, pelas arriscadas
inovações que introduz na Jurisprudência, pelo que, também por isso, para além
de ser injusta, deve ser revogada cfr. art. 672º n. 1 a) e c) do C.P.C.
7.
O escopo do recurso de Revista é o de permitir um novo grau de Jurisdição,
neste caso pelo Supremo Tribunal de Justiça, sobre as decisões do Tribunal da
Relação que conheçam do objecto da Apelação, i.e., do
objecto e mérito da causa.
8.
Temos, portanto, um Acórdão do Tribunal da Relação …..
que obriga ao presente Recurso, que conhece definitivamente o objecto da Apelação, ou seja, o mérito da causa e porque é
nula - Indeferimento em Conferência – a fls 1 do
Acórdão ora recorrido- de nulidades arguidas: “No vertente Recurso em
apreciação, confirma-se a decisão singular proferida (posto que, entre o mais,
nenhuma nulidade a enferma)....”, por não estar devidamente fundamentada, nos
termos do art. 615º n. 1 b) e c) in fine do C.P.C.
São as seguintes as nulidades arguidas, a que o Tribunal a quo se refere,
decidindo que não existem, sem qualquer fundamentação:
a.
a decisão é nula nos termos do mesmo art. 615º n. 1
c) do C.P.C. em virtude de obscuridades e ambiguidades que tornam
ininteligíveis essas decisões em vários pontos;
b.
por omissão de pronúncia em relação a alguns pontos sub
juditio, o que também a torna nula, nos termos do art. 608º n. 2 e art. 615º n. 1
d) ambos do C.P.C.
c.
é recorrível ainda porque, com o devido respeito, faz uma errada aplicação da
lei em todos os aspectos que decide;
d.
e porque o faz contradizendo Jurisprudência constante em casos semelhantes.
9.
E não há impedimento a que seja recorrível porque não se verificam
circunstâncias obstativas, como a dupla conforme; Embora
as Instâncias tenham julgado ambas em sentido favorável ao R./Recorrido, a
fundamentação do Acórdão ora sob censura é essencialmente diferente da da Sentença que julgou a acção,
por sinal em todos os seus pontos - cfr. art. 671º n. 3 a contrario do C.P.C.
10.
Por outro lado, estão em causa questões cuja apreciação, pela sua relevância
jurídica, é necessária para uma melhor aplicação do Direito de Propriedade
Industrial; tanto mais que o Acórdão recorrido está em contradição com outros,
dos Tribunais da Relação e deste Supremo Tribunal de Justiça que justifica que,
subsidiariamente, se tenha interposto este Recurso de Revista também nos termos
do art. 672º n. 1 a) e c) do C.P.C. sob a forma de
Revista Excepcional.
11.
O Venerando Tribunal a quo considerou evidente que o facto de se saber se o R. adoptou, ou não, como sinal identificador dos seus produtos
um sinal pré- existente e seu conhecido não é
«subsumível a julgamento», mas omitiu completamente os fundamentos em que
assenta a sua decisão neste ponto, omissão tanto mais delicada quanto a sua
decisão contraria a prática e Jurisprudência habituais dos Tribunais nesta área
do Direito; o que configura o mesmo tipo de nulidade, a falta de fundamentação.
12.
Tampouco fundamentou - o que configura o mesmo tipo de nulidade – porque é que,
dispondo da prova, que estava nos autos e foi identificada pela Apelante, desde
logo documental, e também testemunhal e dos (outros) factos dados como
provados, versando factos concretos acerca (i) da pré-existência do sinal e (ii) do elevado grau de probabilidade de conhecimento pelo
Réu/Apelado desse sinal, o Venerando Tribunal a quo entende que «A prova que
eventualmente foi feita não passou de meras opiniões das testemunhas, que nada
interessam ao tribunal.»9, sendo que, afinal, o facto do R./Apelado ter adoptado o sinal em questão era, ele próprio, o fundamento
da acção de anulação da marca nacional registada, nº
555469 “Padaria da Esquina”.
13.
A decisão de que «a marca “padaria da esquina“ não tem a virtualidade de se
apropriar de sinais (palavras, números, desenhos) que pertençam ao domínio
público dos sinais necessário a todos os empresários (cozinheiros, artífices,
agricultores, viticultores, etc.), para o fim de eles apresentarem e oferecerem
os seus serviços ou produtos.», para além de discutível, já que, na sua
literalidade, impede os padeiros e empresários de panificação de a usarem, não
responde – e, por isso, desde logo não fundamenta uma resposta - à questão
suscitada e sub juditio de
que «…a marca em questão “padaria da esquina”, para assinalar uma padaria de
esquina, é completamente genérica e descritiva e, também por esta razão, inapropriável e nula.», conforme a conclusão 21ª da
Apelação.
14.
Esta questão não é aquela sobre a qual o Venerando Tribunal a quo desenvolveu o
seu argumento, i.e., embora o douto Acórdão ora recorrido tenha fundamentado
porque é que entende que o R/Apelado não se apropriou de sinais que pertençam
ao domínio público dos sinais necessários a todos os empresários, não
fundamentou, de todo, a decisão acerca da questão efectivamente
colocada, a do facto da marca anulanda ser
constituída apenas por sinais genéricos e descritivos, com isso violando as
normas supra identificadas, o que configura o mesmo tipo de nulidade.
15.
Embora sejam questões independentes, o Venerando Tribunal a quo associou entre
as que identificou a questão 4ª – concorrência desleal -, à 5ª – notoriedade e
prestígio das marcas da ora Recorrente -, acabando por
não se pronunciar sobre esta, referindo, apenas, que a argumentação expendida
pela Apelante acerca da concorrência desleal não procede porque «as marcas e o
prestígio deste chef de cozinha, em nada relevam para as questões de marca».
Isto porque, do que percebemos, a marca refere-se a um determinado produto (…)
é o produto que está no mercado, e só ele deve ser tido em consideração. Ora, a
lei, contraria esta acepção: não é só o produto que
deve ser tomado em consideração. A identificação da origem, o risco de
associação pela confundibilidade dos sinais, são outros factores
concretos a ponderar- cfr. Art
245 e 239 nº 1 do CPI então em vigor.
16.
Embora, com o devido respeito, de forma errada e insuficiente, a fundamentação
expendida de algum modo até aborda a 4ª questão, da concorrência desleal; mas o
douto Acórdão recorrido não se chegou a pronunciar – em total omissão –, acerca
da 5ª questão, a notoriedade e o prestígio, nos termos em que a questão
jurídica é formulada e equacionada no âmbito do Direito da Propriedade
Industrial.
17.
Caso porventura se entenda, no que não se concede, que as supra apontadas
ausências de fundamentação nas decisões nos vários pontos do Acórdão recorrido
estão em falta, sempre deveriam ser consideradas ambíguas ou obscuras as
considerações tecidas em relação a cada decisão.
18.
Decidiu o Venerando Tribunal a quo que improcede o questionamento da Apelante
acerca da não consideração como provado do facto do R/Apelado ter adoptado como marca um sinal pré-existente e seu conhecido
porque seria um facto não subsumível a julgamento e porque a prova que
eventualmente foi feita não passou de meras opiniões das testemunhas, que nada
interessam ao tribunal; Ora, não era isto que estava em causa; A então Apelante
começara por salientar que o facto «…há-de ser
considerado provado como resultado lógico de uma ilacção
retirada de premissas, que são os outros factos dados como provados e respectiva fundamentação; e também porque há prova directa acerca dele.» portanto em linha com as doutas
palavras do Venerando Tribunal a quo, de que é uma operação mental valorativa
que só ao Pretório cumpre reflectir, acrescentando
nós que, considerando as provas apresentadas e os demais factos dados como
provados, o Meritíssimo Juiz da Primeira Instância deveria necessariamente ter
realizado essa operação mental valorativa no sentido de considerar provado o
ponto em questão. Responder, como o Venerando Tribunal a quo fez, que cabe ao
Pretório fazer aquilo que justamente se esperava e foi pedido ao Tribunal é, s.m.o, e com todo o respeito, ambíguo e obscuro.
19.
Por outro lado, responder que os factos, provados por documentos e testemunhas,
e levados à matéria considerada provada, são «meras opiniões (…) que nada
interessam ao tribunal», também é um comentário/fundamento ambíguo e obscuro.
20.
No que respeita à 2ª Questão das que tratou, não se percebe como pode o
Venerando Tribunal a quo, deixando de se pronunciar sobre a questão em
causa, considerar, face à lei, que a marca «padaria da esquina» para
assinalar produtos de panificação comercializados numa padaria, situada numa
esquina, cumpre os requisitos legais, incluindo a necessidade de preencher o
requisito da necessária distinguibilidade e,
sobretudo, quando a A/Apelante/Recorrente é titular das marcas registadas,
válidas e em vigor, anteriores ‘tasca da esquina’, ‘taberna da esquina’,
‘peixaria da esquina’ e ‘cervejaria da esquina, e, ainda mais conspícua e
gravemente, a marca mater ‘DA ESQUINA’!;
21.
A suposição de existir uma foto com uma padaria no meio de prédios, ao invés de
numa esquina e a estranheza do senso comum são evidentemente irrelevantes m
relação ao julgamento da intenção do R/Apelado, um agente económico, conhecedor
do negócio e bem informado, sobretudo quando o que se entendeu ser natural no
senso comum consistiria numa ilegalidade, já que, recorde-se, as marcas
registadas não podem ser exclusivamente constituídas por elementos genéricos ou
descritivos. A fundamentação é, pois, também neste aspecto
e nesta segunda questão, obscura, não se percebendo o seu sentido.
22.
Ambígua e obscura é, também, a possibilidade que, em tese e no caso concreto, o
Venerando Tribunal a quo admite o facto de uma marca poder ser constituída
exclusivamente por sinais genéricos ou descritivos, como a dos autos e, assim,
ser adequada a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras
empresas ao responder apenas à questão suscitada afirmando, inovadoramente, que
o que é necessário é que, na composição da marca, o empresário não se aproprie
de sinais (palavras, números, desenhos) que pertençam ao domínio público dos
sinais necessário a todos os empresários (cozinheiros, artífices, agricultores,
viticultores, etc.), para o fim de eles apresentarem e oferecerem os seus
serviços ou produtos.» Trata-se de uma resposta ambígua, que não responde, de
facto, à questão sub juditio.
23.
O Venerando Tribunal a quo também respondeu às 4ª e 5ª questões que
identificou, com argumentos contraditórios entre si, ambíguos e obscuros. Pelo
menos a ora recorrente não logrou conseguir entender o alcance da afirmação:
«É
o produto que está no mercado, e só ele que deve ser tido em consideração. Quem
faz, trabalha, aprimora, comercializa, por si só, enquanto pessoa jurídica, não
detém, ou goza, como é óbvio, da regulamentação dos direitos de marca.»
Acrescentando, «Mesmo assim, as marcas e o prestígio deste chef de cozinha, em
nada relevam para as questões da marca. O que importa é o cotejo das marcas em
litígio. Nada mais.».
24.
Finalmente, e quanto à 6ª questão que abordou, o Venerando Tribunal a quo
decidiu que a marca anulanda não é uma imitação
servil das marcas anteriores
da
A/apelante porque «o elemento de marca, “da esquina”, não tem a virtualidade de
confundir o consumidor médio, porque (pensamos) não é visto como inerente a um produto,e, portanto, distintivo,
mas como uma “localização no espaço urbano”. Sabemos como o adjectivo
“da esquina” faz parte do linguarejar do povo, muitas vezes com tom
depreciativo. A não confundibilidade entre o produto das partes não passa,
certamente, por este elemento tão corriqueiro.»
25.
Com o devido respeito, não só a expressão «da esquina» não nos parece um adjectivo como, principalmente, o que está em causa é a
confundibilidade e não a não confundibilidade, o que nos leva a supor que o
«não» naquela frase resultará de algum lapso, sendo que o que está em causa não
é a confundibilidade entre o produto das Partes, mas as marcas das Partes, o
que torna o fundamento ambíguo e obscuro;
26.
Mais, o elemento da esquina que o Venerando Tribunal a quo entende ser
corriqueiro – mas que na questão anterior não considerou nem genérico, nem
descritivo para assinalar produtos comercializados numa padaria sita numa
esquina, voltando, agora, a considerar que uma localização no espaço urbano no
que respeita aos produtos assinalados com a marca anulanda
nada terá que ver com o art. 223º n. 1 c) do C.P.I.,
para além do 238º n. 1 b), c), e) e 265º do mesmo código, todos na versão ao
tempo em vigor, é, indubitavelmente o elemento distintivo nas marcas obstativas
e a imagem de marca que as liga todas, aos negócios da Recorrente,
comprovadamente associadas ao chef BB, há mais de uma década., sem olvidar que
a marca “DA ESQUINA” está registada e em vigor, nacionalmente e em território
Europeu, para produtos e serviços idênticos e afins. Ora, só podendo ser também
este o elemento distintivo – da esquina - que na marca anulanda
deveria assegurar a necessária distinguibilidade, a
conclusão de que ele não gera confundibilidade entre os sinais em confronto
torna a frase completamente incompreensível, ambígua e obscura;
27.
O douto Acórdão recorrido não se pronunciou sobre a nulidade invocada na
Conclusão 22ª da Apelação que julgou, o que, por sua vez, a torna nula por
omissão de pronúncia.
28.
O douto Acórdão recorrido também é nulo por omissão de pronúncia porque
tampouco se pronunciou acerca da matéria alegada na conclusão 24ª da Apelação,
isto é, na omissão de pronúncia pela própria douta Sentença apelada acerca das
seguintes questões, que, afinal, as Instâncias evitaram:
a.
a «…notoriedade e prestígio das marcas ...DA ESQUINA», invocando o específico
regime jurídico de que beneficiam (arts. 23º e seg.
até 32º primeira parte, e arts. 70º, 74º, 84º, 99º,
100º)»;
b.
que «…o elemento inicial, PADARIA, é descritivo e identificador dos produtos e
serviços que assinala…». (arts. 47º e seg.);
c.
Que «…sendo a distância merceológica nula, o grau de probabilidade de
transferência do bom nome das conhecidas marcas ...DA ESQUINA para a
identificação da actividade comercial do R., é uma
realidade.», (arts. 52º, 72º e 73º); Que gera a falta de capacidade da marca anulanda
de distinguir os produtos e serviços de uma empresa dos de outras
entidades/empresas e das suas actividades (arts. 80º e 81º); qualquer uma elas idónea para originar e
fundamentar um resultado completamente diferente no Julgamento – a declaração
de anulação do registo- e, consequentemente, uma Sentença de teor oposto ao da
que foi proferida.
29.
O douto Acórdão recorrido tampouco se pronunciou acerca da matéria alegada nas
conclusões 28ª a 32ª da Apelação, acerca da manifesta semelhança e
confundibilidade dos sinais e das marcas sub juditio sendo, por isso, nula por omissão de pronúncia;
30.
Tal como não se pronunciou sobre a notoriedade e o prestígio das marcas da
Recorrente, questão suscitada nas conclusões 35ª a 37ª da Apelação, sendo nula
pela mesma razão.
31.
Nos termos do art. 608º n. 2 do Código de Processo
Civil, «o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à
sua apreciação…», sob pena de nulidade, nos termos do art.
615º n. 1 do mesmo código, motivo pelo qual o douto Acórdão Recorrido, tal como
a Sentença antes dela, é nula.
32.
Com as decisões sob censura, o Venerando Tribunal a quo, desrespeitou o art. 1º do C.P.I., os direitos exclusivos de Propriedade
Industrial da Recorrente e o próprio escopo do Direito da Propriedade
Industrial, que é o de combater a concorrência desleal, tal como não respeitou
o disposto no art. 224º n. 1, 258º, nem o disposto
nos arts. 222º n. 1 in fine, 223º ns.
1 a) e c), 238º n.1 b) e c), 239º n. 1 a) e e), 241º,
242º, 245º e 265º, todos do C.P.I. na sua versão anterior, mas em vigor à data
da prolação das decisões ora sob Recurso, actualmente
substituído pelo Dec.-Lei n. 110/2018, de 10 de Dezembro,
cujas normas, nesta matéria, são de idêntico teor, mas diferentemente
numeradas…
33.
Na 1ª questão que aborda, o que se pediu ao Venerando Tribunal a quo foi que
decidisse que o Meritíssimo Juiz de Direito deveria ter retirado a conclusão
necessária, que o sinal adoptado pelo R/Apelado era
«pré-existente» e «por si conhecido», considerando-o provado com base na prova
e nos demais factos dados como provados, nos termos da lei material e
processual, v.g. os arts. 341º, 362º, 371º, 392º,
396º do Código Civil, 410º, 413º e 607º ns. 3 e 4º do
C.P.C.,
Ao
não ter atentado ou respondido devidamente à questão colocada, desrespeitou
estas normas.
34.
Ao admitir, na 2ª questão que coloca, manter o facto dado como provado no ponto
16, dadas as circunstâncias e os demais factos provados, o Venerando Tribunal a
quo desconsiderou completamente os arts. 222º n. 1 in
fine, 223º n. 1 a) e c) e 238º n. 1 b), c) e e) do
C.P.I. anteriormente e na altura em vigor, porquanto, segundo parece, para si,
neste Acórdão, pressupõe-se que o conceito de elementos genéricos ou
descritivos e o legal impedimento das marcas serem apenas constituídos por
eles, não releva;
35.
Entendimento, ilegal, que se veio a confirmar na resposta que o deu à 3ª
questão que identificou.
36.
Como já se referiu, quanto às 4ª e 5ª questões identificadas pelo Venerando
Tribunal a quo, este argumenta que «É o produto que está no mercado, e só ele
que deve ser tido em consideração.», fundamento cujo alcance não lográmos, mas
que, na sua literalidade, não corresponde ao que a lei estatui, a Doutrina
ensina e a Jurisprudência aplica. Conforme este Supremo Tribunal já ensinou -
«no âmbito da protecção do direito à marca, o que
está em causa não é a confusão dos produtos ou a confusão directa
das actividades, mas, sim, a que possa ocorrer entre
sinais distintivos, portanto confusão indirecta de actividades» que «…a essência da tutela passou a ser a protecção contra os enganos sobre a origem dos produtos
(acrescente-se, ou dos serviços), a protecção contra
os riscos de confusão não já apenas dos produtos mas, essencialmente, sobre a
origem desses produtos (fontes produtivas).» e que «A marca desempenha uma
função jurídica e económica: não só individualiza produtos e permite a sua
diferenciação de outros da mesma espécie como, através dessa função, permite
associar na mente dos consumidores a marca que assinala o produto às diversas
características que ele lhe venha a atribuir.»
37.
As Instâncias não atenderam devida e fundadamente ao facto da ora Recorrente
ser titular, para além das outras, das marcas, nacional nº 493571 e da UE nº
10553246, marcas constituídas, unicamente, pela designação «DA ESQUINA »,
anteriores à marca anulanda (os seus registos datam
de 2012, facto provado) e, por via deste facto, da necessidade de realizar um
«juízo comparativo (“deve ser objectivo, para ele não
terá de se perguntar se o registante em segundo lugar
quis criar a susceptibilidade de confusão mas se
realmente existe esse risco de confusão. A resposta terá de tomar em conta o
consumidor ou o utilizador final medianamente atento”), e para cuja formulação
relevam menos as dissemelhanças que ofereçam os diversos pormenores
isoladamente do que a semelhança que resulta do conjunto dos elementos
componentes (não tendo a eficácia distintiva que se reportar a todos eles, mas
apenas aos que realmente são distintivos), não oferece dificuldades.»,
violando, designadamente, os arts. 224º n. 1, 258º e
265º do C.P.I. anterior.
38.
Na primeira questão que o douto Acórdão recorrido tratou, a Primeira Instância
decidiu que este facto resulta não provado por ter sido impugnado e não se ter
feito qualquer prova, ou prova suficiente, do mesmo. Entretanto, de modo
surpreendente, o Venerando Tribunal a quo decidiu que aquele facto – o de que o
R. adoptou um sinal pré-existente e seu conhecido -
não é, sequer, subsumível a Julgamento. Tratam-se de
fundamentos não apenas diferentes, mas essencialmente diferentes.
39.
Na 3ª questão que a douta Decisão recorrida tratou, enquanto a Primeira
Instância – em omissão de pronúncia - nada disse sobre o carácter genérico e
descritivo, o Venerando Tribunal a quo decidiu que «necessário é que, na
composição da marca, o empresário não se aproprie de sinais (palavras, números,
desenhos) que pertençam ao domínio público dos sinais necessário a todos os
empresários (cozinheiros, artífices, agricultores, viticultores, etc.), para o
fim de eles apresentarem e oferecerem os seus serviços ou produtos.».
São
fundamentos não apenas diferentes, antes tratando da inexistência de fundamento
e da existência de fundamento, embora, a nosso ver, totalmente inadequando e
contra legem.
40.
Nas 4ª e 5ª questões abordadas, em conjunto, no douto Acórdão Recorrido, «É o
produto que está no mercado, e só ele que deve ser tido em consideração. Quem
faz, trabalha, aprimora, comercializa, por si só, enquanto pessoa jurídica, não
detém, ou goza, como é óbvio, da regulamentação dos direitos de marca.»
Acrescentando, «Mesmo assim, as marcas e o prestígio deste chef de cozinha, em
nada relevam para as questões da marca.» Enquanto a Primeira Instância,
deixando de se pronunciar – mais uma vez em omissão de pronúncia – acerca da
notoriedade e prestígio das marcas da então A., decidiu, quanto à concorrência
desleal que «Não havendo risco de confusão, ou associação, entre os sinais em
confronto, não se demonstra a possibilidade de actos
de concorrência desleal…». Tratam-se, também aqui, de fundamentos não apenas
diferentes, mas essencialmente diferentes.
41.
Na 6ª questão tratada pelo douto Acórdão recorrido podemos retirar os elementos
literais do fundamento, com o devido respeito, obscuro, utilizado pelo
Venerando Tribunal a quo que o elemento “da esquina” não tem a virtualidade de
confundir o consumidor médio porque não é visto como algo inerente a um
produto…, mas como uma localização no espaço urbano… -, constatamos que também
nesta questão o seu fundamento não apenas é diferente do usado na Primeira
Instância, como é diferente na sua essencialidade.
42.
Para além do que se referiu supra, e sem conceder, o douto Acórdão recorrido
contradiz frontalmente Jurisprudência constante de Acórdãos do mesmo Tribunal
da Relação de Lisboa, de outras Relações e deste Supremo Tribunal de Justiça, o
que desde logo funda que este Recurso tenha sido interposto, subsidiariamente,
também como Revista Excepcional, nos termos e para os
efeitos 629º n. 2 d) e 672º ns. 1 a) e c) do C.P.C.
43.
Desde logo contraria em várias partes o acórdão deste Supremo Tribunal Acórdão,
de 11/10/2001, proferido no processo n. 2581/2001, publicado no Boletim da
Propriedade Industrial n. 1 de 2004, de que se junta cópia para maior
facilidade e para cumprir o art. 637º n. 2 in fine do
C.P.C.
44.
E, bem assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 23/5/2019,
proferido no processo 148/17.2YHLSB.L1-8, recentemente publicado e
consultável em: http://www.dgsi.pt/, num caso muitíssimo semelhante ao dos
autos, relacionado com uma marca prestigiada, concorrente das da Recorrente – a
Belcanto -, contrariado em várias partes pelo douto
Acórdão recorrido, sobretudo quanto à desconsideração da matéria da marca de
prestígio e também da imitação e da concorrência desleal, na modalidade de
concorrência parasitária, como a do R./Apelado/Recorrido em relação à
A./Apelante/Recorrente, reiterando a necessidade de recusar – anular- o registo
da marca que reproduza ou imite, no todo ou em parte, marca anteriormente
registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa
induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de
associação com a marca registada, cujo sumário se reproduziu supra e se dá,
aqui, também por reproduzido, Acórdão de que se junta cópia para maior facilidade
e para cumprir o art. 637º n. 2 in fine do C.P.C.
45.
Quanto ao facto de ser admissível e habitual os Tribunais julgarem, sem
qualquer objecção, antes pelo contrário, com
naturalidade no pleno exercício das suas funções, se um comerciante adoptou, ou não, um sinal semelhante a um outro - marca
registada - pré-existente e já conhecido, por si e pelo consumidor, versando,
ainda, a questão da irrelevância das componentes descritivas e genéricas das
marcas na apreciação da necessária distintividade das
marcas, que o douto Acórdão ora recorrido deveria ter julgado, por todos, o Ac.
do Tribunal da Relação de Lisboa, de 26/11/2009, proferido no
proc.n.33/06.3TYLSB.L1-6, consultável em: http://www.dgsi.pt/, cujo
sumário se reproduziu supra e se dá, aqui, também por reproduzido.
46.
Quanto à necessidade das marcas integrarem um elemento de fantasia, que seja
novo, incluindo o reconhecimento do fundamento de declaração de nulidade de
marca que constitua reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca
anteriormente registada por outrem, para produtos ou serviços idênticos ou
afins e, ainda, a critérios de apreciação da imitação ou usurpação de marca,
que a douta decisão recorrida não respeitou, por todos, o Ac. do Tribunal da
Relação do Porto, de 25/12/2014, proferida no processo
487/08.3TYLSB.L1-1,consultável em: http://www.dgsi.pt/, cujo sumário se
reproduziu supra e se dá, aqui, também por reproduzido.
47.
Quanto à imitação e à afinidade de produtos ou serviços, que o douto Acórdão
recorrido nem sequer apreciou, como devia, por todos, para além do anterior, o
Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 25/12/2014, proferida no processo
487/08.3TYLSB.L1-1, consultável em: http://www.dgsi.pt/ ,
cujo substancial sumário se reproduziu supra e se dá, aqui, também por
reproduzido.
48.
Quanto à capacidade distintiva de sinais fracos, genéricos e descritivos e respectiva insusceptibilidade de registo, ou da sua
manutenção, por todos, a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, em
17/5/2016, no proc. n. 452/14.1YHLSB.L1-1, cujo sumário se reproduziu supra e
se dá, aqui, também por reproduzido.
49.
Quanto à questão da concorrência desleal, ensinou recentemente, por todos, este
mesmo Venerando Supremo Tribunal, em 5/6/2018, no Proc. n.143/16.9YHLSB.L1. S1
da 7ª Secção, de modo totalmente contrário ao do douto Acórdão recorrido, cujas
partes mais relevantes para a apreciação do caso sub juditio se reproduziram supra e se dão, aqui, também por
reproduzidas.
Preceitos
violados:
Arts. 341º, 362º, 371º, 392º e
396º do Código Civil; arts. 410º, 413º, 607º ns. 3 e 4º e 656º do Código de Processo Civil; Arts. 1º, 222º n. 1 in fine, 223º ns.
1 a) e c), 224º n. 1, 238º n.1 b) e c), 239º n. 1 a) e e),
241º, 242º, 245º, 258º e 265º, todos do C.P.I. na versão então em vigor,
substituído pelo Dec.-Lei n. 110/2018, de 10 de Dezembro, com entrada em vigor
no dia 1 de Julho de 2019, com as normas,
correspondentes, de idêntico teor, mas diferentemente numeradas.
Termos
em que deve a presente Revista ser admitida e julgada procedente e, em
consequência, ser declarado nulo e/ou revogado o Acórdão que julgou
improcedente o pedido de anulação do registo da marca nacional nº 555469
«PADARIA DA ESQUINA», decretando-se a respectiva
nulidade, ou caso assim não se entenda, determinando-se a anulação do registo.”
Nas
contra-alegações a recorrida sustenta a confirmação da decisão recorrida e a
improcedência da revista.
Colhidos
os vistos, cumpre decidir.
… …
Fundamentação
Foi
julgada prova a seguinte matéria de facto:
“1.
A Autora é uma sociedade portuguesa com mais de 10 anos e o objecto
social 'Consultoria e formação na área da restauração. Criação e concepção de publicações na área culinária. Organização de
eventos. Produção e comercialização de produtos alimentares embalados e
brindes. Importação e exportação, Catering, restaurante, bar, gelataria,
pizaria, supermercados, compra e venda de artigos gourmet e similares, take away, prestação de serviços correlacionados', no exercício
do qual é proprietária de vários estabelecimentos de restauração em Lisboa,
Angola e Brasil, cf. doc. 1, junto a fls. 9v-85 dos autos, que se dá por
reproduzido.
2.
Além de sócio, o chef BB é o responsável e a face visível pelo lançamento e
gestão dos estabelecimentos de restauração da R., entre os quais a 'Tasca da
Esquina' e a 'Peixada da Esquina', abertos em 2009 e Agosto
de 2015 respectivamente, e a 'Padaria da Esquina',
inaugurada em 10.07.2018, situados no bairro de Campo de Ourique, em Lisboa.
3.
Há cerca de 3 anos, o chef BB abriu uma 'Padaria da Esquina' em S. Paulo
(Brasil), que tem sido considerada 'a melhor padaria de S. Paulo' pelas
revistas 'Veja' e 'Folha de S. Paulo'.
4.
A Autora presta igualmente serviços de consultadoria e formação na área da
gastronomia e restauração a clientes como a TAP, o Benfica e o Grupo Sovena.
5.
A Autora tem uma estratégia de comunicação apoiada em elevados investimentos em
publicidade (cerca de 2 a 4% do volume de negócios), prevendo €50.000,00 só
para o arranque de cada unidade de venda e recorrendo à agência de marketing
gastronómico 'Chef Agency' na promoção das suas
marcas.
6.
Os estabelecimentos da A. têm uma presença forte na imprensa e nos meios
digitais, tendo criado um perfil público no facebook
denominado 'Padaria da Esquina - Campo de Ourique', acessível
em https://pt pt.facebook.com/ PadariadaEsquinaCam-podeOurique/,
onde é visível o sinal, conforme print extraído em 20.02. 2018 da referida
página e junto como doc. 4 a fls. 118 dos autos, que se dá por reproduzido.
7.
A Autora é titular dos seguintes registos de marca, cf. docs. 2 a 10 juntos a
fls. 17v-29 dos autos, que se dão por reproduzidos: -marca nacional n° 447557
TASCA DA ESQUINA, solicitada em 13.04.2009 e concedida em 11.08.2009 para
assinalar 'Restaurantes [refeições]; cafés-restaurantes' na classe 43 da
Classificação de Nice; - marca nacional n° 49351 DA ESQUINA, solicitada em
11.01.2012 e concedida em 2.03.2012 para assinalar 'Serviços de restauração,
restaurantes e cafés-restaurantes' na classe 43 da Classificação de Nice; -
marca nacional n° 541989 TABERNA DA ESQUINA, solicitada em 23.01.2015 e
concedida em 15.04.2015 para assinalar 'Restaurantes (refeições);
cafés-restaurantes' na classe 43 da Classificação de Nice; - marca nacional n°
549193 PEIXARIA DA ESQUINA, solicitada em 18.06.2015 e concedida em 15.09.2015
para assinalar 'Serviços de restauração, restaurantes e cafés-restaurantes' na
classe 43 da Classificação de Nice; - marca nacional n° 559965 SNACK BAR DA
ESQUINA, solicitada em 8.02.2016 e concedida em 5.05.2016 para assinalar
'Serviços de restauração, restaurantes e cafés-restaurantes' na classe 43 da
Classificação de Nice; - marca nacional n° 564027 BALCÃO DA ESQUINA, solicitada
em 26.04.2016 e concedida em 25.0.2016 para assinalar 'Serviços de restauração,
restaurantes e cafés-restaurantes' na classe 43 da Classificação de Nice;
-marca da União Europeia (UE) n" 9435975 CERVEJARIA DA ESQUINA, solicitada
em 11.10.2010 e concedida em 18.03.2011 para assinalar 'Publicidade; gestão do
negócio comercial; administração comercial; trabalhos de escritório; serviço de
franchising', (classe 35), 'serviços de educação, formação e actividades culturais' (classe 41) e 'serviços, para
fornecimento de alimentos e bebidas, restaurantes e cafés' (classe 43); - marca
da União Europeia (UE) n° 10553246 DA ESQUINA, solicitada em 11.01.2012 e
concedida em 7.06.2012 para assinalar 'Publicidade; gestão do negócio
comercial; administração comercial; trabalhos de escritório; serviço de
franchising' (classe 35), 'serviços de educação, formação e actividades
culturais' (classe 41) e 'serviços para fornecimento de alimentos e bebidas,
restaurantes e cafés' (classe 43); - marca da União Europeia (UE) n° 10914224
TASCA DA ESQUINA, solicitada em 25.05.2012 e concedida em 20.05.2014 para
assinalar 'Publicidade; gestão do negócio comercial; administração comercial;
trabalhos de escritório; serviço relativo a franchising' (classe 35), 'serviços
de educação, formação e actividades culturais'
(classe 41) e 'serviços, para fornecimento de alimentos e bebidas, restaurantes
e cafés' (classe 43);
8.
Em 3.11.2015, o R. solicitou junto do INPI o registo de marca nacional (verbal)
PADARIA DA ESQUINA, que lhe foi concedido por despacho de 1.02.2016, publicado
no BPI de 4.02.2016 para assinalar na classe 30 'baguetes recheadas; bases de
pizas pré-cozidas; base para pizas; chamuças; crepes;
empadas; folhados de salsicha; hamburgers no pão; massa de pizza; pãezinhos
recheados; pão recheado; piza; pizzas; sanduíches; sanduíches abertas; tosta
mista; baguetes; pão com passas; pão de alho; pão de centeio; pão-de-leite; pão
integral; pão fresco; pão sem glúten; torradas; confecções
de mousse; croissants; panquecas; panquecas [crepes]; pão; pastelaria variada;
produtos de confeitaria; produtos de padaria; waffles [gaufres];
bebida à base de chá; bebidas à base de café; cacau; cacau em pó; café; café
descafeinado; café em forma moída; café em grão; café expresso; café gelado;
café moído; capuchino; chá; chá de limão; chás; chocolate; chocolate de leite;
chocolate em pó; chocolate para beber; chocolate quente; chocolates; ice tea; barras de gelado; confeitaria à base de gelado;
confeitaria congelada; confeitaria de gelado; doce gelado; gelados; gelados
[sorvetes]; produtos gelados de confeitaria', cf. doe. 17, junto a fls. 67-68 e
ainda a fls. 106v-l07v dos autos, que se dá por reproduzido.
9.
Em 10.10.2016, a A. apresentou junto do INPI o pedido
de registo de marca nacional (verbal) n° 571394 PADARIA DA ESQUINA para
assinalar 'Serviços de restauração, restaurantes e cafés-restaurantes' na
classe 43 da Classificação de Nice, publicado no BPI de 20.10.2016, cf. doe.
14, junto a fls. 62v-63 e 108-ll2v dos autos, que se dão por reproduzidos.
10.
Por despacho de 16.03.2017, publicado no BPI de 28.03.2017, o INPI recusou o
aludido pedido de registo da marca n° 571394 da A. (ponto 9 do presente
enunciado de factos), com base na mencionada marca prioritária homónima do R.
(ponto 8 do presente enunciado de factos), vindo igualmente a recusar em
28.08.2017 pedido de modificação dessa decisão, apresentado pela A. nos termos
do artigo 23° do CPI, cf. doe, junto a fls. 108-112v dos autos, atrás dado por
reproduzido.
11.
Em 11.08.2017, o R. solicitou junto do INPI o registo da marca nacional (mista)
n° 586970 para assinalar diversos produtos nas classes 30 e 40 da Classificação
de Nice, cf. doe. 18, junto a fls. 68v-74 dos autos, que se dá por reproduzido.
12.
Com data de 19.09.2017, o mandatário do R. remeteu à A. carta registada junta
como doe. 13, a fls. 61v-62, que se dá por reproduzida, na qual designadamente
interpela a Autora para 'no prazo de 10 dias cessar o uso do nome 'PADARIA DA
ESQUINA' sob todas as formas, designadamente, mas não só, na rede social
'Facebook', [.,.] sob pena de recurso aos meios judicias'.
13.
Com data de 6.10.2017, o agente de propriedade industrial da A. respondeu à
referida carta do mandatário do R. (ponto 12 do presente enunciado de factos),
através da carta registada com aviso de recepção
junta como doe. 5, a fls. 119-119v dos autos, que se dá por reproduzido, na
qual designadamente solícita que o R. 'proceda no prazo de cinco dias à
renúncia do registo da marca nacional n° 555469 PADARIA DA ESQUINA, bem como à
desistência do pedido de registo da marca nacional n° 586970 solicitado para produtos
e serviços das classes 30 e 43'.
14.
Os meios de comunicação tradicionais e digitais têm feito eco da abertura,
funcionamento e gastronomia dos estabelecimentos da A. e do chef BB, cf. doc.
12, junto a fls. 29v-63 dos autos, que se dá por reproduzido.
15.
O R. explora desde Novembro de 2015 o estabelecimento de padaria e pastelaria
com fabrico próprio denominado 'PADARIA DA ESQUINA', junto da estação da CP de …., Rua …, num prédio de esquina, arrendado pela sua sogra
desde a década de 70 do século passado, e por esta explorada durante décadas
sob o nome 'Dora'.
16.
O R. escolheu o nome 'PADARIA DA ESQUINA' para designar o dito estabelecimento
(ponto 15 do presente enunciado de factos), porque este fica situado na esquina
de um prédio, cf. foto junta como doc. 6, junto a fls. 120 dos autos, que se dá
por reproduzido.
17.
Em junho de 2017, o R. abriu um outro estabelecimento 'PADARIA DA ESQUINA' no
concelho de Sintra, Praceta …, Sintra, em local industrial e empresarial,
igualmente situado na esquina de um prédio, cf. foto junta como doe. 7 a fls.
120v dos autos, que se dá por reproduzido.
18.
O R. possui um perfil público na rede facebook
denominado 'PADARIA DA ESQUINA,
https:// www.facebook.com/Padaria/da/Esquina/436148263242951/, cuja
primeira publicação é de Novembro de 2015, data da
inauguração da Ia padaria (ponto 15 do presente enunciado de
factos.
19.
O chef BB tem recebido distinções dos seus pares, tendo sido considerado em
1999 'O Chefe do Ano' pela Academia Portuguesa de Gastronomia, e sido agraciado
em 2006 com o Grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique pelo
Presidente da República, Jorge Sampaio, cf. anunciado no
site http://www. aromateca-group.com.
20.
No Lisbon LUX (O Guia Essencial de Turismo e da
Cidade de Lisboa), o restaurante Tasca da Esquina integra o top 10 dos
restaurantes de Lisboa, cf. indicado no correspondente sítio web acessível em
https:/ / www.lisbonlux.com/lisbon-restaurants/ top-10-best
restau-rants-in-lisbon.html.
Não
se provou:
“A.
As marcas '...DA ESQUINA' têm associado a si (entre os oito restaurantes e as
consultorias) uma facturação de 10 milhões de euros
em 2016.
B.
Em Portugal, nos restaurantes '...DA ESQUINA' a A.
serve em média 95.000 refeições por ano.
C.
O R., adoptou como sinal identificador dos seus
produtos um sinal pré-existente e seu conhecido.”
…
…
O
objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das Recorrentes, não podendo
este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de
conhecimento oficioso, conforme prevenido nos arts.
635º n.º 4 e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do
Código de Processo Civil.
O
conhecimento das questões a resolver, delimitadas pelas alegações, importa em
apreciar e decidir se se verifica a nulidade da decisão recorrida e se o
registo da marca do réu “PADARIA DA ESQUINA” deve ser anulado e declarado
extinto proibindo-se o seu uso enquanto sinal identificador de produtos e/ou
serviços.
…
…
Tendo
sido admitida a presente revista (como excepcional)
com fundamento em estar a decisão recorrida em contradição com outra já
transitada em julgado proferida pela Relação de Lisboa no domínio da mesma
legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito – art.
672 nº 2 al. c) do CPC - importa apreciar as conclusões de recurso a partir da
arguição das nulidades invocadas pela recorrente e que, em seu entender
consubstanciam as previstas no art. 615 nº 1 al. c) e
d) do CPC.
Dispõe
o art. 615 nº 1 al. c) do CPC que a sentença é nula,
quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma
ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, dispondo a al. d)
do mesmo preceito que é igualmente nula a sentença quando o juiz deixe de
pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que
não podia tomar conhecimento.
As
causas de nulidade de sentença (ou de outra decisão), taxativamente enumeradas
no art. 615.º do CPC, visam o erro na construção do
silogismo judiciário e não o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão
ou a não conformidade dela com o direito aplicável.
A
nulidade consistente na omissão de pronúncia ou no desrespeito pelo objecto do recurso, em directa
conexão com os comandos ínsitos nos arts. 608.º e
609.º do CPC, só se verifica quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre
questões ou pretensões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada.
E a expressão «questões» prende-se com as pretensões que os litigantes submetem
à apreciação do tribunal e as respectivas causas de
pedir e não se confunde com as razões (de facto ou de direito), os argumentos,
os fundamentos, os motivos, os juízos de valor ou os pressupostos em que as
partes fundam a sua posição na controvérsia. É em face do objecto
da acção, do conteúdo da decisão impugnada e das
conclusões da alegação do recorrente que se determinam as questões concretas
controversas que importa resolver – vd. ac. STJ de 03-10-2017 no proc. n.º
2200/10.6TVLSB.P1.S1.
Quanto
à nulidade que previne a ocorrência de alguma ambiguidade ou obscuridade que
torne a decisão ininteligível, tal (só) sucederá quando não seja perceptível qualquer sentido da parte decisória
(obscuridade) ou ela encerre um duplo sentido (ambiguidade) sendo ininteligível
para um declaratário normal; a obscuridade e a
ambiguidade só são relevantes quando gerem ininteligibilidade, isto é, quando
um declaratário normal não possa retirar da parte
decisória (e só desta) um sentido unívoco, mesmo depois de recorrer à
fundamentação para a interpretar – cfr. Lebre de
Freitas, em «A Acção Declarativa Comum», Coimbra
Editora, 3ª edição, pags. 333-334 e nota 48-A.
Apreciando
concretamente no caso, tendo a recorrente destacado nas conclusões as nulidades
supra indicadas, inicia a abordagem a elas, aludindo à “nulidade do
douto Acórdão recorrido por falta de fundamentação no que respeita a várias
partes das questões que decide”. Isto é, sem o destacar expressamente e
indicar a previsão legal, pretende também arguir a nulidade do acórdão com
fundamento na al. b) do art. 615 nº 1 do CPC que
dispõe ser a sentença nula quando “não especifique a fundamentação de facto ou
de direito que justifica a decisão”.
O
dever de fundamentar as decisões tem consagração expressa no artigo 154º do
Código de Processo Civil e impõe-se por razões de ordem substancial, cumprindo
ao juiz demonstrar que da norma geral e abstracta
soube extrair a disciplina ajustada ao caso concreto, e de ordem prática, posto
que as partes precisam de conhecer os motivos da decisão, em particular a parte
vencida, a fim de, sendo admissível o recurso, poder impugnar o respectivo fundamento ou fundamentos. Ac. STJ de 2-6-2016
no proc. 781/11 .6TB MTJ.L1.S1, in dgsi.pt. Não pode,
porém, confundir-se a falta absoluta de fundamentação com a fundamentação
insuficiente, errada ou medíocre, sendo que só a falta absoluta de motivação
constitui a causa de nulidade prevista na al. b) do nº 1 do artigo 668º citado,
como dão nota A. Varela, M. Bezerra e S. Nora - Manual de Processo Civil, 2ª
ed.,1985, p.670/672 – escrevendo que “Para que a sentença careça de
fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente,
incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se
possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”.
Só a total omissão dos fundamentos, a completa ausência de motivação da decisão
pode conduzir à nulidade suscitada.
No
caso, o acórdão recorrido mostra-se fundamentado, apresentando, no que agora
releva, a descrição fáctica considerada pertinente e a correspondente subsunção
jurídica. Assinale-se que a recorrente (conclusões 11 e 12) faz radicar a falta
de fundamentação na circunstância de a decisão recorrida, no domínio da
apreciação da matéria de facto ter mantido, como não provado, o ponto C da
sentença e apelação. Ora, é manifesto e já o explicámos, não é essa falta de
fundamentação do julgamento da matéria de facto aquela que se sanciona no art. 615 e, por outro lado, os poderes do STJ em matéria de
facto são residuais, apenas referentes a matéria que envolva violação do
direito probatório material (matéria que não é suscitada nos autos) – art. 682 nº 2 e 674 nº 3 do CPC.
No
que refere a outras faltas de fundamentação, o que a recorrente discute é o
desacerto da que foi assumida na decisão recorrida (conclusões 13 a 16)
aludindo até que, quanto aos argumentos que apresentou, ou o tribunal lhe não
deu resposta ou esta foi errada e insuficiente (vd. conclusão 16). Só que esta
abordagem, centrada nos argumentos esgrimidos pela recorrente e na alusão que a
decisão recorrida a eles realiza ou não, não se situa na falta de
fundamentação, mas antes na arguição da omissão de pronúncia, nulidade também
arguida e a que responderemos de imediato.
…
…
Quanto
à arguição de omissão de pronúncia começamos por esclarecer que o pedido
formulado na acção pela ora recorrente foi o de
anulação do título de registo da marca nacional nº 555469 “PADARIA DA ESQUINA”,
declarando-se extinto o seu registo e proibindo-se o seu uso. E foi este exacto pedido que ambas as instâncias apreciaram julgando-o
improcedente.
A
sentença julgou a acção improcedente por não se
encontrar preenchido o requisito do conceito de imitação de marca registada
tendo delimitado o objecto do conhecimento, de acordo
com o pedido e a causa de pedir, à verificação de o registo em questão, ao usar
a marca PADARIA DA ESQUINA, ter ou não violado os direitos privativos da autora
possibilitando actos de concorrência desleal. Com
análise dos normativos contidos nos arts. 266º, nº 1,
239º a 242º do CPI considerou que não havia, no caso, reprodução ou
imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para
produtos ou serviços idênticos ou afins que pudesse induzir em erro ou confusão
o consumidor ou que compreendesse o risco de associação com a marca registada;
nem infracção de outros direitos de propriedade
industrial; e que não reconhecia que o réu pretendesse fazer concorrência
desleal ou de que esta fosse possível, independentemente da sua intenção. Por
sua vez, a decisão recorrida, confirmando a sentença e conhecendo do mesmo objecto, organizou a exposição em forma de resposta às
“questões” suscitadas pela recorrente nas suas conclusões de recurso, mas
apreciando a reprodução ou imitação da marca e a problemática da concorrência
desleal, consequente daquela imitação, julgando improcedente a apelação e os
argumentos da recorrente.
Concluímos,
então, que ambas as decisões proferidas, mantendo, como tinham de manter, a
integridade do que era a questão jurídica a dirimir deram-lhe resposta e, neste
sentido, não se pode predicar-lhes qualquer omissão de pronúncia. A questão
suscitada, foi decidida e mais nenhuma outra havia que decidir.
Nestes
termos, pelo que deixamos dito, a decisão recorrida não omitiu o conhecimento
das questões que constituem o objecto, primeiro da acção e, depois, do recurso, não se podendo confundir
qualquer eventual falta de resposta aos argumentos da recorrente com aquela
outra que configure ausência de pronúncia sobre a questão a decidir. Aliás,
poder questionar-se que a fundamentação da questão a decidir é errada e
apresentar outra que se lhe oponha como mais certa, aduzindo os respectivos argumentos de correcção
ou completude, é matéria que se dirige à decisão em si mesma e não à sua
nulidade. Os argumentos das partes são uma proposta de fundamentação e decisão
para a questão que querem ver julgada e não um formulário a que o julgador deva
preencher, respondendo item a item, e a que deva pautar o seu raciocínio. O
mérito dos argumentos, nas alegações de recurso, é o de sinalizar um caminho
diverso do que foi percorrido pelo julgador para a mesma questão que se
protesta ter sido mal julgada, mas o mau julgamento só inscreve a nulidade de
omissão de pronúncia quando a questão a decidir não chegue a ser conhecida, no
todo ou em parte.
Quanto
à obscuridade arguida adverte-se desde logo que ela incide sobre o texto
decisório tal como deve ser entendido por um declaratório normal e o vício só
existirá quando tal declaratório não possa retirar da parte decisória (e só
desta) um sentido unívoco, mesmo depois de recorrer à fundamentação para a
interpretar. Ora, o que a recorrente protesta é que, para lá, e
independentemente, do que um declaratório normal pode obter da decisão
recorrida, a fundamentação (e apenas esta) em que ela se sustenta, levada a uma
análise de intensidade maior, em seu entender, suscita questões interpretativas
que contrapostas ao sentido do afirmado pelo julgador abrem outras hipóteses de
entendimento ao que foi afirmado. Embora em tese, em termos estritamente dialécticos, qualquer fundamentação que revele um
determinado conteúdo quando sujeita a um exercício de análise infinitesimal
possa eventualmente sugerir hipóteses interpretativas além do que foi dito, a
verdade é que o critério para aferir se se regista a nulidade em causa é o de a
apreciação desta remeter para a decisão, não para a fundamentação, e por outro
lado, para o sentido de um declaratário normal, sendo
este sentido que serve para medir a clareza e inteligibilidade do que se
decidiu. E não se suscitam dúvidas sobre a inteligibilidade e clareza do que
foi decidido e se traduziu na improcedência da acção.
A
não aceitação do decidido por parte da recorrente, no caso, não encontra
provimento na falta de fundamentação, na omissão de pronúncia ou na obscuridade
ou contradição e pode apenas ser apreciada, em função da admissibilidade excepcional da revista, na perspectiva
do acerto ou desacerto da decisão recorrida.
Nesta
conformidade entende-se que a decisão recorrida não sofre de vícios que a firam
de nulidade e, em consequência, nesta parte, improcedem as conclusões de
recurso.
…
…
No
que respeita ao mérito da causa, a recorrente protesta que a decisão recorrida
realizou errada aplicação da lei, desde logo, porque a decisão recorrida julgou
que o facto C dos não provados não era subsumível a julgamento. Neste domínio,
o que se decidiu foi que essa matéria (o facto C dos não provados) não podia
fazer parte da prova por não ser um facto, mas uma conclusão (que apenas de
outros factos se poderia). O julgamento de que a decisão
recorrida fala é o da matéria de facto, o que se certifica quando verificamos que
quando o afirma está a tratar a da impugnação da matéria de facto arguida pela
autora. Assim o que a recorrente protesta é que deveria ser considerado um
facto que foi julgado como não provado e que a apelação manteve igualmente como
não provado.
De
igual modo, a recorrente opõe-se à decisão recorrida defendendo que o tribunal
errou por ter defendido que o senso comum acharia estranha a designação «da
esquina» – que, recorde-se, corresponde exactamente
ao facto provado documentalmente. Porém, mais uma vez, a insurgência da
recorrida é dirigida à parte da decisão em que se aprecia a impugnação da
matéria de facto para manter como provado o ponto 16 onde se julgou que “O
R. escolheu o nome 'PADARIA DA ESQUINA' para designar o dito estabelecimento
(ponto 15 do presente enunciado de factos), porque este fica situado na esquina
de um prédio”
Quanto
a estes dois argumentos dirigidos ao desacerto da decisão recorrida, eles
resultam, mais que irrelevantes, inábeis, como fundamento de recurso uma vez
que são dirigidos à matéria de facto fixada pela sentença e confirmada pela
apelação em matéria, como antes de deixou explicado, subtraída ao conhecimento
pelo STJ.
…
…
Quanto
ao objecto do recurso, consistente em saber se a
marca registada pelo réu deve ser anulada, começa por esclarecer-se que na
lição de J. M. Coutinho de Abreu - marcas são signos (ou sinais) susceptíveis de representação gráfica destinados sobretudo
a distinguir certos produtos de outros produtos idênticos ou afins – in Marcas,
in BFDUC, vol. LXXIII, pág. 121 – embora este conceito se encontre previsto
legalmente com maior abrangência nos termos do art.
222 do CPI aprovado pelo DL 36/2003 aplicável (e que foi revogado pelo DL
110/2018 de 10 de Dezembro) que estabelece a possibilidade de a marca ser
constituída “por um sinal ou conjunto de sinais susceptíveis
de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas,
desenhos, letras, números, sons, a forma do produto ou da respectiva
embalagem, desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de
uma empresa dos de outras empresas.”
A
importância do registo de uma marca resulta do facto de ser através deste que
se adquire a sua propriedade (da marca) e o consequente direito de a usar em
exclusivo, sendo este regime de registo, constitutivo, uma vez que o direito
apenas existe se e na medida em que esteja registado a favor do respectivo titular; não há nenhum direito exclusivo sobre
uma determinada marca se esta não estiver registada – cf. Carlos Olavo,
Propriedade Industrial, Liv. Almedina, 1997, pág. 65/67.
As
razões de recusa e de anulação do registo conforme disposição do art. 266 nº 1 do CPI aplicável implicam que tenha sido
infringido o previsto no art. 239 nº 1 do mesmo
diploma, segundo o qual, constitui fundamento de recusa do registo de marca:
a) a
reprodução ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada
por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em
erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a
marca registada.
Esclarecendo
o que deve entender-se imitação ou usurpação, o art.
245 do CPI estabelece que “1 - A marca registada considera-se imitada
ou usurpada por outra, no todo ou em parte, quando, cumulativamente:
a)
A marca registada tiver prioridade;
b)
Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins;
c) Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza
facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de
associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as
possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
2
- Para os feitos da alínea b) do nº 1:
b
- Produtos e serviços que não estejam inseridos na mesma classe da
classificação de Nice podem ser considerados afins.”
Neste
campo de estudo, tem-se afirmado como pacífico na jurisprudência e na doutrina,
que existe contrafacção quando uma marca posterior
reproduz totalmente uma marca anterior e imitação quando a marca posterior
reproduz aproximadamente a marca anterior, seja essa aproximação em grau mais
ou menos intenso – vd. Luís Couto Gonçalves, Manual de Direito Industrial, 8ª
ed. p. 250/251- devendo a imitação de marca ser apreciada, menos pelas
dissemelhanças que ofereçam os diversos pormenores considerados isolada e
separadamente do que pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que
constituem a marca – ac. STJ de 29-5-2003 no proc. 03B3971, in dgsi.pt. E
idêntico entendimento expressava já Pinto Coelho, nas suas "Lições de
Direito Comercial", quando escrevia que “Sempre que a marca, no seu
conjunto, forma uma semelhança tal com outra que possa determinar a confusão
entre as duas, deve considerar-se a marca como imitada; deve olhar-se,
insiste-se, à semelhança do conjunto e não à natureza das dissemelhanças ou ao
grau das diferenças que as separam.” O público geralmente não está a pensar na
imitação, na existência ou inexistência de imitação, liga um produto, que lhe
agradou, a certa marca, de que conserva uma ideia mais ou menos precisa, e por
isso é de evitar que outro comerciante adopte uma
marca que, ao olhar distraído do público, possa apresentar-se como sendo a que
ele busca.
Com
esta mesma orientação Ferrer Correia, enunciava a imitação como existente
quando, atendendo apenas à marca a constituir, se deva concluir que ela é susceptível de ser tomada por outra de que se tenha
conhecimento, salvaguardando o interesse em que se não confundam, através da
marca, mercadorias idênticas ou afins pertencentes a empresários diversos -
Lições de Direito Comercial, vol. I, 1965, pág. 347. A comparação entre duas
marcas deve ser feita tendo em conta que o comprador, quando compra um produto
marcado com um sinal semelhante a outro que já conhecia, não tem
simultaneamente as marcas sob os olhos para as comparar. “Compra o
produto por se ter convencido de que a marca que o assinala é aquela que
retinha na memória. Por isso, também o Juiz não deve colocar uma das marcas ao
lado da outra para proceder a um exame simultâneo das duas; o que deve fazer é
examiná-las sucessivamente, de maneira a perguntar-se se a impressão deixada
pela primeira é semelhante à da segunda, colocando-se em posição semelhante à
do consumidor, que, por não ter as duas marcas ao mesmo tempo diante dos olhos,
não pode fazer um exame comparativo, tendo de decidir com o auxílio da sua
memória. Quando em causa estão marcas nominativas, o aspecto
mais relevante é o da semelhança fonética, aquele que a memória melhor retém” –
ac. STJ de ac. STJ de 29-5-2003 no proc. 03B3971, in dgsi.pt.
Outra
nota de atenção é a marca ser a totalidade dos seus sinais (signos) e não
apenas um deles e se é certo que nas exclusivamente nominativas o primeiro
vocábulo é o que de imediato chama a atenção do consumidor, é a impressão de
conjunto que deve prevalecer para aquilatar do risco de confusão entre as duas
palavras em confronto, sem tentar artificialmente isolar algumas das letras,
sílabas ou partes que as compõem. Aliás, o Tribunal de Justiça, interpretando
os arts. 4º e 5º n.º 1, alíneas b) e c) da Directiva,
correspondentes aos preceitos do CPI em análise, decidiu - Acórdão de 11.11.97 Sabel, C - 251/95, na Colectânea,
1997, p. I – 6191 – que o risco de confusão, “depende de numerosos factores e designadamente do conhecimento da marca no
mercado, da associação que pode ser feita com o sinal utilizado ou registado,
do grau de semelhança entre a marca e o sinal e entre os produtos ou serviços
designados”, risco que, tal como assinalado pelos autores supra referidos,
deve ser apreciado globalmente, sendo que tal apreciação, no que respeita à
semelhança visual, fonética ou conceitual das marcas em causa, deve ser fundada
numa impressão de conjunto, tendo em conta, nomeadamente, os elementos
distintivos e dominantes dessas marcas.
Para
completar este quadro de análise todas as observações relativas aos diversos
segmentos de apreciação da imitação são presidas pelo critério geral, segundo o
qual a valoração se deve realizar a partir do paradigma de um homem médio, de
diligência normal, isto é, com o aviso de um consumidor médio representativo da
massa geral do público, não o técnico nem o consumidor perito ou
especializado ou o observador perspicaz, capaz de ver ligações que escapam à
maioria das pessoas, mas o consumidor médio, menos atento e cuidadoso – vd.
Américo da Silva Carvalho, “Usos Atípicos das Marcas (Função da Marca)”,
Direito Industrial, Vol. III, Coimbra, Fevereiro, 2003, p.93..
Abordando
em concreto o caso em recurso, no que se refere ao requisito da prioridade,
como o afirma a decisão recorrida as marcas nacionais e da UE da A. nº 447557 e
nº 10914224 TASCA DA ESQUINA, nº 493571 e nº 10553246 DA ESQUINA, nº 541989
TABERNA DA ESQUINA, nº 549193 PEIXARIA DA ESQUINA e nº 9435975 CERVEJARIA DA
ESQUINA, solicitadas entre 13.04.2009 e 18.06.2015, são prioritárias
relativamente à marca nacional do R., solicitada em 3.11.2015, pelo que
relativamente a tais marcas está preenchido o aludido pressuposto para que se
possa considerar a existência de imitação ou usurpação de marca registada, não
o estando quanto às demais marcas invocadas pela A..
No
capítulo da afinidade dos produtos ou serviços assinalados pelos sinais em disputa
as marcas prioritárias da A. assinalam serviços nas classes 43 e/ou 35 e 41 da
Classificação de Nice, enquanto a marca anulanda da
R. assinala produtos na classe 30. No entanto estas diferenças, nos termos do
artigo 245º nº 2, al. a) do CPI, não invalidam a conclusão de uma relação de
afinidade entre os produtos. A marca do R. assinala produtos de
padaria e confeitaria, incluindo refeições rápidas preparadas ou semi-preparadas como baguetes recheadas, hambúrgueres no
pão, pizzas, chamuças, crepes, folhados de salsicha e
tostas mistas, além de bebidas quentes e frias como cafés, chás e chocolate
quente, bem como gelados e outras sobremesas. E todos estes produtos podem ser
e são geralmente servidos ou disponibilizados, quando não preparados, no âmbito
dos serviços de restauração e cafés, ou de serviços de fornecimento de
alimentos e bebidas, assinalados pelos sinais prioritários da A. na classe 41
da Classificação de Nice. Acresce que, tendem todos à satisfação das mesmas
necessidades através do consumo dos mencionados alimentos e bebidas e/ou dos
correspondentes serviços e o público-alvo dos ditos produtos e serviços é o
mesmo, isto é, o cliente de estabelecimentos de cafetaria, pastelaria/padaria
ou restauração.
Verifica-se,
pois, uma relação de afinidade entre os produtos assinalados pela marca
nacional nº 555469 PADARIA DA ESQUINA na classe 30 e os serviços assinalados na
classe 43 pelas marcas prioritárias nacionais e da UE nº 447557 e nº 10914224
TASCA DA ESQUINA, nº 493571 e nº 10553246 DA ESQUINA, nº 541989 TABERNA DA
ESQUINA, nº 549193 PEIXARIA DA ESQUINA e nº 9435975 CERVEJARIA DA ESQUINA, mas
não com os demais serviços assinalados por estas nas classes 35 e 41.
Verificados
os dois requisitos anteriores, resta saber se ocorre também o terceiro, o da
semelhança entre os sinais que induza facilmente em erro ou confusão, ou
associação com a marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não
as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto. Tomando as
prioritárias da autora: TASCA DA ESQUINA; DA ESQUINA; TABERNA DA ESQUINA;
PEIXARIA DA ESQUINA e CERVEJARIA DA ESQUINA e em oposição, a do réu, PADARIA DA
ESQUINA, nestes sinais, exclusivamente verbais, verificamos que com excepção o DA ESQUINA, a estrutura construtiva dos
restantes é em tudo igual, sendo a sua composição formada por três vocábulos em
que a existe total identidade sintáctica,
constituídos por dois substantivos separados pela palavra da, contracção da preposição “de” com o artigo
definido feminino singular “a”. E se último é sempre Esquina,
o primeiro difere em todos eles e com um citério que distingue diferentes
lugares alimentares.
No
aspecto gráfico os sinais são distintos, na medida em
que o primeiro vocábulo da marca do réu ‘PADARIA’, não figura em nenhum dos
sinais prioritários, nem sequer de modo aproximativo, sublinhando-se que a
marca nacional e UE da autora ‘DA ESQUINA’ não é precedida de qualquer outra
indicação. E, por evidência sonora, também podemos concluir com as instâncias
que, foneticamente, cada uma das marcas se pronuncia de modo diferente.
Em
análise de conceito, todas as marcas envolvem uma mesma sugestão de localização
“da esquina”, indicadora “de lugar onde” - que convoca e impõe tanto a ideia de
ângulo saliente formado por duas superfícies e canto exterior, como a de ângulo
de rua - se bem que a marca Da Esquina apenas contenha essa
sugestão do lugar e nada mais, aludindo ao lugar, mas não o que se faz nele. Em
todas as marcas em presença (com excepção Da
Esquina) essa indicação de lugar é completada com uma actividade
concreta e distinta, seja aquele onde se faz pão, seja onde se consomem bebidas
e petiscos ou onde se vende peixe.
Estando
nos autos em confronto marcas registadas e sendo objecto
do recurso determinar se existe imitação da registada pelo réu relativamente à
dos autores, a questão de saber se elas (quer a do réu quer as da autora)
podiam ter sido admitidas a registo independentemente de imitarem ou não
outras, por existirem obstáculos legais de identificação que impunham essa
inadmissibilidade, excede e exorbita o que nos cumpre apreciar e decidir -
veja-se neste mesmo sentido, delimitador do objecto,
o ac. do STJ de 11-10.2001 no proc. 2581/2001 publicado no BPI e junto em anexo
pela recorrente.
Não
obstante, sempre deixamos referido por apontamento que, por as marcas terem por
definição e no cumprimento da sua função principal revelar capacidade
distintiva, com aptidão a individualizar uma espécie de produtos e
serviços - vd. Luís Couto Gonçalves, in Manuel de Direito Industrial, 8ª
ed. pág. 209 – o legislador enumera situações mais frequentes em que o sinal
carece de capacidade distintiva como nos caso do art.
223 do CPI quando as marcas estejam desprovidas de qualquer carácter distintivo
(al. a); os sinais constituídos, exclusivamente, por indicações que possam
servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o
destino, o valor, a proveniência geográfica, a época ou meio de produção do
produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos (al.
c); as marcas sejam constituídas, exclusivamente, por sinais ou indicações que
se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e
constantes do comércio (al. d).
Tendo-se
chamado à atenção anteriormente para que a marca é a totalidade dos seus
elementos e não apenas um deles, ou cada um deles em separado, neste momento
essa indicação faz perceber que um sinal que poderia não ter aptidão distintiva
singularmente - como por ex. padaria, peixaria, restaurante - ganhe essa
qualidade diferenciadora quando a marca tenha outros sinais, o que se certifica
na quantidade inúmera de marcas que têm nos seus sinais de designação a palavra
restaurante ou padaria ou cervejaria ou peixaria a que associam outras. Por
esta razão, lembrando que a questão em decisão se coloca em momento posterior
ao do registo e exclusivamente no enfoque de haver ou não imitação entre a do
réu e as identificadas da autora, sem cuidar de saber se singularmente cada uma
delas inscrevia os requisitos do registo que obteve, deixando a advertência
restritiva ao conhecimento permitido, indicamos como interessante e sem censura
o que as instâncias deixaram referido ao entenderem que o sinal anulando,
‘padaria’, mesmo que sugestivo de alguns dos produtos assinalados,
designadamente ‘pão’, não deixa na combinação dos elementos que o compõem de
ter um mínimo de capacidade distintiva, o que tem até sufrágio de
reconhecimento por parte da recorrente que promoveu e continua a promover
registos de marcas em que o elemento verbal ‘da esquina’ é precedido de
designações várias incluindo “padaria”.
Em
resumo, no conjunto dos sinais em confronto, as diferenças, designadamente
gráficas, fonéticas e conceptuais superam largamente a única semelhança
resultante da coincidência das palavras “da esquina” nada mais havendo que as
aproxime ou relacione, sendo a impressão de conjunto que emana dos sinais em
confronto, claramente distinta e como tal facilmente perceptível
pelo consumidor medianamente atento. É este homem médio, com o seu tipo de
diligência, atenção e discernimento medianos em face da marca e do produto que
lhe é destinado que, no caso, cremos não incorre em qualquer confusão,
diferenciando objectivamente marcas como peixaria da
esquina, taberna da esquina, tasca da esquina ou cervejaria da esquina, daquela
que tem como sinais padaria da esquina. E isto por resultar das marcas, com
evidência descritiva, a função individualizadora de cada uma delas.
Como
reparo, ainda nesta sede de análise da imitação, porque parece resultar das
conclusões de recurso que a circunstância de se ter obtido o registo da marca
“Da Esquina” imporia que nenhuma outra que tivesse na sua composição essa
expressão (para lá de não poder ser registada) determinaria a conclusão
automática de se ter por imitação, deixamos apenas indicado que tudo o que se
deixou expresso a respeito dos critérios de análise do que se pode entender por
imitação exclui uma conclusão dessa natureza, bastando para tanto pensar que,
de acordo com tais critérios e sem questionar a admissibilidade de registo de
uma tal marca (até porque está registada) à luz do art.
223 do CPI, se em confronto estivesse apenas a marca do réu e essa outra “Da
Esquina” seria absoluto o juízo de inexistir qualquer confusão ou imitação. Em
sentido lógico uma coisa é um lugar sem expressão distintiva de actividade e outra o que se passa nele e lhe dá sentido
significante, seja porque ali se faz e vende pão, ou vende peixe ou se come e
bebe.
A
propósito da função individualizadora de cada uma das marcas e para concluir
que a do réu não satisfaz esse predicado e imita as da autora, a recorrente
defende que a decisão recorrida erra porque não tomou em consideração na
análise que realizou um requisito legal, consistente na notoriedade e ou
prestígio da marca que determinaria que se concluísse pela anulação da do réu.
Foi aliás neste particular que suscitou, para a revista excepcional
ser admitida, a contradição de julgados defendendo que ao contrário do acórdão
fundamento, na decisão recorrida não se tinha tomado em consideração esse
facto.
Em
primeiro lugar, da petição inicial resulta que a alegação da autora é de a
notoriedade e prestígio ser colocada na pessoa no Chef BB, nomeadamente quando
se diz que o que caracteriza as marcas da Esquina é, sempre, a assinatura do
Chef BB. E que é este o responsável pela projecção
nacional e internacional das marcas.
Em
toda a petição inicial a única marca que a recorrente destaca como merecedora
de distintividade é a Tasca da Esquina quando refere
que a ela se referiu o Presidente da República e quando alega que no LISBON LUX
(o guia essencial de Turismo e da Cidade de Lisboa), o Restaurante TASCA DA
ESQUINA integra o TOP 10 dos restaurantes de Lisboa.
Dos
factos provados retiramos que os estabelecimentos da A. têm uma presença forte
na imprensa e nos meios digitais; o chef BB tem recebido distinções dos seus
pares, tendo sido considerado em 1999 'O Chefe do Ano' pela Academia Portuguesa
de Gastronomia, e sido agraciado em 2006 com o Grau de Comendador da Ordem do
Infante D. Henrique pelo Presidente da República, Jorge Sampaio; No Lisbon LUX (O Guia Essencial de Turismo e da Cidade de
Lisboa), o restaurante Tasca da Esquina integra o top 10 dos restaurantes de
Lisboa.
Analisando
o conceito, as marcas notórias e as marcas de prestígio, não são uma única e
mesma categoria em termos técnico-jurídicos. Correspondem a duas classes de
marcas às quais, pela abrangência, intensidade, valor e particularidade do seu
efeito no consumidor, são aplicáveis regimes jurídicos excepcionais
que se verificam ao nível da aplicação do princípio da especialidade -
princípio segundo o qual “(…) o âmbito da protecção
concedido a cada marca é limitado aos produtos ou serviços idênticos ou afins àqueles
para os quais aquela foi registada” - Pedro Sousa e Silva, em “O Princípio da
Especialidade das Marcas. A regra e a excepção.”,
Revista da Ordem dos Advogados, Ano 58, Janeiro, 1998 – positivado no nosso
Art.º 224º, n.º 1 do CPI.- na medida em que, em certas circunstâncias, o
exclusivo característico do direito à marca é extensível a produtos ou serviços
que não sejam nem idênticos nem afins àqueles que a marca comercializa e pelos
quais se tornou conhecida do público – vd. Mafalda Santos Sebastião - marca
notória e marca de prestigio, https://www.verbojuridico.net/doutrina
/2012/mafalda sebastiao _
Marcanotoria.pdf.
Partindo
da ideia de a marca notória ter de ser conhecida de uma parte significativa do
público relevante, esta generalização do conhecimento impõe que se esclareça
que marca notória não equivale nem se confunde com facto notório para os
efeitos em que o mesmo se encontra previsto em sede de direito adjectivo (mais propriamente na nossa ordem jurídica no
art.º 412 nº 1 do do CPC). Por regra, não existe uma
sinonímia dos termos “notória” para marca e “notório” para os factos, enquanto
previstos na lei portuguesa, e nem mesmo a possibilidade de algumas marcas de projecção globalizante à escala mais ou menos mundial
poderem ser tomadas na sua notoriedade como factos notórios, nem mesmo esta
constatação permite criar um automatismo que tome por notório que uma marca é
notória (e ainda menos de prestígio, uma vez que o prestigio é medido em termos
qualitativos e não quantitativos). E assim sendo, diga-se que não se pode tomar
como facto notório serem as marcas da autora marcas notórias ou de prestigio em termos técnico jurídicos e para efeitos de
propriedade industrial.
Segundo
o que dispõe a Recomendação Conjunta da
Assembleia da União de Paris e da Assembleia Geral da OMPI ‐ Joint
Recommendation Concerning Provisions on the Protection of Well‐Known
Marks, Geneva, 2000, in Ver
em http://www.wipo.int/about-ip/en/development _ iplaw/pub833-toc.htm#TopOfPage –
quanto aos indicadores que se devem ter em conta para se aferir da qualidade de
marca notória, eles são:
a.
O grau de conhecimento da marca no sector do público relevante;
b.
A duração, extensão e área geográfica de uso da marca;
c.
A duração, extensão e área geográfica de promoção da marca, incluindo
publicidade e apresentação, em feiras e exposições dos produtos e/ou serviços a
que a marca se aplica; d. A duração e área geográfica de quaisquer registos,
e/ou pedidos de registo da marca, na medida em que reflectem
o uso ou conhecimento da marca;
e.
Decisões de sucesso na defesa do direito da marca, em especial, no sentido em
que esta é reconhecida como marca notória pelas autoridades competentes;
f.
O valor associado à marca.
No
que se refere à qualificação de marcas de prestigio,
estas pressupõem já juízos de natureza quantitativa mas essencialmente
qualitativa. Nesta sede volta a questionar-se o âmbito e extensão do
conhecimento exigido e mesmo que aceitemos com Luís Couto Gonçalves, que se uma
marca, para ser notória, precisa de ser conhecida do público em geral, a marca
de prestígio deve igualmente gozar notoriedade na mesma esfera - Direito de
Marcas, Coimbra , 2003 p. 155 – recusamos a ideia de que essa extensão tenha de
respeitar qualquer percentagem como chegou a ser decidido pelo Supremo Tribunal
Federal Alemão com base na exigência de uma taxa de 80% da população como
conhecedora da marca para a considerar de prestígio – vd. Nogueira Serens, A «Vulgarização» da Marca na Directiva
89/104/CEE , de 21 de Dezembro de 1988 (Id Est, No
Nosso Direito Futuro), Coimbra, 1995, pp. 133 e 134. Alias, em sentido diverso
se pronunciou o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de 14 de Setembro
de 1999, proferida no âmbito do Proc.º C-375/97, (General Motors
vs. Yplon) onde se lê: “(…) O público perante
o qual a marca anterior deve gozar de prestígio é o interessado nessa marca,
quer dizer, determinado em função do produto ou do serviço comercializado, nuns
casos o grande público, noutros um público mais especializado, por exemplo,
determinado meio profissional. Nem a letra nem o espírito do artigo 5º nº 2 da directiva autorizam que se exija que a marca seja conhecida
de determinada percentagem do público assim definido. Deve considerar-se
atingido o grau de conhecimento exigido quando a marca anterior é conhecida de
parte significativa do público interessado pelos produtos ou serviços
abrangidos por essa marca. Ao examinar esta condição, o órgão jurisdicional
nacional deve tomar em consideração todos os elementos pertinentes do processo,
a saber, designadamente, a parte de mercado detida pela marca, a intensidade, o
alcance geográfico e a duração da sua utilização, bem como a importância dos
investimentos efectuados pela empresa para a promover”- em http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX :61997J0375:
PT: HTML .
No
critério qualitativo para integração de determinada marca são apontados como
indicadores: a excepcional atracção;
reputação; marca prestigiada; boa imagem da marca; elevado valor simbólico‐evocativo - Vd. Mafalda Santos
Sebastião, que faz a recensão destes indicadores por autor, op. cit. p. 12 –
mas particularmente feliz em nosso entender é o conceito de o “prestígio” a que
se alude para aplicação deste regime consistir “ numa representação
mental associada à marca que evoca, na pensamento do público relevante, uma
imediata e superior avaliação desta e dos bens pela mesma fornecidos, que a
torna rara e especial no sentido de que poucos atingem esse mesmo grau de
avaliação tão positiva. O mesmo é dizer que, sempre que o público toma contacto
com a marca a associa a uma esfera reduzida, que apenas alguns atingem,
destacando‐ se,
de forma extraordinariamente positiva e reputada. Esta confiança e estima por
marcas que sejam capazes de produzir este efeito no consumidor trazem,
certamente, uma capacidade de aviamento (selling power) que só por si é financeiramente avaliável e
extremamente valiosa”- Mafalda
Santos Sebastião, op. cit. p. 12. E sobre os meios de prova de que se pode
socorrer para provar o prestígio da marca Jorge Novais Gonçalves - A marca
prestigiada no Direito Comunitário das marcas – a propósito da oposição à marca
comunitária, Direito Industrial, Vol. V, Coimbra, Janeiro
2008, pp. 339 a 341 – enuncia a quota de Mercado, alcance geográfico,
investimento na promoção, atenção da comunicação social, duração da utilização.
Sabido
que a função primordial da marca é a de distinguir, permitindo ao consumidor
médio a diferenciação de certo produto ou serviço de outro produto ou outro
serviço, enquanto o regime jurídico da Marca Notória tutela a função distintiva
da marca, o regime da Marca de Prestígio tutela, ainda, uma função publicitária
– vd. Mafalda Santos Sebastião, op. cit. p. 18.
Habilitados
com estas considerações, uma primeira conclusão no caso em análise é a de que a
matéria provada relativamente às marcas da autora não permite que possam ser
consideradas marcas de prestigio com a natureza jurídica que esta designação
tem e que se restringe, como vimos, às marcas que evocam uma imediata e
superior avaliação da própria marca e dos bens pela mesma fornecidos, que a
torna rara e especial no sentido de uma sofisticação e requinte que excede o
muito bom para ganhar selo de excelência.
Perante
os factos provados o que extraímos é que é inquestionável a qualidade
prestigiante do Chef BB, quer pelas distinções dos seus pares, tendo sido
considerado em 1999 'O Chefe do Ano' pela Academia Portuguesa de Gastronomia,
quer pelo agraciamento em 2006 com o Grau de Comendador da Ordem do Infante D.
Henrique pelo Presidente da República, Jorge Sampaio. Só que no caso que nos
ocupa, não é o chef BB a marca, mas sim aquelas que são mencionadas como da
titularidade da autora e, quanto a estas, dos factos provados, repetimos,
resulta apenas que uma, correspondente à Tasca da Esquina, foi certificada por
uma publicação (Lisbon LUX) como integrante o top 10
dos restaurantes de Lisboa.
Porém,
num mercado tão fortemente concorrencial como é o sector da restauração, com o
permanente aparecimento e oferta, por toda a parte do país, de soluções
gastronómicas de tão publicitada qualidade, algumas reconhecias à escala global
com atribuição de distinções reveladoras e definidoras até desse enorme
prestígio (v.g. estrela Michelin) este quadro de observações (este sim
notório), implica sérias cautelas e cuidados quanto à qualificação do que seja
marca notória, a qual remete para um critério quantitativo de reconhecimento
por parte dos consumidores, que tem de ter sido alegado e ficado provado e cuja
quantidade que tem de ultrapassar obviamente os ecos de uma geografia
doméstica. Por outro lado, quanto ao critério qualitativo que preside à catalogação
das marcas de prestígio, não poderá aceitar-se que uma única publicação e de
caracter limitado (Lisboa), independentemente da projecção
publicitária que tal publicação atinja, baste para qualificar uma marca como de
prestígio. E isso sem embargo, de uma vez mais o repetimos, não ser o prestígio
de um Chef que de modo automático fornece o prestígio à marca em que se traduza
o seu mister, devendo sim ser a marca reconhecida por si mesma por não ser o
nome do Chef a marca.
Veja-se
precisamente que no acórdão que a recorrente apresentou para sustentar a
revista excepcional, e para esgrimir que a decisão
recorrida havia omitido aplicar ao caso um regime excepcional
decorrente de as marcas da autora serem (todas elas) de prestigio e notórias
sem distinção de conceito, a verdade é que as marcas em confronto naquele
acórdão eram exactamente iguais (Belcanto)
e a análise que se realizou incidiu, de acordo com os factos que ali se
provaram e sempre por referência a eles, exclusivamente no prestígio da marca
sem aludir ao fazer interceder o prestígio e qualidade do Chef ligado á marca
que constituía a designação de um restaurante. Acresce que, nesse mesmo acórdão
convocado pela recorrente (e que é relatado por um dos juízes que assina a
decisão recorrida) as marcas em confronto não só eram exactamente
iguais como reportavam, uma a um restaurante e outra a uma marca de vinho.
Então ali, poder-se-ia dizer como se disse que as “regras da experiência
confirmam que a actividade de bares e restaurantes
não existe, em regra, sem a comercialização de vinhos e ser do conhecimento na
realidade do mercado os grupos de empresas que exploram restaurantes
desenvolvem actividades conexas aos serviços de
restauração incluindo, designadamente, a venda de bebidas alcoólicas em que
usam a própria marca do restaurante o que determina que o consumidor não
se surpreenda que um prestador de serviços de restauração BELCANTO coloque no
mercado vinho com a mesma marca BELCANTO”
No
caso em decisão, ao invés, mesmo não se qualificando as marcas da recorrente
como notórias ou de prestígio em sentido técnico jurídico, percebemos
igualmente que os produtos fabricados pela ré não se traduzem, eles mesmos, em
marcas. Isto é, diferentemente do vinho do caso inscrito no acórdão fundamento
o pão não tem marca não podendo ser associado o que se sirva num restaurante a
outra marca qualquer.
Também,
quanto ao que afirma a recorrente que «no âmbito da protecção
do direito à marca, o que está em causa não é a confusão dos produtos ou a
confusão directa das actividades,
mas, sim, a que possa ocorrer entre sinais distintivos, portanto confusão indirecta de actividades» tal não
desmente a decisão recorrida onde, começando por deixar esclarecido que a marca
é o primeiro e mais importante dos sinais distintivos do comércio, funcionado
por um lado como identificação de um produto ou serviço proposto ao consumidor,
explica depois que a marca refere a um determinado produto no mercado
concorrencial e é esse produto e só ele que deve ser tomado em consideração. O
contexto em que estas considerações se inserem e do qual não devem ser
retiradas de forma segmentada torna entendível que o que aí se diz é também o
que nós antes expusemos e que se firma no âmbito de previsão do art. 245 do CPI ao colocar em equação próxima e incindível,
as relações de não identidade entre as marcas ou entre os produtos ou serviços
em confronto e o risco de associação ou de confusão. Neste sentido de
densificar essa relação mais que evidente, pode consultar-se o ac. do TJCE, de
29.09.98, proc. Nº C-39/97, que esclareceu, à luz das disposições da DM
[Primeira Directiva do Conselho de 21-12-1988, - que harmonizava as legislações
dos Estados-membros em matéria de marcas (JOCE n.°
L40, de 11-02-89], que o risco de confusão, na acepção
da DM, implica que o público possa crer que os produtos ou serviços em causa
provêm da mesma empresa. E isto porque a marca, referindo-se a um determinado
produto que está no mercado concorrencial determina que esse produto, e nessa perspectiva funcional e relacional, só ele, deva ser tomado
em consideração. E esclareça-se que, por isso mesmo, é que é a relação do
produto com a marca como estabelece o art. 245
adverte para que quem em concreto faça trabalhe, ou comercialize em termos
individuais não releva por serem as marcas, nomeadamente nos restaurantes ou
estabelecimentos de restauração, e não os Chefs quem detém ou goza da
regulamentação protectiva dos direitos de marca
registada.
Nesta
conformidade, improcedem na totalidade as conclusões de recurso e deve negar-se
provimento ao recurso.
…
…
Síntese
conclusiva
-
Para efeitos de aplicação do art. 245 nº 1 do CPI
aprovado pelo DL. n.º 26/2003 e na verificação da existência de imitação
de marca registada deve atender-se às semelhanças que ofereçam os diversos
sinais constitutivos da marca e à não semelhança que resulta do conjunto dos
elementos que a formam, devendo igualmente relevar-se totalidade dos seus
sinais e não apenas um deles, para se obter uma impressão de conjunto que
prevaleça ao decidir do risco de confusão.
-
A valoração a realizar deve ter por referência o modelo do homem médio com a
diligência normal de um consumidor representativo da massa geral do público e
não o técnico nem o consumidor perito ou especializado ou o observador
perspicaz, capaz de ver ligações que escapam à maioria das pessoas.
-
A classificação de uma marca como Notória depende
de um critério essencialmente quantitativo que consiste no grau de conhecimento
que a marca tem junto do público relevante do seu circuito mercantil.
-
A classificação de uma marca como De Prestígio depende do facto de
ser, tal como a marca notória, conhecida de significativa parte do público
relevante, e de este mesmo público lhe associar, por representação mental da
marca, de forma imediata, uma avaliação distintiva com atribuição de
características de excelência, requinte e sofisticação que lhe confere uma
especialidade e uma raridade que constituem a parte essencial do seu valor: o
seu prestígio.
-
A generalização do conhecimento exigível para a marca ser qualificada de
Notória (e para a de Prestigio) devendo contabilizar
uma parte significativa do público relevante, não se confunde com facto
notório para efeitos de prova (art. 412 nº 1
do CPC) exigindo-se que se aleguem e provem factos de onde essa notoriedade e
prestígio se possa concluir.
-
No âmbito da imitação de marca registada referente a estabelecimentos de
restauração, a atenção relevante incide sobre a notoriedade e prestígio da
própria marca e não sobre o Chef de cozinha que a tais estabelecimentos esteja
associado, desde que o nome deste não fala parte dos sinais da marca em
discussão.
…
…
Decisão
Pelo
exposto, acorda-se em julgar improcedente a revista e, em consequência, em
confirmar a decisão recorrida.
Custas
pela recorrente
Lisboa,
28 de Setembro de 2021
Nos
termos e para os efeitos do art.º 15º-A do Decreto-Lei n.º 20/2020, verificada
a falta da assinatura dos Senhores Juízes Conselheiros adjuntos no acórdão
proferido, atesto o respectivo voto de conformidade
do Sr. Juiz Conselheiro Tibério Silva e da Srª. Juiz
Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza.
Manuel
Capelo (relator)